Sinopse
No início dos anos 80, estala entre os chefes da Mafia
siciliana uma guerra bem acesa pelo negócio da heroína. Tommaso Buscetta, um
homem marcado, foge para o Brasil. Em Itália, as contas vão-se ajustando e
Buscetta acompanha à distância o assassinato dos seus filhos e do seu irmão, em
Palermo, sabendo que pode ser o próximo. Preso e extraditado para Itália pela
polícia brasileira, Buscetta toma uma decisão que alterará tudo para a Mafia:
decide encontrar-se com o Juiz Giovanni Falcone e trair o juramento de lealdade
eterna que fizera à Cosa Nostra.
Opinião
por Artur Neves
Poderemos também chamar a
este filme; “O pior de Itália” e Marco Bellocchio, realizador italiano, “fala”
muito bem do que sabe apesar dos seus provectos 80 anos. Militante dos ideais
de esquerda e autor de muitos filmes, entre os quais destaco “Bom dia, Noite”
de 2003, sobre o sequestro em 1978 do político Aldo Moro, visto da perspetiva
de um de seus agressores, militante das Brigadas Vermelhas em conflito com a sua
doutrina, ou “Vencer” de 2009 sobre a primeira mulher de Mussolini, que este mandou
encarcerar num asilo de alienados para viver livremente com a sua amante Ida
Dalser, apresenta-nos agora uma incursão sobre o a Itália tem de pior, como
seja o interior da organização “Cosa Nostra”, os uomini d’onore, cujas proclamações de honra não são mais do que
cortinas de fumo para ocultar os seus verdadeiros desígnios de poder.
Nunca o cinema chegou tão
longe com a magistral interpretação de Pierfrancesco Favino no papel de Tommaso
Buscetta, o mafioso refugiado no Brasil e posteriormente extraditado para Itália
que assumindo o estatuto de arrependido, confessa as ligações e identifica os principais
intervenientes da organização em que ocupou lugar de destaque, sempre negado
durante os 45 dias de interrogatório com o juiz Giovanni Falcone, com quem vem
a contrair laços de respeito, próximos da amizade.
Durante o julgamento podemos
apreciar a sagacidade com que os advogados da organização defendem os seus
clientes perante um juiz impreparado e desconhecedor do material em apreço,
constituindo uma clara denúncia social, através do cinema, da fragilidade do
sistema judiciário italiano e das suas leis facilmente ultrapassáveis pelos
motivos mais frívolos.
Não obstante, a colaboração de
Tommaso
Buscetta com a justiça e as suas revelações sobre a organização motivaram a prisão
de mais de uma centena de responsáveis, tendo decapitado toda a estrutura de
primeiro nível da organização. Todavia o filme não o trata como um herói,
mantendo até um afastamento discreto da pessoa, dando relevo às relações com os
seus pares e mostrando-os em toda a sua desfaçatez humana. Buscetta é o traidor
e como tal é tratado em toda a história que nos mostra desde o mais
insignificante dos servidores ao topo da pirâmide, corporizada por Giulio
Andreotti, numa cena que evidencia o puro ridículo das instituições oficiais da
época.
Decorrente do seu pendor
informativo sobre os pormenores da delação de Buscetta e apesar da sua duração
de 145 minutos, o filme dá-nos poucas pistas sobre os personagens mais
significativos na organização, concentrando-se mais no período pós-máfia e no
motivo que lhe pôs fim. Este facto faz com que os agentes do crime sejam vistos
como uma multidão desavinda que vilipendia Buscetta na sala do tribunal. São retratados
como uma bando de mafiosos barulhentos e desordeiros, banalizando a sua
dimensão e as suas responsabilidades nos crimes de que são acusados, pelo lado “folclórico”
do crime e das armas com que os cometem e menos no lado psicológico e nos
dogmas que subjugam todos os membros da organização.
Deste modo registo uma insuficiência
descritiva, que a ser considerada valorizava ainda mais o poder documental
deste filme que retrata uma parcela significativa da história do século XX,
todavia considero-o importante e recomendo-o vivamente.
Classificação: 8 numa escala
de 10
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