24 de abril de 2020

Opinião – “Earth and Blood” de Julien Leclercq


Sinopse

Saïd é dono de uma serração no meio da floresta, que ele decide vender. Mal sabe ele que um de seus aprendizes foi encurralado por seu irmão e forçado a esconder uma grande quantidade de cocaína dentro da sua fábrica. Quando o gangue a quem as drogas pertencem aparece, Saïd rapidamente percebe os quão determinados e impiedosos eles são. Embora em menor número, ele conhece a serração como ninguém. Forçado a defender-se para proteger sua filha Sarah, Saïd transforma a serração numa área de combate. E à medida que o número de vítimas cresce, cresce também a sede de vingança...

Opinião por Artur Neves

O eixo principal da história desenvolve-se no interior da serração na forma de um thriller que se foca na criação de um ambiente de suspense num espaço fechado com muitos possíveis esconderijos para quem não conhece o meio como é o caso do líder dos assaltantes Adama (Ériq Ebouaney) que pretende resgatar a sua mercadoria que foi desviada pela equipa ao seu serviço, implicada no assalto à esquadra que guardava oito quilos de cocaína apanhada pela polícia numa investigação.
Saïd (Sami Bouajila) que se vem a revelar um assíduo colaborador de Julien Leclercq noutras obras recentes deste realizador é o destemido e silencioso defensor dos seus bens, da sua casa e da sua filha adolescente Sarah (Sofia Lesaffre) portadora de uma deficiência quase total de audição, que há de justificar o seu sacrifício para assegurar a sua autonomia e o seu bem-estar futuro.
A cena inicial do assalto é indicadora da dureza que o filme quer imprimir à história com um grupo de indivíduos afro-franceses, mascarados, tensos e vigilantes que aguardam dentro de um automóvel a oportunidade de iniciarem o assalto, sob uma chuva torrencial a que eles se mostram totalmente indiferentes. A entrada na esquadra está de acordo com o planeado, porém dois dos elementos do grupo envolvem-se num tiroteio fatal, imprevisto e indesejável para os objetivos traçados, embora os outros dois sobreviventes consigam fugir com a droga.
É a partir daqui que os traficantes de cruzam com a vida pacata de Saïd, porque um dos sobreviventes, Medhi (Redouanne Harjane) que planeou um destino diferente para o resultado do assalto, é irmão de Yanis (Samy Seghir) que está em liberdade condicional e foi admitido como trabalhador na serração de Saïd em período acompanhado de recuperação, pede-lhe para esconder lá o produto do roubo, já que o assalto é amplamente divulgado com pormenores nos meios de comunicação.
É a partir daqui que o filme ganha tensão emocional, embora sem ser suficientemente engenhoso e capaz de criar um clima que nos faça pensar o que será que o argumento nos espera nas próximas cenas, considerando que sem muito grau de incerteza o desfecho é medianamente previsível, dando a impressão que nem Leclercq nem os argumentistas; Guez e Matthieu Serveau, se preocuparam muito em escamotear as razões da propensão para a violência de Saïd, bem como, as razões que o deixaram naquela situação de cuidador da filha que tem para ele uma postura de confiança e de agradecimento, sim, mas evidenciando por vezes alguma agressividade que poderia trazer ao filme um conteúdo familiar mais dramático e dinâmico.
Por outro lado, a personalidade dos agressores também se apresenta muito plana. Eles são vilões, agressivos, mas sem muita inteligência que possa potenciar como uma vantagem a sua superioridade numérica no assalto que estão cometendo num local que completamente desconhecem. Todos apresentam expressões carrancudas e armamento suficientemente poderoso mas o seu efeito é reduzido, exceto no consumo desregrado de munições disparadas aleatoriamente pelas suas AK-47.
Constitui portanto um filme que resume a história ao essencial, que aposta em muita adrenalina em tempo real e que se situa uns “furos” acima de outros congéneres, mais impessoais e mais exibicionistas de força bruta, só por ela mesmo.
Em exibição na plataforma Netflix desde 17 de Abril.

Classificação: 5 numa escala de 10

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