Sinopse
Inspirado em factos reais.
Durante as férias de verão, Chloé (Stéphane Caillard) e Paul Diallo (Adama
Niane) emprestam sua casa à babá de seu filho. Ao voltar da viagem, a família
Diallo encontrou a porta fechada: as fechaduras haviam sido trocadas e os
ocupantes declararam que estavam em casa. Para Paul, é o começo de uma luta que
fará vacilar o seu casamento, os seus valores sociais e a sua humanidade.
Opinião
por Artur Neves
Este “Furie”, de origem francesa,
foi renomeado para Portugal como o nome; “Ultrage”, para não ser confundido com
outro filme com o mesmo nome original e ano de publicação, mas de origem
Vietnamita e com um argumento radicalmente diferente, causou-nos verdadeira
surpresa pelo seu conteúdo contar uma história desconfortável para os padrões
sociais europeus, sobretudo por anunciar que se baseia em factos reais, embora
omita completamente a origem da sua fonte inspiradora.
Olivier Abbou é um
realizador francês de 47 anos, nascido em Colmar no Alto Reno mas de origens
familiares argelinas, o que penso, justificará em parte a devastadora violência
gratuita incluída no filme sobre um ato que começa por se apresentar como
justicialista mas que o filme deixa descambar para violência puramente
gratuita. Já em 2011 ele realizou “Territoires” um filme que aborda os direitos
humanos através de grande violência.
A história centra-se em
torno do regresso de férias de um casal que terá emprestado a sua casa durante
esse período à família da cuidadora do seu filho em idade escolar e que agora
se recusa a devolver-lhe o domicílio, tendo mudado as fechaduras e assumindo os
contratos de água e eletricidade que ela tinha e ao abrigo da lei francesa essa
tomada de posse é suficiente para os direitos de possessão. Não tenho
suficientes conhecimentos da lei francesa para ajuizar da veracidade deste ato,
mas é por este caminho que a história nos conduz e com outro desenvolvimento do
argumento o filme não perderia qualidade mesmo tratando-se de uma ficção.
Pela leitura da sinopse e do
visionamento do trailer, o filme
prometia uma história sombria, de contornos insidiosos que provocariam o
eventual recurso à violência pontual em face de uma tão rotunda injustiça e
perplexidade, considerando que a cedência teria sido a título gracioso e por
simpatia e generosidade com os serviços anteriormente prestados.
A solução começa por ser a
comunicação à polícia, a contratação de uma advogada e o seguimento dos trâmites
legais para a denúncia daquela ocupação selvagem. Só que Olivier Abbou utiliza
o caso para questionar a masculinidade de Paul Diallo (e a masculinidade em
termos gerais no século XXI) incentivando-o ao ataque pessoal para afirmar os
seus direitos, através de um contacto com Mickey (Paul Hamy) o porteiro do
parque de campismo a que ele recorreu para estacionar a caravana que lhe serviu
de habitação durante as férias e iria continuar a servir, decorrente da
presente situação.
Mickey, um antigo colega de
escola secundária da sua esposa Chloe, é um homem truculento, brigão por
natureza, incluído num grupo de capangas semelhantes e detentores da mesma
índole que imediatamente tentam absorver Paul (professor de História como
profissão) para o seu meio e para as suas atividades muito próximas do ilegal. Paul
deixa-se manipular pelo grupo e assume um papel de criança sofrida, umas vezes
amuada outras zangada, deixando-se embarcar numa ação com pouco de viril e
muito de idiota. Em toda a cena Chloe desempenha um personagem mais responsável
e corajoso a enfrentar os problemas emergentes da situação, não só no presente
como na evocação do passado com Mickey.
Quando o grupo passa ao
ataque começa a descalabro do filme com violência gratuita que se aproxima do insuportável
através da exibição da mais absoluta falta de humanidade à semelhança do que já
tinha sido apresentado em “Territoires”. Parece que o argumento e o caso em
apreço foram filmados para serem usados como pretexto para justificarem um
final violento que exibisse a crueza humana sem pingo de humanidade,
bestialidade pura.
Tudo se passa como se os
valores humanos não existissem, nem polícia, nem justiça, nem estado, tendo
sido deixados sós e abandonados aos elementos da selvajaria humana e que
termina num final que se fica por isso mesmo, sem quaisquer consequências nem
epílogo conciliador com o estatuto social existente.
Estreou no dia 1 de Maio na
Netflix e podia ser melhor com o ambiente opressivo, angustiante e de injustiça
que o argumento cria, mas fica-se somente pela violência.
Classificação: 4 numa escala
de 10
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