Sinopse
Um
ex-capelão militar, de luto pela morte do filho que convencera a ingressar no
exército, começa a questionar a sua fé em relação a Deus e à sociedade.
Toller é um
homem atormentado por demónios pessoais e sentimentos de culpa pela morte do
filho e também pelo divórcio que se seguiu. Os seus dilemas pessoais ganham uma
nova dimensão, quando confrontado com as dúvidas de Mary. A jovem está grávida,
mas o marido não quer ter a criança, por considerar que o mundo não tem
qualquer salvação ou futuro.
Opinião
por Artur Neves
O argumento desta história é
inspirado nas cartas do padre Thomas Merton, monge trapista americano e
escritor católico, que durante a sua vida no século XX (1915 – 1968) também escreveu
poemas, foi ativista social e fervoroso defensor do pacifismo e do ecumenismo. Este
filme é portanto uma história de ficção, transpondo para a atualidade as
interrogações e vacilações de fé documentadas pelo seu espólio epistolar onde
se destaca a pergunta chave da sua filosofia: “Será que Deus nos perdoa pelo
que estamos a destruir?...”
É uma abordagem diferente do
ecumenismo religioso tradicional que Paul Schrader, experiente realizador
americano, responsável pelos argumentos de; “Taxi Driver” (1976) e “O Touro
Enraivecido” (1980), nos apresenta neste denso filme de intervenção social com
pendor ecológico, que representa um murro do estomago para todos os americanos
que elegeram Donald Trump e pactuam com a sua política individualista,
protecionista e promotora da continuada carbonização do planeta, quando já
existem provas dos prejuízos causados em toda a existência zoológica ou vegetal
que habita este mundo.
A história centra-se no
pároco Ernst Toller (Ethan Hawke) de uma igreja centenária (First Reformed, que
constitui o nome original do filme) que celebra a festa da jubilação da sua
fundação em conjunto com todas as forças vivas da cidade e de outras
congregações religiosas, como a “Abundante Life”, cujos fiéis frequentam em
maior número e com maior entusiasmo como resultado de um cristianismo
espetáculo, que não corresponde minimamente à prática ecuménica do Reverendo
Toller.
Toller, embora carregando o
sofrimento das suas frustrações, encontra-se disponível e ao serviço de todos os
que solicitem a sua atenção e a sua palavra. Embora com dúvidas, para ele inultrapassáveis,
distribui recomendações para encontrar paz interior, fé e esperança no futuro, que
ele próprio não encontra nos seus momentos de solidão. Todavia a realidade
procura-o, não se esquece deste homem dividido e confronta-o no mais íntimo da
sua essência forçando-o a uma escolha que será decisiva para um futuro que ele
tem dúvidas que exista.
Muito bem interpretado e
realizado, este filme transporta-nos para a América profunda e para os seus
dilemas e convicções atávicas, ao ritmo do quotidiano da cidade. A angústia
existe mas está contida nas gargantas e não se exprime por palavras e o
realizador sabe transmitir-nos essa evolução com sinais e gestos que nos avisam
do “adensar das nuvens” e nos inquietam. O desfecho surpreende e o final fica ao
livre arbítrio da nossa reflexão. Muito bom, recomendo.
Classificação: 8,5 numa
escala de 10
PS: Na opinião anterior
sobre; “Na Praia de Chesil” critiquei o epílogo que o realizador nos apresenta
para a história. Nesta, elogio a sua completa ausência, se existisse seria absolutamente
supérflua.
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