“Radioativo” dá-nos a
conhecer o legado duradouro de Marie Curie (interpretada pela atriz nomeada
para um Óscar® Rosamund Pike) – as suas relações apaixonadas, as descobertas
científicas, e as consequências para ela e para o mundo. Depois de conhecer o
cientista Pierre Curie (Sam Riley), os dois casam-se e mudam a ciência para
sempre com a descoberta da radioatividade. A genialidade das descobertas dos esposos
Curie, que mudam o mundo, e o Prémio Nobel que se segue, levam o casal à
ribalta internacional.
Dos mesmo produtores de “A Hora
mais Negra” e “Expiação”, a realizadora Marjane Satrapi (nomeada para um Óscar®
com Persépolis) parte da novela gráfica de Lauren Redniss e apresenta um
retrato visionário e ousado dos efeitos transformadores, das consequências do
trabalho dos Curie e da forma como este moldou os momentos-chave do século XX.
Opinião
por Artur Neves
“Radioativo” é um filme que
nos mostra os benefícios e os malefícios da radiação gama, (γ) um tipo de radiação
eletromagnética de alta frequência com elevado poder de penetração em todos os
corpos, resultante do decaimento da evolução natural do plutónio na natureza, através
duma abordagem autobiográfica aos seus descobridores, os esposos Pierre e Marie
Curie na última década do século XIX.
Em 1903 essa descoberta e as
suas múltiplas aplicações conferiu-lhes o mérito de serem distinguidos com o
prémio Nobel que no discurso de aceitação de Pierre ele aludiu à imensa
perigosidade das suas descobertas referindo em forma de pergunta; “se a
humanidade se beneficia em conhecer os segredos da Natureza, se está pronta
para lucrar com isso ou se esse conhecimento não será prejudicial para ela”. A
resposta, como todos conhecemos, está no benefício da antecipação de diagnóstico
propiciado pelo Raio X e no malefício do desastre de Chernobil, igualmente
referido no filme, este porém, com causas políticas associadas à dimensão do
desastre, para lá da perigosidade de utilização da energia atómica no grau de
desenvolvimento atual.
Marjane Satrapi, realizadora
Iraniana a viver nos USA faz uma abordagem inteligente do argumento começando
com Marie Curie já consagrada e em plena atividade no laboratório sofrendo um desmaio
que a levará ao hospital, cujo tempo de internamento lhe permitirá fazer o
balanço da sua vida mostrando-nos toda a evolução do seu trabalho, estudos e vida
familiar com Pierre Curie, do qual teve três filhas e uma vida de ativista em
favor dos direitos das mulheres, da sua independência e autonomia face à
sociedade patriarcal comum no século XIX decorrente da revolução industrial e
posterior desenvolvimento.
Neste particular, a atriz Rosamund
Pike no papel de Marie Curie é uma escolha vencedora considerando a sua
teimosia, orgulho e perseverança demonstrados na construção de um personagem
credível como cientista e controverso como esposa e mãe, pese embora as suas
diferenças físicas com a verdadeira Marie Curie.
Pierre Curie (Sam Riley) era
igualmente dado às ciências ocultas, contrariamente a Marie Curie que era
fundamentalmente racional e pragmática. Essa tendência introduziu no círculo de
conhecimentos familiares Loie Fuller (Drew Jacoby) uma mulher da nova era que
criou em palco uma dança em que o intérprete vestia uma túnica branca esvoaçante
iluminada por luzes mutantes de cores intensas. Fuller, tendo conhecimento do
poder fosforescente do rádio, pediu-lhes um pouco para utilização numa fantasia.
Pierre teria acedido se Marie não se opusesse determinadamente, antecipando os
efeitos perniciosos da radiação continuada no corpo humano, dos quais Pierre e
ela própria, viriam a falecer.
Satrapi soube construir um
ambiente adstringente e simultaneamente sentimental de Marie, em que ela, sem
abandonar o seu mundo e a sua atividade de investigadora, ama infinitamente o
seu marido, resolve os seus diferendos individuais após a sua morte e cuida das
suas filhas com o desvelo possível, embora sempre com muito amor. Todo o filme constrói
uma visão alucinatória que ilustra o terror com que Marie encara as suas
descobertas, que não têm a ver só com ela, mas com muitas outras vidas que ela
pode condicionar, reforçando a mensagem de que: “a ciência é invariavelmente
política e, nas mãos certas, pode ser uma força para o bem, mas nas erradas,
uma arma do mal”. Muito interessante, recomendo.
Classificação: 7 numa escala
de 10