Sinopse
Em Knockemstiff, no Ohio e
nas redondezas, estranhas personagens - um falso pregador (Robert Pattinson),
um casal de assassinos em série (Jason Clarke e Riley Keough) e um xerife
corrupto (Sebastian Stan) - convergem em torno do jovem Arvin Russell (Tom
Holland) enquanto ele luta contra as forças do mal que o ameaçam a ele e à sua
família. Passado entre o fim da Segunda Guerra Mundial e o início da guerra do
Vietname, o filme do realizador António Campos, apresenta um cenário ao mesmo
tempo horrendo e sedutor que opõe justos e corrompidos. Adaptado do romance de
Donald Ray Pollock.
Opinião
por Artur Neves
A história deste filme
adaptada do romance de Donald Ray Pollock, de 2011, com o mesmo nome, que também
faz de narrador da acção, mostra-nos a vida da américa rural depois da guerra
com o Japão em 1957, da qual o pai do protagonista Willard Russell (Bill
Skarsgård) nos há-de apresentar memórias aterradoras de uma vida implacável,
ornamentada de crueldade e miséria que serve de base e formação do seu filho Arvin
Russell (Tom Holland) que nunca se libertará do sacrifício do seu cão Jack
morto pelo seu pai como moeda de troca para Deus lhe conceder a ressurreição da
sua mãe Charlotte (Haley Bennett) vitimada por um cancro sem cura. Todavia como
ela inevitavelmente morre, ele tira a sua própria vida pelo insucesso da sua
esperança num Deus misericordioso, que imprime em Arvin a noção elementar de acção
- consequência.
Muitos outros males
provocados por um Diabo omnipresente vão-se seguir ao longo dos 138 minutos
deste filme, numa ladainha de horrores que mostram o mal como um veneno
infiltrado na vida de todos os personagens, veiculado por uma fé cega em que se
baseia a prática da sua religião, seja por zelo piedoso ou por pura perversão
ancorada na ignorância e na vida limitada dos seus praticantes.
O realizador de origem latino-americana,
nascido em Nova Iorque e autor do argumento em parceria como seu irmão Paulo
Campos, mostra-nos que o mal está em todo o lado e sobrevive em todas as
comunidades, transportado por hospedeiros humanos, desde que estes se disponham
a disseminá-lo sobre o manto diáfano da fé num Deus castrador e impositivo,
desde que a sua vontade não seja obedecida em conformidade com os cânones sociais
que os divulgam.
“Sempre o Diabo” (The Devil all the Time no original) compõe-se
assim de um conjunto de pessoas horríveis, ligadas pela fé, fazendo coisas
terríveis uns aos outros para provar que a raça humana é a única que espalha o
mal em torno de si própria sem qualquer razão para lá da sua vontade e
interesse. Não quero revelar os personagens criados no filme porque cada um
apresenta uma especificidade da maldade que exibe, mas estão todos bem
conseguidos, credíveis e recriam o modelo gótico da sociedade sulista dos USA,
sem subtilezas e acompanhados nos seus atos por canções pop vintage
generalizadamente inocentes que se tem tornado frequente nos trabalhos recentes
de David Lynch e Quentin Tarantino como pano de fundo para a violência mostrada.
Cedo, percebemos que o
principal tema do filme é a religião, qualquer religião que promova o fanatismo
pelas suas premissas, em semelhança com o fanatismo clubista no sentido de quem
não está por nós está contra nós. É a negação da equidade e da tolerância através
da vida quotidiana de três famílias influenciadas pela devoção cega numa crença
que influencia todos os personagens ficando condenados a repetir os erros dos
seus antepassados, por muito que se afastem dessa linha de comportamento.
O argumento é bom, graças à
obra que lhe está na origem e se a narração de Donald Ray Pollock está adequada
ao que as imagens não podem transmitir, conferindo-lhe engenho narrativo na
maior parte do tempo, outras situações há em que Pollock antecipa o que
posteriormente se irá ver, lamentando-se aqui que o benefício literário da sua
exposição se transforme num inconveniente, porque no campo audiovisual as
imagens não precisam do anúncio da sua exposição.
Contas feitas este é um
filme da Netflix ao nível de “O Irlandês” “A História de um Casamento” ou mesmo
“Joker” embora com significativas diferenças de contexto para este. Bem construído,
convincente e bem interpretado está disponível na plataforma desde 16 de Setembro.
Recomendo sem reservas.
Classificação: 8 numa escala
de 10
Sem comentários:
Enviar um comentário