9 de janeiro de 2016

Opinião – “Violent Cop” de Takeshi Kitano

 
Sinopse:
O detetive Azuma é um polícia duro e adepto de métodos violentos e pouco éticos para conseguir resultados. Ao investigar homicídios ligados a drogas, Azuma descobre que o seu amigo e colega Iwaki está envolvido no tráfico. Quando Iwaki morre e a irmã de Azuma é raptada, ele decide quebrar todas as regras e fazer justiça.
 
Opinião por Marta Nogueira
A vida de Takeshi Kitano dava um filme por si só. No Japão ele é já um mito, não há ninguém que não o conheça e que não o adore. Mas não por causa dos seus filmes violentos, poéticos e profundos. Imaginem que o Herman José cómico era também um realizador auteur e terão o vosso Takeshi Kitano.
Kitano é um homem dos sete instrumentos. É o maior cómico japonês desde há uns bons 20 anos, tem inúmeros programas de TV que ele próprio cria, apresenta e protagoniza. É também pintor. A realização aconteceu por acaso. Quando o realizador de "Violent Cop" ficou doente e não pôde continuar a rodagem, Takeshi ofereceu-se para prosseguir a tarefa. Nascia aquele que é provavelmente o mais rápido realizador de cinema do mundo - as suas equipas já estão habituadas a filmar à velocidade da luz - ele é conhecido por raramente exigir aos seus actores mais do que um take, porque acredita que a primeira interpretação é sempre a melhor.
Neste filme, um dos mais aclamados da sua carreira, Kitano consegue transformar a violência numa espécie de poesia citadina, errática, brutal e ao mesmo tempo filosófica, como se ela fosse dolorosamente esculpida a granito e tijolo na vida do dia-a-dia dos seus personagens e das ruas por onde estes deambulam.
E este é um filme onde se anda muito. Azuma, o polícia violento interpretado pelo próprio Takeshi, anda muito. Ele percorre o filme constantemente a andar de um lado para o outro. Sem descanso. Intensamente. Freneticamente. Cansando-nos só de o ver. E esse caminhar ininterrupto é um sinal do seu interior exausto. Azuma está cansado. Cansado de tudo. Cansado da vida. Cansado da doença da irmã. Cansado dos criminosos que o rodeiam e que ele tem de enfrentar com métodos pouco éticos. Cansado da violência contra que tem de lutar com mais violência ainda. Cansado do mundo. Cansado de si próprio e daquilo em que se transformou.
Quando no decorrer de um interrogatório a um gatuno, Azuma desfere 24 estalos na cara do outro (contei-os, um a um), sem descanso, sentimos que fomos nós que desferimos os estalos ou que os levámos e percebemos que Azuma engrenou irremediavelmente num frémito mecânico de raiva imparável, de onde já nem ele consegue libertar-se por sua vontade própria.
Apenas o mar o acalma, como em todos os filmes de Kitano. O mar, que aparece sempre como o repouso, como o intervalo, como o suspiro entre batalhas, como o respirar calmo e suave no meio de toda a violência da vida.

Sem comentários: