19 de fevereiro de 2016

Opinião – “Muito Amadas” de Nabil Ayouch


Sinopse

Marraquexe nos dias de hoje. Noha, Randa, Soukaina e Hima vivem amores que têm um preço. Elas são prostitutas, objectos de desejo. Vivas e cúmplices, dignas e emancipadas, elas resistem ao quotidiano de violência numa sociedade que tanto as utiliza como as condena.

Opinião por Artur Neves
Esta história reporta-nos o sofrimento e também o estoicismo de mulheres profissionais do sexo que usam o seu corpo na obtenção do sustento vital da sua existência e dos que lhe estão próximos, tais como, pais, filhos e irmãos e dos que estão noutra esfera e também as exploram, tais como, chulos, “protectores” e polícias corruptos, todos envolvidos na mesma amálgama desta vida que nos foi concedida, mas que tem de ser ganha e paga todos os dias com maior ou menor esforço, por meios mais ou menos difíceis (neste âmbito ditos; “fáceis”) de legalidade determinada por leis com pouco a ver com a realidade que os envolve.
São todas jovens, razoavelmente belas, têm sonhos, formam uma comunidade de iguais, comungando uma entreajuda pouco comum noutras esferas, entre mulheres. O argumento gira em torno de Noha que tem a seu cargo; a mãe que a repudia mas recebe o seu dinheiro, uma filha adolescente mal encaminhada que a custo lhe fala, um filho de tenra idade que mal a conhece, decorrente das prolongadas ausências por motivos de “trabalho”… e que trabalho nos bares selectos de Marraquexe visitado por homens árabes para quem a mulher vale quase tanto como lixo.
O realizador, Nabil Ayouch que também assina o argumento, consegue dar-nos um retrato muito verosímil deste ambiente, deste submundo social, dos proxenetas, drogados, homossexuais travestidos que invejam as mulheres que eles não são e ainda, dos homossexuais latentes que sem coragem para assumir a sua condição tornam-se violentos com as mulheres que não conseguem possuir. A linguagem durante todo o filme é crua mas realista e autêntica, o ambiente social é do mais duro que o cinema nos pode oferecer e chamar prostitutas a estas mulheres constitui um eufemismo, pois elas são dignas putas assumidas e é essa a sua bandeira, o seu emblema, o seu escudo para a vida que as destrata sem lhes conceder uma janela de esperança para que possam pelo menos, sonhar.
Todo o ambiente nocturno da cidade está bem tecido, a história tem espessura e nada fica por dizer, guiado pelo comportamento de Noha, mãe e protectora das suas colegas e únicas amigas que sabem poder contar com ela e com o motorista que as transporta ao longo deste extraordinário documento. Os últimos segundos do filme são cruciais para resumir o seu estado de alma sobre a sua condição…
Aviso; caro leitor se você tem convicções bem determinadas, crê que a vida se rege por leis fora deste mundo e acredita num bem maior para além deste, não veja este filme porque ficará chocado desde a primeira imagem. Se por outro lado, possui mente aberta, acredita no livre arbítrio que a todos nos é concedido e procura elementos de reflexão sobre modos de vida e filosofias que não conhece, então este filme é para si, é para nós e como tal recomendo-o vivamente.
Classificação: 8 numa escala de 10

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