Sinopse
Aida é tradutora da ONU na
pequena cidade de Srebrenica. Quando o exército sérvio da Bósnia assume o
controlo da cidade, ela descobre que a sua família está entre os milhares de
cidadãos que procuram abrigo no acampamento das Nações Unidas. Como uma pessoa
de dentro das negociações, Aida tem acesso a informações cruciais que ela
precisa interpretar. O que está no horizonte para sua família e seu povo –
resgate ou morte?... Que ação ela deve tomar?... Inspirado em factos verídicos.
Opinião
por Artur Neves
Retrata-se neste filme a
monumental inépcia e indefinição da ONU em relação ao conflito da Guerra da
Bósnia entre 1992 e 1995 quando a sua representação em Srebrenica, uma pequena
vila na Bósnia Herzegovina, era constituída por militares holandeses e outros jovens
locais de pouca idade, arvorados em capacetes azuis que mais não podiam fazer
do que empunhar o símbolo da organização para testemunhar a sua integração numa
força longínqua que os abandonou à sua sorte, enquanto desenvolvia reuniões
infindas sobre o seu destino.
Aida Selmanagic (Jasna
Djuricic) é uma professora que a representação da ONU requisita como tradutora,
tomando assim um papel central na história mercê da sua livre movimentação no
interior da representação e do conhecimento profundo da dinâmica política das
forças estacionadas da ONU que reclamam apoio aéreo, sempre prometido mas que nunca
chega, permitindo o genocídio de cerca de 3000 muçulmanos às mãos de exército
Sérvio invasor que tomou a vila.
Aida, personagem fictícia do
argumento que serve de guia da ação para o espectador, tem como objetivo salvar a
sua família, o marido e os dois filhos, pelo que se desdobra entre as suas
funções oficiais e o papel de mãe e esposa para garantir a segurança daqueles
que ama, num ambiente de guerra que piora constantemente, tentando ainda gerir
a proteção de milhares de refugiados, no precário equilíbrio entre a falta de
recursos e a ausência de apoio externo que ameaça destruir o povo muçulmano da Bósnia
e de comunicar ao povo as determinações dos impotentes soldados da ONU
envolvidos numa guerra que se desenvolveu ao seu redor nos últimos três anos.
O exército Sérvio entra sem
resistência em Srebrenica, comandado pelo general Ratjo Mladic (Boris Isakovic),
que mais tarde viria a ser condenado a prisão perpétua por um tribunal
internacional, sem que contudo essa punição tenha conseguido lavar o sangue das
mãos da ONU. Ratjo Mladic é vaidoso e exige que todos os seus discursos
humanistas de vencedor magnânimo sejam filmados e transmitidos para o mundo,
enquanto reúne todo o povo da vila num descampado, negoceia com o Major Franken
(Raymond Thiry), responsável pelas forças estacionadas da ONU a sua
transferência para um lugar seguro em camionetas, devolvendo-os à liberdade,
mas o que realmente faz é fuzilá-los assim que os carros se afastam de Srebrenica
a uma distância fora da vista.
A argumentista e realizadora
Jasmila Žbanić nascida em Sarajevo em 1974 apresenta-nos toda esta história sem
imagens chocantes regadas com sangue, como é frequente em filmes de guerra, mas
antes de uma forma emocional onde Aida é a sua intérprete fundamental nas suas
movimentações progressivamente ansiosas, nos seus olhares imoveis no vazio, na
sua expressão dura e determinada, ciente que a sua posição não lhe confere
qualquer garantia diferente de todos os outros prisioneiros e nas pausas para
fumar que a evadem do caos circundante, mas que não são mais do que o prenúncio
da tragédia que aos poucos se vai adivinhando pelo desenrolar da história.
A filmagem é conseguida
maioritariamente de câmara na mão, com tomadas de vista perto da ação de forma
a inserir-nos no ambiente tenso que se vai adensando, deixando ao espectador a
avaliação da gravidade dos acontecimentos que se sucedem, vivenciados pela
protagonista numa correria insana sem objetivo definido porque ela, tal como
todos os outros, não têm para onde realmente fugir. Muito bom, recomendo sem
reservas.
Em exibição nas salas a
partir de 3 de Junho
Classificação: 8 numa escala
de 10