6 de junho de 2019

Opinião – “O Corvo Branco” de Ralph Fiennes


Sinopse

Um jovem de apenas 22 anos, vestido com uma boina preta e um fato escuro justo, viaja num avião de São Petersburgo para Paris. Estamos em 1961 e Rudolf Nureyev, ainda não é uma figura lendária e majestosa: dança na mundialmente famosa companhia Ballet Kirov e viaja pela primeira vez para fora da União Soviética.
A vida parisiense encanta Nureyev e o jovem bailarino está ansioso por consumir toda a cultura, arte e música que a deslumbrante cidade tem para oferecer. Mas os agentes do KGB, que observam cada movimento seu, tornam-se cada vez mais desconfiados do seu comportamento e da amizade com a jovem parisiense Clara Saint. Quando finalmente confrontam Nureyev com uma exigência chocante, ele é obrigado a tomar uma dolorosa decisão que poderá mudar para sempre o curso da sua vida e colocar a sua família e amigos em grande perigo.
Da infância pobre de Nureyev na cidade soviética de Ufa, ao seu despontar como estudante de dança em Leninegrado e à chegada ao epicentro da cultura ocidental na Paris do início da década de 1960, “O Corvo Branco” é a história verídica do percurso incrível de um artista único que transformou para sempre o mundo do ballet.

Opinião por Artur Neves

Rudolf Nureyev nasceu a bordo do comboio transiberiano (que viria a marcá-lo para a vida) a caminho de Ufa em Março de 1938 e transformou a arte do ballet, constituindo-se no mais celebrado bailarino e coreógrafo do século XX. Em 1961, durante uma apresentação em Paris e fascinado com o ambiente cultural que vivencia, desertou para o Ocidente, apesar da vigilância cerrada do KGB e da nomenklatura Soviética que o cercava de perto.
É durante este período da sua vida, o nascimento, a infância, a escola de dança, o virtuosismo revelado em São Petersburgo que Ralph Fiennes realiza este filme e interpreta o professor Alexander Pushkin, escolhido por Nureyev para o ensinar. Desde muito cedo que o seu caráter impulsivo, avesso a regras e em certas situações, grosseiro, que Nureyev se revela, como Fiennes tem alguma contenção em mostrar, com um percurso de desmandos e de infâmias que, apesar de constituírem o sucesso de uma carreira, poderiam manchar o valor de um artista. É talvez por isso que o filme se resume às suas origens.
Embora a história sendo sobre Nureyev (Oleg Ivenko) cabe aqui referir a interpretação de Fiennes que documenta a capacidade e versatilidade deste ator Inglês, ao interpretar o seu personagem, Pushkin, falando fluentemente um Russo.
Aliás como realizador ele também é notável, considerando que o desenvolvimento da história, embora ancorada em Paris 1961, é complementada oportunamente com as referências à infância e à escola em São Petersburgo que nos permitem compreender e interiorizar todas as motivações da personalidade histriónica de Nureyev. Em tudo o mais Fiennes é meticuloso, imprimindo à história um bom ritmo, culminando no processo de deserção para Ocidente, recheado de suspense, em que Nureyev tem de decidir passar por uma de duas portas, para ser livre, ou para voltar sob prisão à URSS.
Todavia, como filme ilustrativo da dança clássica, não apresenta grandes cenas de bailado e quem for à espera disso pode sentir-se frustrado, como ainda, acaba no momento da grande revelação de Rudolf Nureyev ao Ocidente, à França, ao início da sua consagração e da parceria com Margot Fonteyn, para a qual o filme deixa uma dica. Falta-lhe revelar a sua bissexualidade, a sua vivência íntima partilhada por vários anos com companheiros masculinos, o seu mau génio, a sua dependência das drogas e o seu contágio com SIDA que provoca a sua morte em Janeiro de 1993.
Nessa área Ralph Fiennes não se quer meter e por isso fica em 1961, na pele de Alexander Pushkin, sendo interrogado pelo KGB sobre a fuga do seu pupilo e respondendo a tudo com a mesma postura com que ensina os seus alunos. No silêncio do seu espírito talvez pense que um dia alguém vai querer fazer um; “O Corvo Branco 2” para o qual não lhe faltará material.
Um filme muito interessante, recomendo.

Classificação: 7 numa escala de 10

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