30 de agosto de 2019

Opinião – “Mas que Avó é Esta?!” de Gabriel Julien-Laferrière


Sinopse

Após dois anos de felicidade a viver juntos, a tribo de sete meios-irmãos e meias-irmãs tem de abandonar o grande apartamento antes do recomeço das aulas. Enquanto todos partem de férias de verão com os seus respetivos pais, Gulliver, o mais pequeno, é enviado, sozinho, para a casa da avó que vive junto à praia. Mas a excêntrica 'Vó Aurore não é uma babysitter como as outras e prefere andar na farra a ficar em casa a cuidar do neto.
Os irmãos decidem ir em socorro de Gulliver. É o início de uma nova revolução. Ela só queria sossego, mas eles vão fazer-lhe a vida negra!

Opinião por Artur Neves

Este é o típico filme de férias de verão, com jovens que pertencem a uma família disfuncional, no bom sentido, entenda-se, e que não permitem que a sua avó Aurora (Chantal Ladesou) passe o verão de desbunda e de felicidade que tinha expectado considerando a ausência dos netos em férias com os respetivos progenitores, exceto Gulliver (Sadio Diallo) que apesar de só superficialmente o conhecer, nutre por ele um especial carinho, mas com as reservas inerentes à realização dos seus desejos.
Aliás esta história entende-se como a continuação de “Mas que Família é Esta” de 2016, do mesmo autor e com o mesmo elenco três anos mais novos, festejando a mesma época de férias de verão e dirigido ao mesmo público que apenas pretende uma boa comédia de ação direta, que não seja necessário pensar muito para se entender ao que veem.
Para obter este objetivo, basta a trupe de jovens atores já conhecidos entre si, os gags do costume ou com pouca diferença das tradicionais peças de juventude entre jovens, e uma Vó, com ar de durona, que encarna a lei e ordem, que ela própria não está disposta a cumprir em benefício de outros objetivos para o seu tempo livre.
O filme aborda também a situação dos filhos de famílias monoparentais que formam um gang de crianças que embora vivam e cresçam juntas não têm como referência parental os mesmos progenitores, conferindo ao grupo um dinâmica de família, diferente da tradicional. Nas suas diferentes fases de crescimento e de evolução isso provoca perturbação mas também a responsabilidade dos mais velhos cuidarem dos mais novos, construindo uma vivência que vai sendo frequente no mundo ocidental.
Ora quando este conjunto se une em defesa de Gulliver, o benjamim do grupo, contra uma Vó cuja caraterística mais marcante é repreender sempre que é chamada de avó, mas que ainda assim os protege, alimenta e defende, baseada no seu ascendente matriarcal, só pode resultar numa história bem-disposta, razoavelmente verosímil onde podemos ver situações conhecidas do presente individual, que nos emociona e dispõe bem durante os 99 minutos de duração.
Como comédia de férias cumpre o propósito e permite divertirmo-nos, esquecermo-nos de nós e esquecermo-nos deles até para o ano, pois neste tipo de histórias costuma não haver duas sem três.

Classificação: 5 numa escala de 10

29 de agosto de 2019

Opinião – “Segredos Oficiais” de Gavin Hood


Sinopse

Em 2003, enquanto os políticos em Inglaterra e nos EUA procuram invadir o Iraque, Katharine Gun (Keira Knightley), uma tradutora do GCHQ - serviço de inteligência britânico responsável pela garantia de informação ao Governo Britânico e às Forças Armadas -, divulga um e-mail secreto onde é pedido para que membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas sejam espiados, com o objetivo de os forçar a votar favoravelmente a resolução para validar a guerra.
Acusada de violar a Lei dos Segredos Oficiais, e enfrentando a possibilidade de ser presa, Katharine e os seus advogados iniciam a defesa da ação dela. Com a vida, liberdade e casamento ameaçados, ela tem de defender aquilo em que acredita...
“Segredos Oficiais” aborda um acontecimento verídico que viria a ganhar uma dimensão significativa, tornando-se numa causa célebre entre ativistas antiguerra.

Opinião por Artur Neves

Se o futuro nos trás algo de benéfico em termos de humanidade e de sociedade humana ele inclui o encurtamento dos tempos da história na revelação das verdadeiras intenções e dos casos que motivaram certas decisões políticas censuráveis e altamente criticáveis, como a invasão do Iraque pelos países da “coligação”, congeminada nos USA pelo inefável Bush filho, o primeiro-ministro Inglês Tony Blair e o nosso Durão Barroso, que serviu como mestre-de-cerimónias no embuste da justificação de invasão para eliminação das “armas de destruição maciça” que nunca foram encontradas no Iraque de Saddan Houssein por qualquer das equipas de inspeção.
A história que nos é contada neste filme baseia-se no romance; “O Espião que tentou parar uma Guerra” escrito por Marcia & Thomas Mitchell, que reporta o ato heroico de Katharine Gun, com completo desprezo pelas consequências do seu ato, para si e para a sua família, ao divulgar à imprensa o conteúdo de um e-mail onde era solicitada a vigilância apertada de várias entidades das UN com o fim de os condicionar no apoio e concordância com a projetada invasão do Iraque em 2003, como retaliação à destruição das Torres Gémeas em 2001.
Neste filme, desenvolvem-se todas as ações, representadas da maneira mais séria possível, de modo a poder respeitar a enorme complexidade deste caso envolvendo todos os diálogos nos diferentes aspetos políticos, éticos, morais e legais, fazendo justiça à personalidade da verdadeira Katharine Gun que merece todo o nosso respeito e admiração.
Katharine Gun (Keira Knightley), apresenta um desempenho sóbrio e seguro mostrando toda a sua revolta na forma como o primeiro-ministro do seu país está empenhado em enganar o público britânico, brilhantemente secundada pelo seu advogado Bem Emmerson (Ralph Fiennes) que domina, no melhor sentido, a segunda parte do filme durante a preparação da defesa no julgamento para o crime de traição de que é acusada, interpretando a força da justiça que deveria ser norma.
Estamos em presença de um excelente thriller político e de investigação jornalística, que decorre na Londres atual, oferecendo-nos todo o ambiente sombrio daquela cidade, tradicionalmente povoada por nuvens negras e dias sem sol, bem de acordo com a trama que se está a preparar, constituindo uma lição de história atual, recente, com 112 minutos, que o leitor não vai sentir passar.
Todavia, já sabemos o resultado, o Iraque foi invadido e com ou sem consentimento das UN uma guerra sangrenta foi travada donde resultaram centenas de milhares de mortos, Saddan também morreu e o mundo passou a ser o lugar mais instável e incerto que todos conhecemos. Os esforços de Katharine Gun foram em vão e tal como com ela, outros heróis também continuarão anónimos para as próximas guerras que se avizinham, resta-nos o pobre consolo de ficarmos a saber a verdade dos factos ainda dentro do nosso tempo de vida e não através de um relato histórico engajado ao poder da altura.

Classificação: 8 numa escala de 10

22 de agosto de 2019

Opinião – “47 Metros: Medo Profundo” de Johannes Roberts


Sinopse

Mia não está nada satisfeita com a ideia de ir morar para o México com o pai, Grant, e a sua nova família. Grant trabalha como investigador numa antiga cidade maia submersa e Mia é obrigada a conviver intensamente com a filha da sua madrasta, Sasha. Entediadas e sem ninguém que verifique por onde é que elas andam, Mia, Sasha e duas amigas esgueiram-se para a gruta subaquática em que Grant está a trabalhar.
Escondido e submerso durante séculos, o cemitério maia é belo e intrigante, mas depressa se transforma numa armadilha mortal quando as raparigas percebem que não estão sozinhas. O abismo está cheio de enormes tubarões brancos ameaçadores que as rondam. Encurraladas numa gruta que poderá vir a revelar-se o seu túmulo, as raparigas terão de manter um silêncio sepulcral se quiserem sair dali vivas.

Opinião por Artur Neves

Gostaria de perguntar a Joannes Roberts o que o levou a fazer uma reedição do igualmente seu “47 Metros de Terror” de 2017. Será que a existência de uma pretensa investigação a uma cidade Maia submersa, altera alguma coisa ao terror transmitido pelos tubarões cegos?... Ou será a presença de mais mulheres submetidas ao mesmo susto que torna este filme diferente do anterior?...
Claro que desconheço qual a resposta mais adequada mas presumo da inutilidade de fazer terror com tubarões, 44 anos depois de “Jaws”, “O Tubarão” de 1975, realizado por Steven Spielberg, pois não será a circulação por antigos túneis labirínticos e escuros, numa acção pautada na escuridão que suprime ou compensa a falta de uma narrativa convincente, tanto na primeira versão como nesta, onde parece que o que se pretende aqui, é esconder tubarões de má qualidade e efeitos especiais pobres.
O medo de ser devorado por um animal ou por qualquer outra entidade que nos possa submeter, tal como os trogloditas de “A Descida” 1 e 2, de 2005 e 2009 respetivamente provocam-nos um horror telúrico a que dificilmente escapamos. Muito diferente do que se passa aqui em que se permanece grande parte do tempo num ambiente esverdeado de água salobra, cuja subida á superfície se torna em alívio do suspense criado, que todavia se prolonga quando se percebe a inevitabilidade de uma nova necessidade de descida, para a qual os tubarões são apenas um acessório para completar o quadro.
Despreza-se a descoberta das ruínas Maias, a sua dimensão ou a importância da descoberta e os segredos sinistros que encerram, porque o importante são os tubarões a evoluir na água e o risco acidental de ser mordido, ou comido, porque o foco da acção é esse e nunca há muita dúvida sobre quem vai ser molestado pelas bestas, pois Mia (Sophie Nélisse) e Sasha (Corinne Foxx) serão quem rirá no fim apesar das divergências que as separam. Um dos personagens é deliberadamente tão cretino e idiota que o seu desaparecimento quase nos parece merecido.
Ao fim dos 89 minutos de duração do filme e se o leitor conhecer a primeira versão, vai encontrar uma mudança que tenta introduzir uma melhoria no final, mas que no meu entendimento só vai tornar a história ainda mais absurda e os tubarões mais ridículos.

Classificação: 4 numa escala de 10

18 de agosto de 2019

Opinião – “Bookmart: Inteligentes e Rebeldes” de Olivia Wilde


Sinopse

Amy (Kaitlyn Dever) e Molly (Beanie Feldstein), melhores amigas e marronas, achavam que se se dedicassem totalmente aos estudos teriam vantagem sobre os seus colegas mais baldas e brincalhões. Mas na véspera do último dia de aulas, elas acordam para a realidade e percebem que passaram ao lado de toda a diversão e ficaram a perder. Determinadas a compensarem o tempo perdido, decidem encaixar quatro anos de diversão numa única noite épica de mau comportamento – uma aventura caótica para a qual nenhum dos estudos a preparou.

Opinião por Artur Neves

Esta é uma história de adolescência americana, embora com aproximação ao que acontece pelo mundo ocidental, todavia nós não temos esta tradição de fim de formação do ensino médio, sendo mais comum estas festas e estas celebrações na “queima das fitas” como conclusão da obtenção de um grau académico.
Não obstante representa um marco na vida de todos os jovens, recheado de dúvidas e incertezas sobre a melhor forma de entrar na vida adulta, actualmente agravado com tantos desafios e imprevistos que se lhes apresentam. Nesta história porém, tudo isso é esbatido e o que o filme nos mostra é uma competição entre duas amigas marronas que hipotecaram a sua juventude, contra todos os outros colegas que com menos sacrifício atingiram os mesmo objectivos que elas.
É assim uma história de frustração e de desforra para tentar compensar numa única noite todos os sacrifícios anteriormente feitos e que agora lhes parecem inúteis e estéreis. É ainda uma referência à liberalização de costumes mostrando a revelação das suas orientações sexuais em que nada de extraordinário acontece para lá da experimentação inicial das pulsões humanas, fortemente condicionadas socialmente e que por isso as leva in extremens a experimentarem numa só noite de folia, o que somente na solidão dos seus quartos tinham timidamente ensaiado.
Olivia Wilde, actriz americana, que recentemente entrou como protagonista no filme “A Vigilante”, já comentado neste blog, esteia-se neste filme como realizadora e recria uma história já contada em “Juventude Inconsciente” de 1993, por Richard Linklater, duma forma mais autêntica e mais próxima do real, embora com intérpretes e problemáticas algo diferentes. Neste filme, em que tudo se passa de uma forma sem consequências nem riscos para os seus protagonistas, muito embora os problemas sejam passíveis de motivar preocupação, representa sem dúvida a afirmação feminina que se vem revelando um pouco por todo o lado, com mulheres focadas, que perseguem os seus objectivos, embora feito com meninas da geração “Z”, numa fase da vida em que encaram as dificuldades de se tornarem nas pessoas que querem ser.
Nestes termos é talvez o mais conseguido dos filmes que abordam esta temática com mulheres na primeira pessoa, construindo uma história que sem ser inédita se vê com curiosidade e interesse, pela manifestação de ansiedades fundamentais que se revelam em jovens no final da adolescência.

Classificação: 6 numa escala de 10

13 de agosto de 2019

Opinião – “Em Chamas” de Chang-dong Lee


Sinopse

Durante um dia normal de trabalho como entregador, Lee Jong-su (Ah-in Yoo) reencontra Shin Hae-mi, (Jong-seo Jun) uma antiga amiga que vivia no mesmo bairro que ele. A jovem está com uma viagem marcada para o exterior e pede para Jong-su cuidar de seu gato de estimação enquanto ela está longe. Hae-mi volta para casa na companhia de Ben, (Steven Yeun) um jovem misterioso que conheceu em África. No entanto, o forasteiro tem um hobby peculiar, que está prestes a ser revelado aos amigos.

Opinião por Artur Neves

Este filme é a adaptação ao cinema do conto “Os Celeiros Incendiados” incluído no livro de Haruki Murakami; “O Elefante Evapora-se” que inclui histórias que nos mostram o espírito Coreano, tendo beneficiado da arte de o captar de Chang-dong Lee.
Jong-su é um jovem trabalhador, voltado para a tarefa, metido consigo, com reservas de relacionamento com os outros, que no seu comportamento diário apresenta sinais compatíveis com a síndrome de Asperger. Embora apresente inteligência e capacidade de linguagem normais sente-se mais confortável na solidão do seu pensamento resguardando-se nos seus locais de conforto.
Hae-mi é o contrário disso, extrovertida, comunicativa, gosta de gente e de praticar os seus sonhos pejados de fantasia, de amor jovem, de promessas. Nunca se saberá se o convite que ela declaradamente envia a Jong-su, com base numa referência de infância, é verdadeiro ou faz parte da fantasia do momento. Todavia eles entendem-se e Jong-su liga-se a ela por amor e pela necessidade que sente de se ligar ao mundo que ele isoladamente não sabe abordar.
Porém, o furacão Hae-mi não pode estar quieto, parado num local e num impulso faz uma viagem ao Zaire incluída numa ação humanitária. É um momento de perda para Jong-su que apesar de ficar a tratar do seu gato, sofre com a inusitada separação. O regresso de Hae-mi torna-se ainda mais traumático porque ela vem acompanhada de Ben, um homem novo, bem-parecido, conhecedor do meio, aparentemente rico sem todavia se conhecer qual a origem dos seus proventos.
É nesta altura que a história começa a despertar, Chang-dong Lee porfiou habilmente o conhecimento destes personagens como um fiandeiro na sua roca. Mostrou-nos todos os pormenores necessários para fazermos uma ideia concisa dos seus mundos e dos seus objectivos, da aproximação entre os três, num crescendo de emoções embora sem qualquer conflito onde se começa a configurar um triângulo amoroso não explícito. Tudo é apresentado no tempo certo criando um universo de relacionamento credível.
O momento alto deste cosmos dá-se no terraço da casa de Jong-su na cena que mais tempo demorou a filmar porque Chang-dong Lee pretendeu mostrar-nos um pôr-do-sol maravilhoso, quente e de cor pastel, em que Hae-mi exulta em feminilidade e fantasia que gera tensão entre os dois homens, sendo a amizade em formação eivada de ciúme e inveja considerando que a personalidade de Hae-mi está mais próxima de Ben do que de Jong-su. Nessa reunião, a revelação de Ben colhe a ambos de surpresa.
O que é mais extraordinário nesta história é sua capacidade de transmitir um suspense que sucessivamente se vai adensando, construído por Chang-dong Lee em sequências com longos planos de câmara na mão, uma música de fundo perturbadora que acentua a tensão e um relacionamento entre os três, onde uma Hae-mi smi-nua evolui dançando e estabelecendo diferentes trocas de olhares, as conversas entre eles não definem culpados ou inocentes e convidam o espectador a fazer apostas sobre as suas motivações individuais.
Aliás, nesta história, as “Chamas” atribuídas no título, tanto podem reportar-se à exaltação da líbido e das pulsões sexuais à solta, como ao perigo incluído na revelação de Ben. A história é riquíssima e o seu desfecho inesperado, todavia aceita-se sem mais provas, de acordo com a razão de Jong-su, sem que seja possível antecipar aquele final. A ver, recomendo vivamente.

Classificação: 8,5 numa escala de 10

PS: Este filme foi apresentado no 71º Festival Internacional de Cannes, em maio de 2018 e neste momento não sei se ainda estará nas salas, todavia merece ser visto mesmo em DVD se for essa a única opção.

9 de agosto de 2019

Opinião – “Um Ajuste de Contas” de Shawn Ku


Sinopse

Frank (Nicolas Cage) passou 19 anos na prisão por ter assumido a culpa por um homicídio que o chefe do seu gangue cometera. Em troca, Frank passaria apenas 5 anos na prisão, receberia meio milhão de dólares e enquanto cumpria pena na prisão, tomariam conta do seu filho, Joey. Uma pena que lhe asseguraram ser de 5 anos na verdade foi a uma sentença de prisão perpétua e a promessa de tomarem conta do seu filho não é cumprida. Frank é libertado e jura um ajuste de contas.

Opinião por Artur Neves

Adicionalmente ao resumo descrito na sinopse, Frank está morrendo, sofre de uma doença grave que lhe suprime o sono, impedindo-o da regeneração do cansaço e da eliminação das toxinas gerada pelo exercício da vida e lhe provoca alucinações, para as quais ele está medicado para as controlar, mas a sua raiva é de tal forma obesessante que o seu único foco está na cobrança do tempo desperdiçado atrás das grades como bode expiatório, reclamando uma promessa que não foi cumprida.
Frank sai de noite da prisão e quando percorre sozinho a pé, a estrada de ligação à cidade encontra seu filho Joey (Noa Le Gros) vindo ao seu encontro, vestido de forma casual e limpo de qualquer vestígio de droga, que mais tarde vamos sabendo que o agarrou e mais tarde ainda, saberemos que o matou. Mesmo ao olhar mais ligeiro este encontro vindo do nada parece-nos suspeito mas o realizador coreano Shawn Ku, mantem-nos na expectativa dum encontro feliz, num encontro de redenção entre almas desavindas, entre um pai ausente e um filho rebelde, que agora têm o seu momento para começar de novo.
Porém, é tudo ilusão para encher chouriços e tempo de videograma, com jantares em locais luxuosos, aquisição de bons fatos e de prendas caras para preencher uma alucinação de que só muito posteriormente somos informados. Aqui chegados, ocorre-me perguntar o que é que Nicolas Cage anda a fazer da vida desde; “Juventude Inquieta” de 1983, ou “Cotton Club” de 1984, ou ainda de; “Morrer em Las Vegas”, “O Rochedo” e “Con Air: Fortaleza Voadora” de 1995, 1996 e 1997 respetivamente, pois desde “O Senhor da Guerra” de 2005 que parece que ele aceita trabalhos apenas para que lhe seja pago um salario, numa filosofia de quantidade de aparições (92 até agora) mas de qualidade duvidosa, em produções baratas, bem inferiores aos argumentos de representação que já lhe valeram um óscar.
A história é de vingança e esgota-se no ato e nos momentos bizarros que o argumento confere ao personagem, de nada vale o encontro com Simone (Karolina Wydra) onde ele, no meio da sua alucinada relação consegue visualizar a sua falecida esposa, mas o foco são os sangrentos flashbacks que alimentam a vingança e motivam a busca incessante dos autores da sua infelicidade. O encontro com eles é de violência e morte, mesmo num dos casos em que a morte já se antecipou. O final é patético para quem nutre tanto ódio e no final mesmo ele também não escapa, só sinceramente desejo que não seja uma premonição do fim da carreira do ator.

Classificação: 5 numa escala de 10

8 de agosto de 2019

Opinião – “Histórias Assustadoras para contar no Escuro” de André Øvredal


Sinopse

Estamos em 1968 nos Estados Unidos e sopram ventos de mudança.
Aparentemente muito distante da agitação das grandes cidades fica a vila de Mill Valley, onde paira há muitas gerações a sombra da família Bellows.
Foi na mansão da família que Sarah, uma jovem com segredos terríveis, transformou a sua torturada vida numa série de histórias assustadoras escritas num livro que sobreviveu à passagem do tempo, histórias que se tornam demasiado reais para um grupo de adolescentes que descobre a aterradora casa de Sarah.
Um filme com argumento e produção de Guillermo del Toro, vencedor de 2 Óscares com o filme “A Forma da Água”.

Opinião por Artur Neves

O que me apetece dizer é que “histórias assustadoras são para contar às claras”, no escuro contam-se fantasias umas mais bem contadas que outras e estas não fogem à regra das histórias de terror do passado que lançam no presente os seus sustos bafientos.
Um filme com argumento e produção de Guillermo del Toro inspira-me muito pouco, considerando até o facto dos dois óscares atribuídos a “A Forma da Água” terem um gosto duvidoso e uma justificação equivalente, se atendermos à estranha metáfora fantástica de amor que a história pretende transmitir. O que neste filme inspirava amor e pertença representa agora medo e morte anunciada.
Encontramos sim os mitos correntes dos filmes de terror da indústria cinematográfica americana, O milheiral como objecto de suspeita, de esconderijo do medo indefinido, o espantalho que ganha vida para se vingar em nós pela sua imobilidade plasmática no tempo e no espaço, a mansão abandonada em ruínas que serviu de prisão e cárcere ao espírito que agora persegue os heróis improváveis e como cereja em cima do bolo, o monstro “trolliano” que surge da terra e se forma a partir das partes em que foi desmembrado e persegue os heróis que o animaram, bem como, o livro das histórias que se escrevem por si próprias descrevendo a sangue vivo o destino próximo dos nossos heróis, que á vez, irão soçobrar em nome da curiosidade que os animou.
Como tal, histórias para contar não há muitas, apenas uma, escrita durante o cativeiro de Sarah que agora se replica adequando-se ao percurso de cada um dos responsáveis pela sua animação, contado tudo muito às claras, muito direto com cada interveniente que sente visivelmente a morte aproximar-se e morre mesmo.
Não existe suspense, mistério, e a fantasia não excede a que os efeitos especiais podem conceber. Em nenhum momento nos sentimos no lugar de qualquer perseguido e desde o início que se descobre a sequência de mortes a que vamos assistir. Não existe dúvida sobre o desconhecido porque simplesmente é tudo contado às claras, embora com mais ou menos sombras, pretende-se assustar pela forma e não pelo conteúdo que justifica a animação do mal.
André Øvredal aparece assim como o realizador de serviço para uma história pobre, patrocinada por um mecenas que não encontra melhor assunto para gastar dinheiro. Deste realizador também não há outras referências de interesse no género.

Classificação: 4 numa escala de 10