Sinopse
Este grandioso filme de Akira Kurosawa adapta a peça
Rei Lear aos temas e ambientes do Japão Medieval, com o episódio de um velho
guerreiro que decide repartir as suas terras pelos três filhos, desencadeando
uma luta de poder entre os irmãos, que termina de forma trágica. Da mestria de
Kurosawa resulta uma extraordinária e excêntrica fusão entre um dos maiores
clássicos literários do ocidente e um estudo minucioso da história do Japão do
século XVI.
Para fazer da peça de Shakespeare um detalhado fresco
de uma época histórica, Kurosawa não só lhe introduz diversos elementos
estilísticos do teatro Nô, como se apropria do seu enredo e o radicaliza
tornando-o muito mais extremo que o original, demostrando assim a verdadeira
universalidade deste clássico.
Ao longo de 10 anos, Kurosawa estudou de forma
minuciosa aquela época – os gestos, o vestuário, os adereços, a arquitetura –
para os transpor para o filme e, antecipando o agravamento da sua perda de
visão, preparou um storyboard
detalhado, a partir do qual a sua equipa soube exatamente como filmar cada cena
de RAN. Esta grandiosa produção, pela forma tão cuidadosa e precisa como foi
pensada e realizada, resulta num inesquecível espetáculo visual, rico na sua
dramaturgia e detalhes, e foi amplamente premiada, nomeadamente com o Óscar
para melhor figurino e vários BAFTA.
Opinião
por Artur Neves
Em boa hora o Cinema Ideal,
pela mão da distribuidora Midas Filmes, vai repor em versão restaurada 4K o
filme RAN de Akira Kurosawa que foi estreado em Portugal em Novembro de 1986 e
nos permitiu apreciar uma obra de arte da “Terra do Sol Nascente”, que é o que literalmente
significam os carateres identificadores do Japão, na língua japonesa.
Tal como a sinopse
largamente descreve, RAN conta a tragédia Inglesa escrita em 1605 por William
Shakespeare, em que o idoso rei da Bretanha enlouquece, depois de ter sido traído
por duas das suas três filhas, após ter legado em vida, o seu reino e de se ter
despojado dos seus direitos e poder, de uma maneira gratuita e insensata.
A obra foi escrita para
teatro e o grande mérito de Kurosawa reside no trabalho de investigação e
adaptação à cultura japonesa de um trabalho inspirado em antigas lendas britânicas,
escrito para o rei Jaime I de Inglaterra, Escócia e Irlanda.
Este facto é importante
porque comprova a semelhança de comportamentos, ambições e desejos comuns à espécie
humana, oriundos de culturas profundamente diferentes e com diferentes códigos
sociais, com diferentes formas de procurarem atingir os seus objetivos em
contextos tão diferentes como o Japão imperial e a Inglaterra monárquica.
A Kurosawa coube então a
arte e o engenho de caracterizar e justificar os atos relatados na peça ao
contexto da época imperial, revestindo-a e valorizando-a com os detalhes de
conduta nas relações sociais da época, bem como, com as sangrentas batalhas
entre os irmãos desavindos, embora seguindo regras rígidas de confrontação em
combate, pautadas por convenções de ética e de honra que nos espantam.
Por incompatibilidade de agenda
e para grande pena minha, não assisti ao visionamento do filme restaurado e
para o recordar, servi-me do meu velhinho DVD, e extrapolei mentalmente o que
deve ser, em termos de espetáculo, o upgrade
para o formato 4K, não só no detalhe da imagem como na coloração do vestuário. Em
qualquer dos casos é um filme imperdível que recomendo com veemência.
Classificação: 8 numa escala
de 10
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