15 de dezembro de 2021

Opinião – “Licorice Pizza” de Paul Thomas Anderson

Sinopse

Licorice Pizza é a história de Alana Kane e Gary Valentine crescendo, correndo e se apaixonando no Vale de San Fernando, 1973. Escrito e dirigido por Paul Thomas Anderson, o filme acompanha a navegação traiçoeira do primeiro amor.

Opinião por Artur Neves

Paul Thomas Anderson é um realizador muito prolixo tendo iniciado a sua carreira em 1988 com uma curta-metragem e evoluindo rapidamente para voos mais altos dos quais destaco em 2007 “Haverá Sangue”, um western durante o início da prospeção do petróleo nos USA e “Vício Intrínseco” de 2014 que iria permitir uma grande interpretação a Joaquin Phoenix na pele de um advogado viciado em drogas mas ainda assim competente no seu trabalho. Porém, por muitas boas obras é composto o seu trabalho até agora.

Desta vez ele oferece-nos uma história de amor nostálgica entre Gary Valentine (Cooper Hoffman) um adolescente de 15 anos por Alana Kane (Alana Haim) de 27 que coordena a execução das fotografias para o livro de curso daquele ano escolar que Gary frequenta. O encontro entre os dois, fulgurantemente assumido por Gary enquanto aguardava na fila a sua vez de ser fotografado, e para Alana foi displicente por não ser propriamente um garoto que ela pretendia encontrar naquela idade. Todavia a história escrita por Paul Thomas Anderson é envolvente, descontraída e conta-nos o despertar do amor juvenil por dois personagens que lutam pela vida, iniciam a conquista do seu lugar na sociedade através do trabalho, da iniciativa individual no ano de 1973, nos Estados Unidos republicano com Nixon em presidente, que para aqueles que viveram esses anos podem estabelecer o paralelo com a sociedade portuguesa na mesma época, em vésperas do 25 de Abril de 1974.

Lá como cá ambos os países estavam em guerra fora das suas fronteiras naturais, mas o desenvolvimento e a postura dos jovens era significativamente diferente quanto à consciência de si e aos projetos de futuro que enchiam os seus sonhos, bem como as atividades escolares e ambiente nas escolas, nomeadamente o pendor artístico onde se aprecia a colaboração de estrelas da época, como Lucille Ball que participou ativamente em festas escolares. A história criada por Paul Thomas Anderson foi inspirada pelo seu jovem amigo Gary Goetzman que desenvolveu um negócio de venda de colchões de água, que Paul recria e atribui ao herói deste filme.

Gary Valentine é um jovem cheio de iniciativa empresarial que sucumbe aos encantos de Alana Kane desde o momento em que a vê na fila das fotografias e insiste com ela para um encontro num restaurante que ele não sabe bem como pagar, porém isso não lhe interessa porque o chamamento pessoal domina-o e ele confidencia a irmão mais novo de 9 anos que encontrou a mulher da sua vida convidando-o simultaneamente para padrinho desde aquele momento. Pelo lado dela, considera-o um garoto apesar de a mistura de convencimento e charme que ele evidencia tenha sido razão suficiente para aceitar, com relutância, o convite. Gary naquela altura é um faz tudo com vários compromissos profissionais e ainda ator de televisão bem sucedido, na sua opinião, atraindo-a para o seu mundo surreal, muito embora ela não procure um relacionamento romântico nem um namorado tão novo. Gary, por seu lado exibe um comportamento mais velho do que o normal para a sua idade, uma capacidade de argumentação e um sorriso sempre presente, apesar de uma tristeza profunda no olhar. É bom citar aqui que o ator Cooper Hoffman (Gary) é filho do falecido Philip Seymour Hoffman, amigo e colaborador frequente de Paul Andersen, que justifica a personalidade de Gary como um vendedor e pequeno vigarista, gerador de ideias criativas mas sempre honesto e verdadeiro nos seus atos como homenagem à carreira do seu pai. É a vida dentro da história que reporta para a história da vida.

Alana não sabe bem porquê mas continua saindo com ele, sente-se sem o admitir, atraída por ele, intrigada com a sua personalidade inventiva, sem medo, destemida e acompanha-o como amiga mais velha. Ela é que tem carta de condução para distribuição dos colchões, a sensatez para argumentar contra as suas ideias mais loucas e não se coíbe de iniciar outros relacionamentos, porém, é sempre para Gary que ela regressa na mesma condição de amiga, de companheira, de ajudante nas suas iniciativas que cedo nos leva a concluir que ambos estão talhados um para o outro e que o filme acabará quando eles assumirem isso.

De caminho Paul Andersen faz-nos uma fotografia dos anos 70 na américa, mostrando-nos o sexismo, o racismo e a homofobia, apresentando-nos a intolerância como uma ocorrência natural dos dias que passam sempre em torno do eixo condutor Gary Alana. Ela porém é um misto de opções inseguras e duvidosas, sofre os condicionamentos da sua condição e o peso das normas da sua religião que tornam as escolhas dela mais restritivas e mais ponderadas do que as dele. Licorice Pizza é um filme de autor que nos mostra um espaço e um tempo segundo a sua visão e a sua nostalgia desses tempos. Eu gostei, vê-se e diverte enquanto dura e se os mais velhos recordam, os mais novos aprendem.

Tem estreia prevista em sala em 30 de Dezembro

Classificação: 7 numa escala de 10

 

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