1 de fevereiro de 2019

Opinião – “Cafarnaum” de Nadine Labaki


Sinopse

Uma história cheia de significado politico, apresentando atores não profissionais, sobre uma criança libanesa de 12 anos que põe um processo judicial contra os seus pais.
Filme vencedor do Prémio do Júri no Festival de Cinema de Cannes 2018.
Nomeado ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro 2019.

Opinião por Artur Neves

A história contada neste filme é um colossal murro no estomago para toda a comunidade internacional no aspeto político, social e de assistência a povos em crise grave. Do ponto de vista histórico, Cafarnaum é uma cidade bíblica situada na margem norte do mar da Galileia que ligava o Egito à Siria e ao Líbano, próxima das cidades Betsaida e Corozaim que constituíam o “quartel-general” do ministério de Jesus na Galileia. Quando o povo deixou de seguir a fé cristã e a palavra de Jesus, as três cidades foram amaldiçoadas por este, tendo mesmo profetizado a sua destruição que veio a verificar-se.
A história deste filme consiste num período da vida de Zain (Zain Al Rafeea) um rapaz de 12 anos que se revolta contra os pais pela venda da sua irmã Sahar (Haita Izzam) de 11 anos, a Assaad (Nour El Husseini) seu patrão e senhorio e foge de casa sobrevivendo nas ruas até encontrar Rahil (Yordanos Shiferaw) uma refugiada Etíope com um filho de colo, Yonas (Bluwaitife Bankole) de quem passa a tomar conta enquanto Sahar vai trabalhar. Porém, Sahar é presa devido à caducidade da sua permissão de permanência no país e a responsabilidade de Yonas recai sobre Zain, que agora terá de cuidar e proteger o pequeno Yonas, além de si próprio e dos múltiplos problemas com que se vê confrontado.
Nadine Labaki, a realizadora e autora do argumento, nascida em Beirute, Líbano em 1974, utilizou atores não profissionais para interpretar os personagens deste filme, cujas vidas tocam de muito perto a realidade da vida dos atores, solicitando-lhes que agissem espontaneamente com palavras suas, gestos e atitudes que teriam se confrontados com as cenas criadas pelo guião do argumento na resposta mais real possível aos eventos em sequência.
O filme é conseguido pelo seu diretor de fotografia (Chistopher Aoun), que de câmara na mão, pelas ruas, becos e prédios degradados dos arredores de Beirute, seguindo os atores, provoca uma multiplicidade de sentimentos de elevada intensidade emocional, que tanto podem revoltar os mais calmos com a apresentação de uma sociedade sistematicamente desumanizada, como surpreender-nos com fugazes imagens poéticas e ternurentas, naquela Babel social de desordem e pobreza extrema.
O que é particularmente notável é que toda a denúncia da situação é conseguida com atores não profissionais que magistralmente conseguem reproduzir numa história ficcionada, toda a miséria e o caos nas ruas, desde o mercado caótico, aos agentes de tráfico humano, à sobrelotação e promiscuidade da prisão onde Zain acaba por ficar detido, ou durante as cenas no tribunal, em que os pais de Zain reproduzem as suas carências que justificaram as escolhas que fizeram com detalhes que se tornam chocantes ouvir.
“Cafarnaum” é um filme muito duro e difícil em todas as cenas que nos são apresentadas, no entanto, Labaki não quer deixar-nos deprimimos oferecendo-nos uma brecha de esperança em alguns casos individuais. Recomendo vivamente.

Classificação: 8,5 numa escala de 10

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