19 de janeiro de 2022

Opinião – “Ilusões Perdidas” de Xavier Giannoli

Sinopse

Lucien (Benjamin Voisin) é um jovem poeta desconhecido na França do século XIX, com grandes esperanças e aspirações. Deixa a tipografia na sua província natal para tentar a sorte em Paris sob tutela da sua mecenas. Rapidamente deixado à sua sorte nesta fabulosa cidade, Lucien descobrirá os meandros deste mundo submisso à lei do lucro e do fingimento.

Uma comédia humana onde tudo tem um preço, seja sucesso literário ou imprensa, política ou sentimentos, reputações ou almas…

Adaptação do livro “Ilusões Perdidas” (Comédia Humana) de Honoré de Balzac.

Filme da competição oficial no 78.º Festival de Veneza

Opinião por Artur Neves

Quem conhece o escritor do século XIX Honoré de Balzac deve ter a noção de que este romance constitui a obra capital do conjunto de 98 obras completas e 48 incompletas da “La Comédie Humaine” no setor “Études de Moeurs”, mais precisamente da série “Scènes da la vie de province” e constitui o seu romance mais famoso e mais extenso. O romance foi publicado em três partes entre 1836 e 1843. Este romance conta a história de Lucien Rubempré (Benjamin Voisin) que nasceu como Lucien Chardon (Chardon era o nome do pai que ele rejeita e quer trocar pelo nome da mãe; Rubempré) em 1798 em Angoulême e morreu em Paris em 1830 depois de ter sofrido as vicissitudes contadas no romance e magistralmente adaptadas ao cinema por Xavier Giannoli, um realizador francês nascido na década de 70 que tem no seu curriculum outros filmes interessantes, nem sempre conhecidos como mereceriam.

O filme porém não integra todo o romance e conta a história do 1º e 2º livros (o mais importante) começando com Lucien como funcionário de uma tipografia e com vincadas tendência para a palavra e a escrita, nomeadamente poesia que resolve demitir-se para procurar melhor vida na cidade, Paris, depois de ser descoberta a sua relação com Luisa de Bargeton (Cecile de France) uma dama da nobreza da província que farta de ser infeliz com o seu marido por este dar mais atenção aos cavalos e à caça do que a ela, cedendo aos encantos de Lucien e às sua declarações em verso dando origem a um caso de amor intenso que preenche a vida de ambos. Quando o caso é conhecido pelo marido de Bargeton, ambos são obrigados a fugir e fogem juntos cometendo um grave “pecado” para os preceitos da época que poe em causa a o comportamento de Bargeton no contexto da nobreza reconhecida pela sociedade parisiense.

Decorrente disso, eles são obrigados a separar-se e Lucien fica entregue à sua sorte numa cidade totalmente desconhecida e com ideias de pureza e de escrita completamente desajustadas à vida real da época. Inicialmente lady Bargeton tenta protege-lo mas ele comporta-se de modo ridículo na ópera que justifica sua prima a marquesa d’Épard (Jeanne Balibar) a abandoná-lo para não se comprometer diante da alta sociedade parisiense, o que o faz aperceber-se da sua condição miserável nos meios mais elegantes da sociedade parisiense.

Ele fica assim entregue a si próprio, muito embora o marido da marquesa d’Èpard lhe tenha arranjado um lugar onde ficar e lhe tenha dado algum dinheiro para os primeiros tempos que de seguida lhe é roubado devido à sua inocência em o guardar em casa e sair sem ele. A partir daqui vê-se a ascensão atribulada da sua pessoa como jornalista, da qual não me vou deter em pormenores, ao seu romance com Coralie (Candice Bouchet), á sua perda de valores com que largou a província e onde foi educado, e duma maneira geral à entrada na sociedade parisiense que inicialmente o recusou, usando nos mesmos degraus que foi aprendendo na sua dura luta pelo pão de cada dia. Todavia o sucesso cega, ele começa a gastar mais do que ganha e rapidamente volta à estaca zero, volta ao início, mas com uma grande lista de inimigos e de credores que o fazem voltar à província, a Angoulême, que é onde o filme termina.

O terceiro livro não faz parte do filme e conta o seu ressurgimento já com a experiencia entretanto obtida, que o faz voltar a Paris e morrer calmamente em 1830. De facto a parte mais significativa desta história é o segundo livro onde o filme magistralmente encena a sociedade da época, a evolução social do jornalismo e a sua relação com a política, o dinheiro, a nobreza, os costumes, mostrando-nos o que eram as trapaças, a falta de respeito com o próximo onde Dauriat (Gérard Depardieu) um editor negreiro, era o expoente máximo, da maledicência mútua para a qual não fazia qualquer falta a inexistência de redes sociais como hoje as conhecemos, sendo nesta vivencia social que o filme mais se destaca ao apresentar-nos uma caricatura da sociedade desta época.

Todo o filme está muito bem feito, com decors muito bem construídos, filmagens à luz de velas e muitos atores secundários que compõem a Paris fervilhante de 1800 com o aparecimento do que mais tarde se vem a chamar de Boulevards. É um filme com uma duração de 150 minutos e uma narrativa história rica em pormenores que nos são narrados ao longo de toda a história, que recomendo sem reservas.

Tem estreia prevista em sala dia 20 de Janeiro

Classificação: 8 numa escala de 10

 

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