1 de outubro de 2020

Opinião – “O Ninho” de Sean Durkin

Sinopse

Rory (Jude Law), um empresário carismático, muda a sua família para a Inglaterra na esperança de lucrar com a Londres em expansão, de 1980. Mas quando a sua mulher, Allison (Carrie Coon), sente dificuldades para se adaptar e a promessa de um começo novo e lucrativo começa a esfumar-se, o casal tem de encarar as verdades indesejadas que residem sob a superfície do seu casamento. O “Ninho” é o mais recente filme de Sean Durkin, vencedor em Cannes do Prémio Regards Jeune com o filme “Martha Marcy May Marlene” (2011).

Opinião por Artur Neves

A história que nos conta este filme situa-se na década de 80 e começa nos USA, sob a presidência de Reagan e Margaret Theatcher no Reino Unido. É a época de ouro dos yuppies, pessoas que jogavam na bolsa e ganhavam muito dinheiro que lhes perturbava o discernimento por confundirem oportunidades avulsas com sucesso e capacidade negocial. É o caso de Rory O'Hara (Jude Law) inglês de nascimento numa família modesta que seguindo o sonho americano conseguiu riqueza na bolsa, vive numa casa que é uma homenagem ao bom gosto, dois carros na garagem, a mulher Allison (Carrie Coon) é uma empresária de sucesso treinando cavalos e ministrando aulas de equitação. Têm dois filhos, Samantha (Oona Roche) do primeiro casamento de Allison é ginasta e Ben (Charlie Shotwell) filho do casal com 10 anos frequenta uma boa escola e joga futebol com o pai na beira da piscina.

Tudo corre bem, exceto o auto convencimento de Rory no seu sucesso infindável, que desafia Allison a mudarem-se para Inglaterra, com a promessa de um sucesso ainda maior, com o desejo de seguir o dinheiro antes que ele acabe nos USA, iniciando uma carreira no Reino Unido como continuação do contágio da atividade bolsista na Europa. Rory não se apercebe que apenas pretende limpar a imagem de fraqueza com a vida modesta que levava quando saiu uns anos antes. Naquela altura para ele, apenas a progressão financeira sem limites conta desvalorizando a felicidade que tem e a estabilidade sentida por todos os membros da família. Naquela altura apenas o seu umbigo conta, embora ele ainda não saiba.

Mudam-se para uma propriedade rural no Surrey que Rory comprou, uma casa imponente mas sombria, quase uma velho castelo que transmite surpresas e mistérios das vidas passadas. Para aliciar a família comprou prendas extravagantes para todos. Para si guardou secretamente a possibilidade de provar que pertence a uma classe superior do que as pessoas pensavam dele quando saiu, sem discernir que a adaptação da sua família ao local e ao ambiente rural é penosa e está lentamente a provocar a sua desagregação e perda de sentido.

O que se segue é a queda ao abismo das emoções, muito bem construída por um argumento robusto escrito pelo realizador Sean Durkin que em cada cena, em cada gesto, em cada momento nos apresenta muitas coisas simultaneamente que correspondem a diferentes níveis de desestruturação duma relação que se desvanece em cada contacto.

Todos os personagens estão bem defendidos, mas destaco particularmente Allison (Carrie Coon) que sucessivamente se vai perdendo num devaneio privado e entre cigarros compulsivamente fumados, como no jantar de negócios em que deliberadamente se sente incapaz de suportar por mais tempo as bazófias do marido e o abandona à mesa, ou depois de sair do restaurante o seu auto aturdimento numa boite local entre dois vodkas e uma dança frenética pavoneando-se em círculos para reivindicar território e aliviar uma insustentável pressão que a asfixia. Rory (Jude Law) está igualmente bem num personagem entre o vitorioso e os destroços de um sonho, tem boa aparência e carisma para vender ideias e oportunidades, embora descuide os detalhes pela obsessão em se mostrar próspero, arrastando Allison e os filhos em apostas imprudentes em que só ele acredita.

Toda a história funciona num crescendo de ansiedade e no final tanto os personagens como o espectador já conhecem todo o figurino, permitindo que o desconforto se transforme num sentimento de aceitação do real. Nem a casa, nem a mudança, nem o ambiente são responsáveis pelos factos, apenas Rory tem de reconhecer e aceitar o seu falhanço para poder recuperar a sua vida. Os sinais de alerta estiveram visíveis para todos, somente Rory não os viu, ou pior, negligenciou-os, Nós entendemos isso e esperamos que Rory também o entenda. Muito interessante, bem conseguido, não se dá pela passagem de 107 minutos, recomendo.

Classificação: 7 numa escala de 10

 

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