Sinopse
O cinéfilo Mort Rifkin
(Wallace Shawn) acompanha a sua mulher, a assessora de imprensa Sue (Gina
Gershon), ao Festival de Cinema de San Sebastián, em Espanha, pois teme que o
fascínio dela por um cliente, o jovem realizador Philippe (Louis Garrel), não
seja meramente profissional. Mort espera ainda aliviar a pressão que sente para
escrever um primeiro romance que corresponda aos seus exigentes padrões.
Aqui, Mort deixa-se envolver
pelos clássicos do cinema de mestres como Bergman, Fellini, Godard, Truffaut e
Buñuel, sobre os quais deu aulas na faculdade. O encantamento de Sue por
Philippe e o desdém de Mort por este, prejudicam a já desgastada relação
conjugal e a disposição de Mort apenas melhora quando conhece a Dra. Jo Rojas
(Elena Anaya), uma alma gémea a quem o casamento com o intempestivo pintor Paco
(Sergi López) também traz sofrimento. Enquanto Sue passa os seus dias com
Philippe, a relação entre Mort e Jo aprofunda-se e ele reaviva o seu amor pelo
cinema clássico. Ao refletir sobre a sua vida através do prisma desses grandes
filmes, Mort encontra uma renovada esperança no futuro.
Imbuído de um humor absurdo,
Rifkin’s Festival de Woody Allen combina situações irreais com histórias de
amor e desgosto entrelaçadas, prestando uma terna homenagem ao poder
transformador do cinema.
Opinião
por Artur Neves
Mais uma vez Woody Allen é
igual a si próprio e com 84 anos faz um filme em que projeta nos personagens a
suas próprias dúvidas e inseguranças que vimos acompanhando ao longo de toda a
sua já longa e profícua carreira, contudo, sem ser o que poderia ser chamado de
Woody vintage, está acima de alguma
das suas últimas realizações e apresenta-nos uma história em que a ação se
passa no Festival de San Sebastian, em que o filme foi estreado este ano após o
adiamento decorrente da crise pandémica.
Sobre a história a sinopse é
suficientemente elucidativa e retrata-nos um homem; Mort Rifkin (Wallace Shawn)
que é um realizador conhecido, neurótico (tal como Allen) cheio de preocupações
com a sua profissão, que se debate com a suspeita de um amor não correspondido
donde possam resultar infidelidades conjugais e da violentação a que teve de se
sujeitar ao suspender a escrita do seu último romance para acompanhar a sua
mulher Sue ao festival em que ele pensa que essa derivação possa ter lugar.
Adicionalmente, os seus dilemas filosóficos, tal como o sentido da vida e
preocupações com a sua origem judia motivam-lhe a atenção quer durante o dia
como durante a noite, em que ele recria o passado em sonhos a preto e branco e
podemos apreciar a homenagem de Woody Allen aos seus realizadores de eleição,
tais como Buñuel, Fellini e muito particularmente Ingmar Bergman em que se
personaliza em sonho no filme “O Sétimo Selo” numa clara alusão ao seu
posicionamento no mundo.
Para confrontar o
realizador, Philippe, que Sue, a sua elegante e sexy esposa está a promover,
Mort cita todos os grandes clássicos europeus revelando-se apenas como um snob cinematográfico, esquecido na New Wave do cinema francês e desadequado
para o tempo presente, considerando que “Jules et Jim” representa para ele o
que de melhor se fez em cinema e mereceria continuação que ele pretende
corporizar no seu romance interrompido. Claro que nem Philippe nem Sue lhe
prestam a importância que ele julga devida e isso perturba-o ao ponto de sentir
palpitações no coração e cansaço que o levam a consultar um médico em San
Sebastian.
É aqui que o hipocondríaco
Mort Rifkin renasce. O médico é uma bela cardiologista, Jo Rojas, que está no
segundo relacionamento com um artista bêbado e mulherengo, que levanta
idênticos problemas aos encontrados no primeiro casamento do qual se divorciou,
mas que corresponde ao ideal de Mort, que lhe revela a sua preferência, que a
segue, que promove consultas só para estar perto do seu grande amor
recentemente encontrado, promovendo uma versão obscura do que foi vivenciado
por Penélope Cruz e Javier Bardem em “Vicky Cristina Barcelona” (parece que Allen
deixou Nova Iorque de vez). O súbito amor de Mort por Rojas é triste e
ridículo, assim como todas as referências de Allen aos filmes e aos seus
autores que por muito genuínas que sejam não são mais do que lembranças de
outras vidas para as quais Mort não encontra sentido e por isso as procura.
Rifkin’s Festival navega nas
águas em que Allen tem navegado nas duas últimas décadas e não tenhamos dúvidas
que tem navegado bem, mas no todo resume-se a uma angústia conjugal legítima
(digo eu) transformada num revivalismo frágil de grandes obras que Allen tem
como referência mas que não são efetivamente mais do que isso. É um filme relativamente
divertido, virado para os indefectíveis de Woody Allen mas sofre de falta de
inspiração criativa embora um pouco menor do que em algumas das suas criações
recentes.
Estreia nas salas a 23 de
Setembro
Classificação: 6 numa escala
de 10
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