Sinopse
Depois de um longo e penoso
processo de adoção, Ema, uma bailarina de "reggaeton", e o seu
marido, Gastón, ficam responsáveis por cuidar de Polo, um menino órfão que
nunca conheceu a estabilidade de uma família. A adaptação revela-se mais
difícil do que imaginavam e algum tempo depois, Polo provoca um acidente que
fere gravemente a irmã de Ema. Este incidente terrível deixa marcas e faz com
que Ema tome a decisão de devolver a criança. Isso vai mudar radicalmente a
forma como Ema e Gastón se vêem um ao outro, a si mesmos e ao mundo que os
rodeia.
Opinião
por Artur Neves
A sinopse anterior descreve
o essencial deste “Ema” realizado por Pablo Larraín realizador Chileno nascido
em 1976 que inclui no seu curricula cinematográfico obras tão diferentes como “Não”
de 2012, um filme sobre revolta e direitos humanos contra a ditadura de Pinochet,
“O Clube” de 2015 em jeito de denúncia sobre pedofilia praticada por religiosos
católicos, que representa o seu filme mais emblemático, ou “Jackie” de 2016
sobre Jacqueline Kennedy Onassis, em jeito de novela, apresenta-nos agora este “Ema”
cujo enredo apenas serve para suportar as personagens que o desempenham em
diferentes situações, as suas vivências, objetivos, filosofias de vida, não
sendo a história o mais importante, que apenas serve como fio condutor dos
eventos que nos vão sendo mostrados durante cerca de 107 minutos.
“Ema” estreou no Festival de
Cinema de Veneza de 2019 e quem conhece Larraín através das obras anteriormente
citadas ou de outras de relevo semelhante, como “Tony Manero”,de 2008, sobre a angustiante
figura e personalidade de um dançarino clássico, vai estranhar esta incursão no
mundo da dança moderna e do "reggaeton", uma dança popular imbuída de
uma expressão corporal intensa e culto da figura, com a qual Larrain parece
algo perdido e só remotamente parece conhecer na sua essência. Recorde-se ainda
que Larrain pertence a uma família da classe alta do Chile que apesar de no
tempo de ditadura terem apoiado Pinochet, não o impediu de realizar “Não”, que constituiu
o mais popular libelo acusatório contra os anos de chumbo desse período histórico.
Ema (Mariana Di Girolamo) é
uma jovem bailarina que exprime através dessa arte os seus desejos, frustrações
e tendências pirómanas, que funciona como metáfora para a combustão das sua
múltiplas paixões, (ela chega a dançar com uma garrafa de combustível ás costas
e um lança chamas na mão que inclui na coreografia) revolta-se contra o facto do
seu marido e coreógrafo Gastón (o mexicano Gael García Bernal) não ser capaz de
a engravidar para lhe permitir ser mãe natural, o que justifica a adoção de
Polo (Cristián Suárez) um órfão a quem ela transmite as desilusões da sua vida
e promove uma educação disruptiva no sentido da promiscuidade e da auto destruição
que vitimou a sua irmã com fogo e que neste filme se torna um elemento
fundamental da narrativa.
Esse evento promove o
abandono de Polo e a separação do casal, depois de diversas acusações mutuas em
que se revelam coisas que não vimos, nem sabíamos até ali, mas que permitem por
parte dos atores interpretações credíveis, intensas, com Ema a polarizar toda a
ação, de olhos fixos no “inimigo” (para ela todos o são) cabelos constantemente
oxigenados e penteado agarrado à cabeça, numa atitude pós adolescente agressiva,
disposta a desafiar todos os que interferirem no seu caminho.
Na sua ânsia de agarrar a vida
procura outro parceiro, que mais tarde viremos com surpresa saber de quem se
trata, embora em todo o filme o universo da dança reflita bem o seu desejo incontornável
por liberdade e por protagonismo na vida de todos os que a cercam.
Ela deseja ser livre com a
mesma intensidade com que deseja ser mãe, não avaliando a incompatibilidade entre
esses objetivos, porque o seu desejo de maternidade decorre da sua turbulência
emocional vivida na infância, para a qual a piromania funciona como o meio de
eliminar o passado que lhe é doloroso. É por tudo isto que “Ema” é estranho ao
universo de Larrain, considerando que apesar de existir uma história, um substrato
coerente emocionalmente válido e escorreito, ele deixa tudo nas mãos de um
personagem tão indomável como indefinível que se consome no fogo que
deliberadamente espalha.
“Ema”, está disponível nas
plataformas Netflix por assinatura, ou em Filmin, pelo preço de €3,95, sem
contrato nem fidelização durante 72 horas.
Classificação: 6 numa escala
de 10
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