Sinopse
"Antebellum"
centra-se na personagem de Veronica (Janelle Monáe), doutorada em sociologia e
autora de livros de sucesso sobre o tema da privação de direitos dos negros nos
EUA, há muito inscrita de forma profunda no país.
Veronica deixa o marido,
Nick, e a filha, Kennedi, para viajar até Nova Orleães, onde fará uma palestra.
Na cidade do sul, as suas palavras recordam ao público que chegou a hora de os
afroamericanos se fazerem ouvir. No entanto, Veronica ainda não percebeu que o
mesmo destino que a escolheu para nos salvar do passado também a ligou a uma
mulher escravizada dos tempos da Guerra Civil, Eden (também interpretada por
Monáe), que trabalha num campo de algodão entre o calor sufocante enquanto o
fantasma do conflito cresce ao redor dela e de outros que também sobrevivem em
circunstâncias desumanas. Através do tempo e de diferentes mundos e eras, Eden
e Veronica encontram-se em circunstâncias que alteram para sempre as suas vidas
Opinião
por Artur Neves
Este filme apresenta-se como
uma história mística envolvendo algum terror sobrenatural, mas deve mesmo ser
classificado como filme de terror puro e duro, não pelo seu conteúdo, mas pela
forma esdruxula como aborda os factos que quer contar.
Não é que os problemas sobre
a descriminação racial que têm como expoente relevante a escravatura nos
estados do sul dos Estados Unidos da América no final do século XIX, que deram
origem à guerra da secessão entre 1861 e 1865, numa altura em que a morte de
George Floyd acendeu inflamadamente as questões do racismo que não pertencem ao
passado mas que continuam entre nós e na ordem do dia, e como tal não podem ser
esquecidas, mas sim relativamente à forma como são apresentadas neste filme de
cultura pop que mostra a raça negra como
meros corpos em vestes esfarrapadas sem qualquer respeito pela sua identidade e
por tudo o que a seguir se mostra.
O filme começa com as cenas
tradicionais da escravização dos negros numa plantação sulista de algodão em
que se destaca uma escrava, Eden (Janelle Monáe) perseguida por um sádico
capitão sulista e capataz da fazenda, Captain Jasper (Jack Huston) que decreta
a regra de absoluto silencio entre os escravos e captura Eden que havia tentado
escapar. Ela é arrastada até uma cabana onde um general (Eric Lange) a marca selvaticamente
com um ferro em brasa e lhe bate até a prostrar, numa cena que nos lembra a arrogância
histórica de “12 Anos Escravo” e o conteúdo barato de pornografia com tortura,
por cerca de 40 minutos.
Depois consuma-se o
descalabro da história, toca um telemóvel e Eden, com o nome de Veronica, acorda
em 2019, na sua cama com o seu envolvente marido, Nick (Marque Richardson) e a
sua filha Kennedi (London Boyce) na sua casa de luxuoso conforto de classe
média alta a preparar-se para viajar até New Orleans onde vai participar numa
conferencia sobre o seu livro recentemente publicado.
Na receção do hotel
mostram-nos o disfarçável desprezo da rececionista branca pela sua pessoa, bem
como na indicação de uma mesa junto á cozinha no restaurante, por uma empregada,
tentando mostrar que a condição de mulher negra na américa não mudou muito até
agora mas sem qualquer análise nem nota crítica que fundamente ou sequer aponte
o motivo da descriminação. Afinal ela não é uma negra qualquer e para os que se
destacam a américa tem outro figurino de comportamento.
Ainda no hotel, com as suas
amigas há uma cena de invasão no seu quarto por uma menina muito loura de
brancura caucasiana e voz de mel (Jena Malone) que produz um diálogo incómodo
de cariz premonitório mais assustador, mas que em nada resulta porque não tem consequências
diretas. Ela e as amigas saem do hotel para passar uma noite divertida e viajam
em carros diferentes. No carro onde ela viaja, encontra o Captain Jasper que a
rapta e envia de volta a 160 anos antes, para a plantação de algodão, com a
diferença de agora levar o telemóvel que lhe permite enviar a sua localização
para o marido e para a filha apesar de continuar lutar com os seus captores e a
fugir aos seus torcionários.
“Antebellum”, que no final
do filme ficamos a saber que se trata de um parque temático sobre o período da
escravatura nos USA (os americanos encaram os seus esqueletos de frente e não
são como nós que ainda não decidimos criar um museu do Salazarismo) acaba por
ser uma viagem imprópria à violência histórica contra os negros, considerando
que não tem nada a acrescentar à realidade racista de parte do povo americano.
Não sei o que é que os seus realizadores
tinham pensado para esta história, mas para mim é um fracasso artístico de duas
pessoas com um objetivo que superava a sua capacidade de atingi-lo,
considerando as falhas estéticas e narrativas que apresentam num mundo sem
lógica e com personagens tão superficiais e parcos na sua missão. A história
não tem sentido e para ver este filme é necessário assumir que se vai adquirir
um modelo de não cinema.
Classificação: 2 numa escala
de 10
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