Sinopse
‘Marriage Story’, é um filme protagonizado por Charlie
(Adam Driver) e Nicole (Scarlett Johansson) que mostra o processo de divórcio
de um jovem casal, um diretor de teatro e uma atriz, bem sucedidos nas sua
carreiras profissionais, mas incapazes no seu relacionamento pessoal.
Opinião
por Artur Neves
Consta que este filme, somente
acessível através da plataforma Netflix, corresponde em traços gerais ao
desfecho da relação entre o realizador Noah Baumbach e a sua ex-mulher; Jennifer
Jason Leigh em 2013, ao fim de oito anos de casamento. O filme tem seis nomeações
na categoria de Drama, para o 77º Golden
Globe Awards, que terá lugar em 5 de Janeiro 2020 na NBC e que costuma ser
um evento premonitório do que se passará alguns meses mais tarde na cerimónia
dos Óscares de Hollywood.
Numa palavra, pode dizer-se
que este filme é abrasador no aspeto documental da desconstrução de uma relação
que tinha (e teve) tudo para dar bem. Ele conta a história de um divórcio e da
subsequente disputa dos direitos de parentalidade sobre o filho do casal, entre
duas pessoas que se amaram, ainda nutrem sentimentos de pertença um pelo outro,
mas que as questiúnculas espúrias, mal resolvidas do seu relacionamento os arrastou
para uma espiral de desavença que inibe a reversão para o estado inicial do
relacionamento.
O modo de contar a história
é outro aspeto relevante deste filme, por inovador. Os personagens
apresentam-se ao espectador através de monólogos sobre o que cada um pensava do
outro no início da relação, através da leitura de textos que ambos escreveram
nesse tempo e constitui o único elemento que nos descreve os “dias felizes”. Dá-nos
logo à partida a noção do que foi perdido e mais importante ainda, o conteúdo
daquilo que ele sentem que perderam durante o tempo que viveram até ali, de que
sentem falta e assumem como tão irrecuperável que os leva à separação.
A maior parte dos 136
minutos reporta-se ao mecanismo jurídico do divórcio que inicialmente foi
falado entre os dois para ser amigável, mas ao cair no campo litigioso, por conselho
de uma amiga de Nicole que lhe recomenda a contratação de Nora Fanshaw (Laura
Dern), a separação perde a oportunidade para a manutenção da amizade porque os
advogados de ambos apenas estão interessados em ganhar e receber os seus honorários.
Os clientes apenas pretendem resolver a situação com o mínimo de dor e
secretamente alimentam a hipótese de reconciliação, mas o “combate” perde as
regras de compostura e tudo serve para denegrir as imagens um do outro, até aos
seus próprios olhos, quando apresentadas sob o prisma justicialista de
influenciar negativamente um juiz.
Por outro lado, o objetivo
dos superiores interesses da criança apresentam-se como pedra de arremesso para
obter a “vitória” e Henry (Azhy Robertson), não passa de um peão no meio de uma
teia social que ele não controla nem compreende. Ambos os pais declaram que o
seu bem-estar é a coisa mais importante, todavia não se coíbem de gastar com os
advogados o dinheiro depositado com o objetivo de custear as despesas com a universidade,
ganhando em troca migalhas de direitos, que eles até nem tinham reivindicado.
Nesta área, a cena mais
risível de todo o filme, concentra-se na visita da avaliadora parental (o
equivalente a uma assistente social, presumo) com o objetivo de inspecionar o
ambiente habitacional e relacional com Henry de cada um dos pais. A personagem
criada surpreende pela inépcia, inação e impreparação que apresenta na visita. Uma
verdadeira anedota, que não deve ter sido por acaso que foi incluída.
Embora a situação se fundamentei
num caso real e as emoções daí decorrentes sejam universais, os personagens não
são pessoas comuns. Eles habitam uma “bolha” social restrita onde os seus
problemas, reais para eles, podem parecer algo banais para todos os que vivem
vidas menos privilegiadas. Isso resulta dum certo snobismo intelectual de Noha Baumbach
que torna difícil sentir por eles um nível empático mais profundo, apesar de
mostrar grande sensibilidade ao descrever as emoções universais motivadas por
um divórcio. Todavia não tira valor ao imenso drama afetivo que é banalizado em
ninharias pela ação dos advogados. Recomendo vivamente, é um “Kramer vs Kramer”
atual e sem lamechices.
Classificação: 8,5 numa
escala de 10
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