10 de fevereiro de 2022

Opinião – “O Bando de Ned Kelly” de Justin Kurzel

Sinopse

"O Bando de Ned Kelly" é a história verdadeira do fora de lei australiano mais famoso de sempre e da sua trágica queda à revolta que o levou às trevas. Um relato dos anos mais jovens da vida de Ned e o tempo que antecedeu à sua morte em que o filme explora os limites confusos entre o bom e o mau, e as motivações para a morte do seu herói que recrutou um exército e planeou uma rebelião lendária para libertar a sua mãe. Juventude e tragédia colidem no bando de Ned Kelly e na essência desta história está um amor fragmentado e poderoso entre uma mãe e um filho.

Opinião por Artur Neves

Este filme é uma viagem à inocência de um menino que não queria nada para além de proteger e manter as necessidades de subsistência fundamentais à sua família, no início da colonização da Austrália no século XIX, pelos povos anglo-saxónicos de Inglaterra e da Irlanda com base no romance premiado com o Booker Prize, de Peter Carey, nascido na austrália em 1943 e atualmente a viver em Nova Iorque.

Ned Kelly (nascido em dezembrode1854 e falecido em 11 de novembro de 1880) é hoje ainda um herói ambíguo da cultura australiana, uns abominam a sua memória e as suas façanhas criminosas, outros consideram-no carinhosamente como o Robin Hood da Austrália, profusamente difundido e considerado um dos símbolos nacionais mais conhecidos. O realizador Justin Kurzel logo nas primeiras imagens do filme avisa-nos de que; “nada que o público verá em seguida é verdade” para manter a sua liberdade de trabalhar a lenda da forma que bem entender e para permitir a quem assiste tirar as suas próprias conclusões através do que nos apresenta, muitas vezes no limite do real e da sanidade, considerando que através dos tempos o misticismo que envolve Ned Nkelly tem crescido e adensado, ao ponto de só em 20 de Janeiro de 2013, os parentes atuais de kelly enterraram os seus restos mortais no cemitério de Greta, perto da sepultura da sua mãe, depois de múltiplas investigações arqueológicas sobre a localização do cadáver, após a execução da condenação à morte por enforcamento na prisão, que o vitimou.

A história começa com kelly (George MacKay) ainda menino, (Orlando Schwerdt) numa casa pobre e despojada de comodidades, matando animais e protegendo a mãe, Ellen Kelly (Essie Davis) e os seus irmãos, como insurgindo-se contra a presença constante do sargento O'Neill (Charlie Hunnam) quando espiava as atividades da mãe recebendo-o clandestinamente para obtenção de proventos em dinheiro. A miséria era muita, com a morte do pai ele assume definitivamente a família, e a mãe para o preparar e obter algum dinheiro, vende-o a Harry Power (Russell Crowe, já algo afastado das grandes produções que o notabilizaram), na época um foragido perigoso já amplamente referenciado pela polícia, com o intuito de o ensinar nas duras leis da vida e providenciar uma visão mais abrangente da realidade que lhe permitisse ocupar as novas funções de chefe de família.

Esta infância difícil vem a transformá-lo na idade adulta no assassino que a lenda lhe atribui. A certa altura quando um polícia que se relacionava com ele, Constable Fitzpatrick (Nicholas Hoult) ameaça a vida de um bebé e ele enfrenta-o empunhando uma arma diretamente à sua cara, Fitzpatrick despreza-o dizendo que ele não é um homem, mas sim continua o mesmo menino, embora mais crescido e com ambições que não pode alcançar. É esta ambiguidade narrativa que o realizador imprime à história que a transforma num filme dinâmico e criativo no sentido visual, seja na preparação do seu exército que se desfaz no exato momento de agir, como no planeamento da ação que é revelada ao inimigo por um prisioneiro, como envergando uma armadura de metal moldado para o proteger das balas da força policial que o captura, depois de uma sangrenta luta em que ele sabe não ter possibilidade de vencer.

O filme é maioritariamente rodado em ambiente noturno, com uma suficiente dosagem de momentos épicos, enquadrados por uma banda sonora bem conseguida e suficientemente capaz de transmitir emoção e realismo a uma violência de dimensão louca que transforma heróis em vilões conseguindo transmutar o personagem entre ambas as facetas e consagrando-lhe a humanidade que o símbolo possui hoje. É interessante, merece ser visto.

Tem estreia prevista em sala dia 17 de fevereiro

Classificação: 6 numa escala de 10

 

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