7 de novembro de 2019

Opinião – “As Filhas do Sol” de Eva Husson


Sinopse

Algures no Curdistão, Bahar, uma jovem advogada, visita a família. Num ataque violento dos extremistas, o marido é assassinato e ela é feita prisioneira, juntamente com o filho e milhares de crianças e mulheres. Uns meses depois de conseguir fugir, Bahar torna-se na líder das “Filhas do Sol”, um batalhão de mulheres que tem como objetivo recuperar a cidade onde foi capturada e salvar o filho. Ao seu lado, Mathilde, uma repórter de guerra veterana, segue o dia-a-dia do batalhão durante os 3 dias do ataque. Nesta situação inimaginável, nasce um laço universal de irmandade, a união das “Filhas do Sol”.

Opinião por Artur Neves

Este filme estreou-se no festival de Cannes de 2018 e aparece em Portugal pela mão da distribuidora Midas Filmes, integrado no seu ciclo “Mulheres, Vida, Liberdade” sublinhando que o seu exemplo de coragem mostrado em vários conflitos internacionais, nos mais diferentes contextos, deve ser para sempre lembrado. Neste caso, trata-se de um grupo de guerrilheiras Curdas numa ação de combate ao Daesh, depois de fugirem do cativeiro a que foram sujeitas, após os acontecimentos relatados na sinopse.
Eva Husson é uma realizadora francesa, nascida em 1977, em Le Havre, fortemente influenciada pela participação do avô na Guerra Civil Espanhola, de cujo conhecimento de muitas histórias de coragem feminina contadas por ele, a inspiraram na construção desta história que tem fundamento real no massacre de Sinjar em 2014, no qual o autodenominado Estado Islâmico praticou uma tentativa de genocídio contra o povo Yazidi, tendo raptado mulheres e crianças que foram vendidas como escravas sexuais.
Todavia, este “filme de guerra” é diferente de todos os outros do mesmo género, empenhados em mostrar a glória, a masculinidade e o arrojo de valorosos combatentes por uma causa frequentemente coincidente com o ponto de vista americano, nos conflitos em que anda envolvida a pátria do Tio Sam. Aqui é diferente, pois mostra-se uma aventura de tenacidade e sofrimento no sentido da obtenção da libertação e da sobrevivência de mulheres que foram usadas e abusadas em nome de uma religião que não as respeita.
O filme revela-se escorreito e competente usando uma narrativa de flashbacks para nos informar das razões que levaram aquelas mulheres a insurgir-se e a organizar-se num grupo de resistência ao fanatismo do Daesh. No entanto pouco conhecemos da história e da personalidade das guerreiras, para além da protagonista Bahar (Golshifteh Farahani) e da correspondente de guerra enviada para cobrir a resistência Mathilde (Emmanuelle Bercot) diretamente inspirada em Marie Colvin (até lhe foi colocada uma pala no olho esquerdo) uma repórter de guerra que morreu no desempenho da sua missão, cuja história já foi tratada em cinema, no filme “Uma Guerra Pessoal” de 2018, já comentado neste blogue.
Embora sendo guerreiras e passem à ação armada a história pretende enfatizar sobretudo o seu papel de mães e focar como principal motivo para o combate a vingança dos filhos mortos, a defesa dos filhos ainda no ventre, como é o caso de uma combatente que dá à luz durante uma fuga, ou a recuperação dos seus filhos desaparecidos, como é o caso de Bahar que pretende chegar à escola onde presume que o seu filho esteja sendo formado como combatente do E.I. que ela abomina e combate.
Não existe qualquer informação específica sobre o conflito Curdo, nem quais as diferenças religiosas ou políticas entre os seus ideais e a religião defendida pelo Daesh, nem sobre as origens sociais e políticas que norteiam esta guerra, nada disto é sequer referido o que torna a narrativa novelesca e as personagens remetidas à sua condição de mulher mãe e sofredora, tornando imediata a identificação com todo o público feminino que assista ao filme.
Neste ponto considero que seja uma menorização do seu papel de contribuição para a justiça subjacente que procuram naquele combate sem tréguas. Não há qualquer destaque para os seus papéis de combatente, de estratégia guerreira ou de captação de momentos pela correspondente de guerra. Só amor e preocupação em abstrato com os filhos. É pouco para quem mostra tanta disponibilidade em dar a vida por um bem maior. Todavia, o bom desempenho na credibilidade dos personagens e a filmagem em ambiente natural, justificam a classificação atribuída.

Classificação: 6 numa escala de 10

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