Sinopse
Vitalina Varela, 55 anos, cabo-verdiana, chega a
Portugal três dias depois do funeral do marido. Há mais de 25 anos que Vitalina
esperava o seu bilhete de avião.
Opinião
por Artur Neves
A autenticidade desta
história valeu-lhe a distinção conferida pelo Leopardo de Ouro do Festival de
Cinema de Locarno (Suíça) 2019 que também premiou com o Boccalino d’Oro a atriz
principal, Vitalina Varela tendo assim sido distinguida com o prémio de melhor
atriz do festival.
Vitalina Varela é assim a protagonista
que responde por ela própria num argumento escrito em coautoria com o
realizador Pedro Costa, que ela desempenha com autoridade, competência e uma demonstração
de força humana assinalável considerando que se trata de “defesa em causa
própria”. Tendo sido abandonada pelo marido quando este emigrou para Lisboa á
procura de melhorar a vida, foi ela que aguentou tantos anos a casa da família
que construiu com ele em Figueira das Naus na pobre ilha de Santiago, onde trabalhava
a terra em busca do seu sustento. Quando finalmente em 2013, com 55 anos, ela
consegue o desejado bilhete de avião, aterra em Portugal (num aeroporto
irreconhecível como sendo o de Lisboa) e se dirige ao bairro das Fontainhas,
onde a história decorre, Joaquim Varela já tinha sido enterrado há 3 dias.
O resumo descrito anteriormente
é-nos fornecido ao longo da narrativa (e complementado por leituras adicionais)
em que Vitalina interage com outros imigrantes que se posicionam estáticos na
cena, imóveis, em posições predefinidas, sentados ou em pé, que debitam os diálogos
de modo pausado, no tom mais monocórdico possível sem revelar qualquer emoção,
para lá do abandono e da miséria em que vivem e da autocomiseração pelo seu
estado e pela morte do companheiro que partiu.
O ambiente em que a maioria
dos diálogos se verifica é o interior do casebre em que Joaquim vivia, filmado
com pouca luz e produzindo acentuadas sombras negras que se confundem com a
pele dos personagens, ressaltando somente os olhos que os identificam como
pessoas, naquele negrume sombrio, pobre e que se adivinha fétido. Esta técnica
do chiaroescuro, que se define pelo
contraste entre luz e sombra na representação de um objeto, foi utilizada com êxito
na pintura renascentista do século XV, (Ugo da Carpi, Giovanni Baglione ou
Caravaggio) mas quando transposta para o cinema durante mais de 120 minutos a
enquadrar ambientes opacos e diálogos estáticos, cansam o espectador e
desmotivam a sua atenção do assunto em apreço.
Os ambientes mudam com as
cenas que se sucedem, mas os personagens são os mesmos e a dinâmica do filme é
sempre igual; parada… muito parada… plasmada mesmo, num objeto ou numa rua,
sempre escura e indefinida, impondo uma fotografia que tresanda à escola de
Manoel de Oliveira. Para lá dos diálogos, o som do filme permite intuir um
ambiente externo descontraído com crianças a brincar e homens e mulheres a
falar e a rir, que acentua o contraste com aqueles quadros de dor, solidão e
tragédia intimista que questiona o aqui e o agora daquelas vidas.
Devemos considerar também
que este é um cinema que se pode considerar “artesanal”, filmado em formato 4 x
4, com baixo orçamento, em que os atores e a própria Vitalina não são
profissionais, são pessoas reais que se prestaram à representação, que
representaram um texto que foi filmado por Leonardo Simões, mas por mais boa
vontade que tenhamos, não posso aceitar que cinema seja confundido com teatro
filmado.
A salvar toda esta
pasmaceira temos a protagonista, que apesar das suas expressões paradas
enquanto fala, enquanto longamente olha para o vazio ou enquanto desenvolve
algumas ações que carecem de alguma justificação no contexto, enfim, a autenticidade
da sua presença alivia a “punição escura” que o filme nos impõe, embora que
para mim, não chegue para mais do que mostra a classificação atribuída.
Compreende-se a mensagem, mas não gostei da forma e o cinema Português continua
a ser para mim uma arte estranha.
Classificação: 3 numa escala
de 10
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