Sinopse
Por trás dos muros do Vaticano, o conservador Papa
Bento XVI e o futuro liberal Papa Francisco devem encontrar um terreno comum
para criar um novo caminho para a Igreja Católica.
Opinião
por Artur Neves
Este é terceiro filme da plataforma
Netflix que coleta 6 nomeações na categoria de melhor filme para os Golden
Globe Awards de 2020, realizado por Fernando Meirelles, realizador brasileiro que
já nos deu “Cidade de Deus” em 2002 e “Ensaio sobre a Cegueira” em 2008.
Desta vez apresenta-nos um
drama biográfico baseado na obra teatral de Anthony McCarten; “O Papa” de 2017,
que foi adaptada para cinema pelo próprio autor e que relata um encontro
fictício no Vaticano entre Bento XVI e o então cardeal Mário Bergoglio, futuro
papa Francisco I, em que são abordados os atuais problemas da fé, por dois
homens que se apresentam como pessoas comuns, com dúvidas, fraquezas e
vacilações.
A narrativa que nos é apresentada
sobre a conversa entre os dois homens, pode considerar-se uma visão criativa do
estado atual da igreja católica, onde a fé já não se aceita como o dogma
inspiracional que deu origem a essa crença que deve ser seguida sem
questionamento nem prova, numa altura em que são revelados crimes tão
zelosamente guardados pela oligarquia do poder espiritual, numa desesperada
atitude de manutenção do status quo
que os protege.
Entre outros assuntos, nessa
conversa, o Papa Bento XVI, Cardinal Ratzinger (Anthony Hopkins) revela o seu
desejo de resignação do cargo por "falta de força da mente e do
corpo" devido à idade, ao cardeal Jorge Mario Bergoglio (Jonathan Pryce) que
o incentiva a continuar na função, referindo-lhe ser o primeiro papa em quase
600 anos de vida da igreja que usa esse argumento para deixar de ser o
representante de Pedro na terra.
A igreja de Bento XVI está
pejada de escândalos e ele não sente capacidade para os denunciar ou reverter, as
pressões são demasiadas para as suas débeis forças. Bergoglio assume-se como
crítico da gestão de Bento XVI e para não entrar em choque com ele solicita
licença para aposentação, que não lhe é concedida. Desse diferendo resulta uma
série de discussões e discordâncias filosóficas sobra a natureza do dogmatismo
da fé, do pecado e do perdão e em que direção a igreja deve seguir para manter
a relevância da sua atividade num mundo que parece estar apostado em prescindir
dela.
O êxito do filme assenta na
exímia performance dos dois atores que defendem duas personagens ostensivamente
opostas. Bento XVI é um teólogo conservador, fechado na sua torre de marfim,
avesso às questões mundanas que desviem o seu pensamento da academia da fé e que
falhou ao permitir o encobrimento de alegações de abuso sexual de crianças por
alguns clérigos. Bergoglio, pelo contrário é um cardeal do povo, que o filme
mostra em vários flashbacks quando
jovem e na década de 70 na Argentina, quando foi acusado de mostrar alguma
aceitação pela ditadura militar responsável pela morte de milhares de pessoas. Todavia,
ele vive entre o povo e com o povo e desmultiplica-se por variadas ações de
cariz social e ecuménico que lhe conferem idoneidade e presença.
Em última análise Anthony
Hopkins e Jonathan Pryce posicionam-se como os atores de uma comédia de amigos
incompatíveis e são extraordinários nos seus papéis. Hopkins constrói um Bento
arrependido por nunca se ter aberto ao mundo o que contradiz a sua retórica
conservadora tradicional, da igreja católica e Pryce oferece-nos um personagem
encantador, expressando provocação e inteligência desafiadora das premissas de
Bento. Para o excelente desempenho de ambos vai toda a classificação indicada a
seguir.
Classificação: 9 numa escala
de 10
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