Sinopse
Julie (Renate Reinsve), é uma animada
jovem de 30 anos que tem tudo a seu favor. Mas também está a experimentar um
desencanto crescente com um namoro sério de longa data com Aksel (Anders Danielsen
Lie). Perdida, Julie vagueia sem rumo pela cidade numa bela noite de verão e
silenciosamente invade uma festa de casamento em pleno andamento. Encontrando
Eivind (Herbert Nordrum), começam a flertar de maneiras engraçadas e
embriagadas. Mas os bons tempos começam a minguar e com o passar do tempo e das
ocasiões, vem uma sensação de oportunidades perdidas e erros, resultando numa
potente melancolia.
Opinião
por Artur Neves
Desta vez o título português
respeitou em absoluto o título original apenas traduzindo-o e pode induzir o
espectador que se trata de pessoas más, sem carater, ou semelhante. Nada mais
errado porque todos os protagonistas são pessoas normais, que cometem erros,
têm sentimentos e são bastante empáticos ao ponto de ser fácil simpatizarmos
com eles.
A história mergulha no
pormenor da auto consciencialização como pessoa e na dolorosa transição para a
idade adulta no final da adolescência ou pelo menos numa altura em que os “vapores”
dessa idade ainda não se esbateram totalmente e julgamos poder continuar a
sentir a sua bonomia quando a vida nos mostra as opções e motiva-nos fazer
escolhas para as quais nem sempre teremos as ferramentas necessárias, ou simplesmente
não as queiramos ainda utilizar para prolongar o momento.
Julie (Renate Reinsve) é
inteligente, estuda medicina mas a matéria não a prende como ela pensava e
vagueia espiritualmente nas aulas pensando que isso é o cérebro a
recomendar-lhe para se dedicar à psicologia e aos problemas do espírito em vez dos
do corpo. Tenta essa vertente mas depressa sente que prefere fixar as situações
e as pessoas nelas e dedica-se à fotografia, que igualmente não lhe trás a
compensação esperada. Ela está perto dos 30 anos e a sua insegurança mergulha-a
numa crise de autocomiseração levantando questões identitárias sobre qual será a
sua missão, qual o seu objetivo, que fins pretende alcançar. Como pode
pensar-se este é um tema rebuscado e a abordagem do argumento de Joachim Trier (o
realizador) e Eskil Vogt, leva-nos mais longe na apreciação de pormenores
íntimos nas relações, com surpresa e humor.
Julie na sua busca de si
estabelece uma relação com Aksel (Anders Danielsen) 10 anos mais velho que ela,
racional e analítico que a apoia e acompanha nas suas dúvidas. Porém, isso
fá-la sentir que ele é de outro mundo e que as certezas dele não são as
respostas para as suas dúvidas, ela é mais volátil e procura uma relação mais
leve com Eivind (Herbert Nordrum) um estranho que ela encontra numa festa de casamento
com que se cruzou na rua quando deambulava nas suas reflexões existenciais. Eivind
é diferente de Aksel e com ele, ela consegue um envolvimento interessante,
respeitador e a roçar o realismo mágico da “não traição”. O envolvimento é
superficial, efémero e apresenta características que nos encantam e divertem,
todavia deixa marcas indeléveis no espírito de Julie ao ponto do seu “não caso”
a fazer comparar as duas relações e a concluir que sem serem melhores ou piores
entre si são distintas nos relacionamentos que conseguem estabelecer.
A história é filmada por
vezes de câmara na mão, mas sempre bela, introduzindo um lirismos que se
aprecia pela representação da neurose urbana de Oslo e que se evidencia numa
das decisões de Julie em que ela corre ao encontro de Eivind pelas ruas num
quotidiano vulgar, mas em que tudo pára, congelado nas suas posições, enquanto
ela oscila entre as suas preferências (fotografia do poster). O diretor de
fotografia Kasper Tuxen, já foi distinguido com o prémio da Melhor Imagem no Festival
Internacional de Cinema de Chicago mostrando-nos que o olhar e a representação das
cenas estão em harmonia com o realismo mágico sem nunca entrarem em conflito
entre si.
Joachim Trier é um parente
afastado do dinamarquês Lars von Trier, mas as influencias entre os dois
fazem-se sentir neste filme, embora por motivos muito diferentes. “A Pior
Pessoa do Mundo” é o completar de uma trilogia iniciada com “Reprise” em 2006,
sobre uma relação entre dois amigos profissionalmente competitivos e “Oslo, 31
de Agosto” em 2011, sobre um dia na vida de um jovem viciado em drogas mas em
recuperação que recebe contactos indesejáveis para o seu tratamento. Da trilogia
prefiro o presente filme, não só pela subtileza do tema como pela abordagem
encetada sem culpa nem castigo. Recomendo vivamente.
Tem estreia prevista em sala
dia 10 de Fevereiro
Classificação: 8 numa escala
de 10
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