Sinopse
Três Andares foi um dos
filmes mais consensualmente aplaudidos do último festival de Cannes, onde
Moretti regressou em competição com esta história de um prédio de Roma habitado
por três famílias que, ao longo de dez anos, têm de lidar com situações
dolorosas, difíceis e desconfortáveis. As escolhas que cada um faz vão determinar
o curso da sua existência. Uma adaptação do romance do escritor israelita
Eshkol Nevo, o filme conta com as magníficas interpretações do próprio Nanni
Moretti, Margherita Buy, Riccardo Scamarcio e Alba Rohrwacher.
Opinião
por Artur Neves
De Moretti recordo à 20 anos
atrás o seu prémio da Palma de Ouro em Cannes 2001 com o filme “O Quarto do
Filho”, onde Moretti mostrou que soube construir inquietações e estados de
espírito intensos relativamente aos valores familiares, quando toda a família
sofre o revés da morte do filho num acidente de mergulho. A história
densifica-se quando Moretti (que protagoniza a interpretação do pai) entra numa
espiral depressiva através da obsessiva insistência em projeções contrafactuais
que em nada ajudam a realização do luto, nele próprio como na família,
induzindo outros males.
Desta vez Moretti fez tudo diferente.
Com base no romance “Three Floors Up” (que dá nome ao filme) escrito pelo
israelita Eshkol Nevo e originalmente ambientado em Tel Aviv, enveredou por nos
mostrar os infortúnios e os incidentes lamentáveis que ocorreram aos inquilinos
de três andares de um prédio situado numa zona de classe média suburbana de
Roma e das consequências desses eventos ao longo de 10 anos, sob uma abordagem
que tresanda a melodrama, enfatizando o lado negativo como se não tivesse
havido nada de recomendável e de auspicioso durante esse mesmo período. É tudo infortúnio
e desgraça, que embora apresentem uma sequência lógica, são analisados pela superficialidade
dos acontecimentos, quase dando a entender que Moretti reuniu o cardápio da
desgraça e “meteu tudo no assador” para nos fazer puxar a lágrima ao canto do
olho.
Na sua nota de realização
sobre o filme, Moretti refere que quis abordar “…temas universais como a culpa,
as consequências das nossas escolhas, a justiça e a responsabilidade que
acompanha a parentalidade” e reconhecemos que estas vertentes estão espelhadas nas
histórias, através de eventos concentrados naquelas três famílias, mas que nos
soa a falso, revelado pela manipulação da realidade para nos encharcar com o melodrama
de todas aquelas felicidades.
E começa logo no início do
filme, com o irreverente filho Andrea (Alessandro Sperduti) do austero juiz
Vittorio (Nanni Moretti), a provocar um acidente fatal que causa a morte de uma
mulher que atravessa uma passadeira de peões, devido a conduzir embriagado e em
alta velocidade ao chegar a casa, enquanto, ao mesmo tempo, na mesma rua Monica
(Alba Rohrwacher) irremediavelmente grávida, se desloca a pé para o hospital
para dar à luz o filho do seu marido ausente devido a obrigações profissionais que
o mantém fora da cidade. Monica é um pouco lerda das ideias, tem horror da
solidão e tem visões criadas pelos seus sentidos que não são reais, mas que
condicionam o seu comportamento. Para completar o leque, Lucio (Riccardo
Scamarcio), casado com Sara (Elena Lietti) têm uma filha de 7 anos que curte uma
amizade especial por um vizinho idoso que toma esporadicamente conta dela, mas
de quem Lucio suspeita de ser pedófilo, sem que para isso tenha qualquer prova
ou indício concreto.
Com o desenrolar da história
mais personagens vão chegando construindo uma estrutura abrangente com diversas
interações com os inquilinos dos três andares, mas em toda a história o
espectador nunca fica envolvido com qualquer dos personagens que são abordados
superficialmente, atrapalhando-se uns aos outros, com erros, tristezas, dúvidas
e solidão que vivem com elas próprias e as caracterizam criando uma atmosfera
redundante de tédio que não transmite uma ideia clara sobre o que pretende, nem
representa satisfatoriamente o passar dos anos. Moretti costuma impregnar as
suas histórias de drama, polvilhado com alguma ironia que neste filme está
completamente ausente. Parece-me que a história teria resultado melhor se
Moretti tivesse centrado a ação no prédio. Ao apresentar outros locais e outras
envolvências a ação esbate-se e o drama fragmenta-se, embora contenha ainda boas
cenas fortemente emotivas. Se é adepto de um melodrama recheado de estereótipos,
então este filme é para si.
Tem data prevista de estreia
nas salas em 4 de Novembro
Classificação: 5 numa escala
de 10
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