15 de fevereiro de 2022

Opinião – “Cyrano” de Joe Wright

Sinopse

Em Cyrano, o premiado realizador Joe Wright envolve os espectadores numa harmonia de emoções, música, romance e beleza, reinventando esta intemporal história sobre um comovente triângulo amoroso. Um homem à frente do seu tempo, Cyrano de Bergerac (interpretado por Peter Dinklage) deslumbra tanto com os seus ferozes jogos de palavras em disputas verbais, como com a sua esgrima formidável em duelos. Mas, convencido de que a sua aparência o torna indigno do amor de uma fiel amiga – a resplandecente Roxanne (Haley Bennett) – Cyrano não lhe declara os seus sentimentos e Roxanne apaixona-se à primeira vista por Christian (Kelvin Harrison, Jr.).

Opinião por Artur Neves

“Cyrano” é mais uma versão para cinema da peça de teatro feita em 1897 pelo poeta e dramaturgo francês Edmond Rostand, inspirado na vida real de Cyrano de Bergerac, um homem que viveu em 1600, impetuoso nos duelos de espada, com dotes linguísticos e de escrita e também um verdadeiro artista musical, provido de um nariz demasiado proeminente que o desclassificava aos seus próprios olhos de ser merecedor do amor por uma prima distante, Roxane, que ele amava em silêncio. Deixo aqui já um aviso que se trata de um filme musical, nem sempre do agrado do público cinéfilo.

A argumentista Erica Schmidt pegou na peça original e reinventou-a alterando a caraterística identitária de Cyrano de forma a poder servir para um novo personagem interpretado pelo seu marido Peter Dinklage, bem conhecido do grande público e com talento reconhecido na série da HBO “A Guerra dos Tronos” (2011 a 2019), transformando-a num conto sobre um afeto profundo vivido em segredo e não correspondido, mais ao jeito das histórias de amantes infelizes que pululam na obra de Shakespeare. Assim este filme é mais uma adaptação de Hollywood aos contos clássicos que pela ousadia da sua transformação literária e pela mão de Joe Wright consegue alcançar um resultado híbrido entre o clássico de amor e os filmes de capa e espada.

Relembro que as obras anteriores mais notórias de Joe Wright, como “Orgulho e Preconceito” de 2005 ou “Expiação” de 2007 eram histórias sensuais, com desenvolvimentos ricos em detalhes íntimos, que neste seu “Cyrano” só podemos sentir por uma expressão de vontade, considerando que a profusa banda sonora de Bryce e Aaron Dessner (The National) consegue interromper a demonstração sentimental dos personagens. As peças que mais se destacam são uma música rock durante a intervenção do vilão e uma balada triste ao piano que enquadram os lamentos secretos de Cyrano mas de difícil recordação após o contexto em que a ouvimos. Por outro lado, sempre que assistimos a uma narrativa entre quaisquer personagens, logo o diálogo é substituído por música a que se segue outra, assumindo-se com todos os defeitos e vantagens dos filmes musicais.

Decorrente da experiencia de Dinklage o argumento permite-lhe muitas hipóteses de usar o seu pendor cómico, bem como exibir a sua tristeza de rigidez de rosto enquanto as lágrimas lhe caem dos olhos quando Roxane lhe revela que está apaixonada por outra pessoa. Ele nem pestaneja e congela a expressão tornando-a numa máscara destroçada de tragédia. Roxane, pelo seu lado exibe uma visível energia emotiva para equilibrar o desempenho de Cyrano, constituindo com ele o par mais desligado do romance.

É admirável a ideia destas pessoas em recriar uma nova versão de “Cyrano de Bergerac” que se distinga das suas congéneres, sem nariz e com outras caraterísticas que valorizam este personagem pouco conhecido, despindo-o de grandes tiradas teatrais e substituindo-as por um naturalismo adequado à modéstia das melodias, todavia isso não consegue ultrapassar que o amor central da peça, apesar de muito cantado por todos, se cinge a uma amizade forçada mal enquadrada no que deveria ser um conto de fadas. Vale o propósito, perde-se o resultado.

Tem estreia prevista em sala dia 24 de fevereiro

Classificação: 5 numa escala de 10

 

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