20 de fevereiro de 2021

Opinião – “Vicky Cristina Barcelona” de Woody Allen

Sinopse

Vicky (Rebecca Hall) e Cristina (Scarlett Johansson) são amigas e passam as férias de verão na casa de uma amiga, Judy Nash (Patricia Clarkson) em Barcelona. Vicky está noiva e é sensata nas questões do amor. Cristina é pura emoção e movida pela paixão. Durante uma exposição de arte, as duas se encantam pelo pintor Juan Antonio (Javier Bardem), que as convida mais tarde, durante um jantar, para um fim de semana de comida, arte e sexo. O que elas não sabiam é que o galante sedutor mantém um relacionamento problemático com sua ex esposa Maria Elena (Penélope Cruz). E as coisas ainda ficam piores porque as duas, cada uma de sua forma, se interessam por ele, dando início a um complicado "quadrado" amoroso.

Opinião por Artur Neves

Enquanto as estreias mais sonantes ficam reservadas para melhores dias no futuro, é tempo de revisão de filmes que nos ficaram na memória e desta feita elegi este, da fase europeia de Woody Allen, quando Scarlett Johansson era a sua musa preferida. Está algo distante da sua homenagem a Londres e a esse thriller de eleição; “Match Point” de 2005, escrito e realizado por ele e passado numa família da alta burguesia inglesa, todavia em “Vicky Cristina Barcelona” o modo de abordar, com a necessária ligeireza, a volubilidade do amor e a constância das escolhas humanas no campo sentimental e afetivo, merece amplamente a sua revisitação pela permanente atualidade do tema.

A sinopse revela toda a história, pelo que não vou repeti-la e apenas quero lembrar que para acentuar o tom ensaístico com que o tema é abordado o filme é narrado por Christopher Evan Welch e embora não acrescentado nada que não se veja nas cenas apresentadas tem o condão de nos antecipar a fundamentação do que iremos apreciar deixando-nos mais atentos para o desenrolar da ação.

O elenco utilizado no filme é todo de primeira água, Rebecca Hall é quem assume o papel mais difícil de uma americana com ideias segura e convencionais sobre o que pretende da vida, deixando-se envolver com reservas, por um Javier Bardem (sem o corte de cabelo à pajem que utilizou no excelente “Este País não é para Velhos”) no papel de um pintor espanhol que na noite em que as conhece, as convida sem rodeios para autenticarem a visita a Espanha num fim de semana em Oviedo sem regras nem limites. É uma sedução ousada, feita por um sedutor existencial que defende ser o prazer a compensação adequada para o sofrimento e as dores da vida.

Vicky resiste aos seus avanços, contrariamente a Cristina, sexualmente aventureira que os aceita, acreditando que o amor só nos envolve a partir de uma grande paixão inicial e independentemente do seu desfecho. Scarlett Johansson é uma atriz naturalmente talentosa e possui uma sensualidade mais exuberante e luminosa do que Marilyn Monroe, porque mais genuína, menos trabalhada e neste filme ela apresenta um visual que grita “sexo” por todos os poros.

Finalmente temos Maria Elena num personagem tresloucado pelo amor enviesado que nutre por Juan Antonio, o seu marido, ex-marido, amante de todos os momentos numa efervescência furiosa. Assume o atual caso com Cristina participando numa ménagem à trois como ativador de uma relação em permanente sobressalto. Penélope Cruz também apresenta um visual que grita sexo, mas aqui com a diferença de ser sexo latino, possessivo, ciumento, determinista, com as suas próprias regras e o seu meio de cativação do outro. Neste filme ela ganhou uma nomeação para o Oscar de atriz secundária e embora não o tendo ganho, obteve diferentes prémios do cinema espanhol pela sua exuberante interpretação.

Nesta altura Woody Allen recompunha na Europa algumas irregularidades da carreira nos Estados Unidos, pelo que se preocupou em divulgar alguns ícones locais, como Gaudi e Miró, através da arquitetura e da pintura exposta na galeria de Judy Nash. A música tradicional de viola solo também não foi esquecida nos jantares de Juan Antonio e Cristina, mas no tema e na forma como ele se desenvolve reconhecemos a mão de Allen nas personagens de Vicky e Cristina, como duas mulheres complicadas mas cada uma do seu jeito. Ambas se sentem perdidas nas escolhas que fazem. Ambas avançam e recuam por caminhos incertos e o que as distingue é somente o modo como encaram a vida e o amor, compondo um quarteto de personagens, pelo qual se pode ensaiar o estudo de relacionamentos amorosos só parcialmente funcionais, o que nos remete para a questão fundamental de todos os filmes de Woody Allen.

Um filme com 13 anos, perfeitamente visível, com um tema eterno que recomendo para ver, ou rever, através de um DVD, ou da plataforma Amazon Prime Video.

Classificação: 7 numa escala de 10

 

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