Sinopse
O filme conta uma história de
ficção sobre o drama de uma família portuguesa emigrada no Reino Unido, em
dificuldades e com trabalhos precários, que tenta recuperar a guarda dos
filhos, que lhe foram injustamente retirados pelos serviços sociais ingleses
por suspeitas de maus-tratos.
Opinião
por Artur Neves
“Listen” que em tradução livre
se pode assumir como; “Escute” é a primeira longa-metragem da atriz e agora
também realizadora portuguesa Ana Rocha de Sousa que foi distinguida no
Festival de Cinema de Veneza, em Itália com os prémios; “Leão de Futuro” para
primeiras obras e o prémio especial “Horizontes” atribuído pelo júri. A sua
estreia nas salas portuguesas está prevista para o próximo dia 22 de Outubro.
Além das nomeações
mencionadas o filme recebeu também outros prémios paralelos, tais como; “Sorriso
Diverso Venezia”, pela sua abordagem a questões sociais e o prémio “Bisato
d’Oro de Melhor Realização”
Devo dizer ainda que embora
classificando o cinema português como generalizadamente medíocre e provinciano,
senti-me agradavelmente surpreendido (pela 2ª vez, registe-se, a primeira, foi
com o também recente filme “O Ano da Morte de Ricardo Reis”) com a qualidade e
dimensão humana desta história, na linha do argumento de Ken Loach, no seu “Eu,
Daniel Blake” de 2016, mas com um “sabor” português, amistoso e envolvente,
muito diferente da frieza crua e por vezes impessoal, do realizador britânico.
A história assenta numa
alteração das leis britânicas em 2014, relativamente à criação de instituições particulares
de solidariedade social (algo semelhante às nossas IPSS) a quem foi atribuída a
incumbência da proteção de menores encontrados em situações de pobreza extrema
e de maus tratos, com vista à sua adoção por famílias de acolhimento. O problema
reside em que essas instituições assumem os custos da educação dos menores até
à maioridade, através da participação financeira do estado Inglês, ficando eles
a gerir as despesas e constituindo-se como empresas de adoção, criando
condições em que o “superior interesse da criança” é o menos defendido e o mais
afetado.
Esta atitude apresenta-se
com mais premência aos emigrantes, decorrente da sua situação de inferioridade
no desconhecimento da língua e das leis vigentes no sistema social do Reino
Unido, também ele com múltiplas fragilidades. O filme acompanha assim o drama
de uma família portuguesa emigrada, a quem estas empresas, mandatadas pelos
serviços sociais e com cobertura legal, lhe retiram os três filhos menores por
alegadas suspeitas de maus tratos.
O que se segue é a tentava
de corte dos laços familiares, com visitas curtas e fortemente vigiadas entre
os pais e os filhos em processo de adoção forçada, reconhecida pela lei, onde discricionariamente
se impõem regras impossíveis de cumprir mas que dão origem à interrupção
compulsiva das visitas, acusações de maus tratos não fundamentadas, bem como
uma série de barreiras que apenas servem para cortar os laços dos filhos
cativos, aos seus progenitores. A esperança assenta numa organização clandestina
encabeçada por Ann Payne (Sophia Myles) que promove a justiça nos casos atendíveis.
A família é composta por
Bela (Lúcia Moniz) que defende muito bem o seu personagem, apresentando uma mãe
visivelmente angustiada e perturbada com o destino dos seus filhos, o pai, Jota
(Ruben Garcia) com um emprego precário e um verdadeiro estilo latino naquela
situação, e os filhos, dos quais destaco Lu (Maisie Sly) uma criança surda muda
de ar angelical que cumpre com segurança o seu personagem.
A representação é adulta,
convincente, sem hesitações nem falhas que lhe tirem credibilidade antecipando
outros voos se forem concedidas “asas” a esta promissora atriz que deixa aqui
uma consistente prova das suas competências de realização. A história não é
lamecha, contemplativa ou fatalista, como é apanágio de muitas das nossas
realizações e em todo o tempo não deixa questões em aberto que não sejam
respondidas. É cinema realista do melhor, gostei e recomendo sem reserva.
Classificação: 8,5 numa
escala de 10
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