Sinopse:
Um maestro reformado passa férias nos Alpes com a sua
filha e o seu melhor amigo que é realizador de cinema, quando recebe um convite
da Rainha de Inglaterra para dirigir a orquestra no aniversário do príncipe
Filipe.
Opinião por Marta Nogueira
Foi Oscar Wilde quem afirmou que a juventude é o bem mais
precioso que possuímos. Mais do que a beleza, tão apreciada pelo autor
irlandês, a juventude é o maior tesouro do ser humano. Talvez porque a
juventude é sinónimo de dois verbos fundamentais – acreditar e desejar.
É precisamente disso que trata o segundo filme de língua
inglesa do realizador italiano Paolo Sorrentino, galardoado em 2014 com o oscar
de melhor filme estrangeiro por “A Grande Beleza”. Arrasta, por enquanto,
algumas boas expectativas, pois chegou a ser nomeado para a Palma de Ouro do
Festival de Cannes deste ano, embora não tenha vencido.
Este belíssimo filme de Sorrentino segue o estilo técnico
apresentado em “A Grande Beleza”, mas consegue ser mais interessante do ponto
de vista do enredo, e irá certamente agradar a um público mais vasto, sem
comprometer as suas qualidades. Sorrentino equilibra de uma forma soberba a
poesia e a respiração das imagens com uma história apelativa, ternurenta,
trágica e com piscadelas de olho humorísticas, sem nunca resvalar para o
excessivo melodrama ou a profundidade demasiado críptica de algum cinema
europeu de autor. Para isso, também contribuiu a escolha dos actores principais
– os veteranos Michael Caine e Harvey Keitel, ambos em estado de graça, e os
mais jovens mas competentíssimos Rachel Weisz e Paul Dano. Não esquecendo uma
aparição fugaz mas tremenda da magnífica Jane Fonda.
Enquanto repousam num hotel de luxo alpino, os dois
artistas amigos discorrem sobre o passado, o presente e o futuro, à medida que
se vão cruzando com outros hóspedes a atravessarem diversas crises existenciais
– um actor em pleno estudo de personagem, uma velha glória do futebol
deliciosamente parecido com o Diego Maradona obeso de há uns tempos atrás, a
filha e assistente do compositor e maestro a experimentar uma irreversível
crise conjugal, e umas quantas outras personagens passageiras que incluem uma
massagista introvertida, uma prostituta de luxo, uma Miss Universo e um casal
idoso em permanente silêncio.
Nesta “montanha mágica” de Sorrentino, onde o tempo parece
também deter-se à semelhança da de Mann (uma parte do filme foi de facto
filmada no hotel que serviu de inspiração ao escritor para o seu romance),
aquilo que parece, quase nunca é. Num ritmo sincopado e suave, à semellhança
daquele que o velho maestro vai procurando em tudo o que observa, Sorrentino
oferece-nos uma melodia nostálgica sobre a juventude, a velhice, a doença, a
morte, o desejo e a vida. Cada personagem deambula por um imaginário real
próprio que contribui como um instrumento para o conjunto desta orquestra, e
ninguém desafina. Nem o realizador, que consegue compor uma harmonia
subtilmente bela, límpida e equilibrada, composta por todos estes universos
distintos, nem os actores que a tocam virtuosamente mas sem exagerados alaridos
– excepção gentilmente concedida à grande Fonda que tem um momento histriónico
sublime.
Jimmy, o actor em pesquisa para um papel desconcertante,
conclui que após observar os hóspedes do hotel, tem de escolher entre
representar o horror ou o desejo e decide escolher o desejo. Ele quer contar o
desejo, tão puro, tão impossível, tão imoral que não importa, porque é isso que
nos faz estar vivos.
Todos os personagens desejam ainda a vida, apesar de
velhos, cansados, desiludidos, ou perdidos. Para uns é patético, como o obeso
Maradona tentando malabarismos impossíveis com bolas de ténis, para outros é
teimoso, como o velho cineasta que guarda o mesmo entusiasmo da juventude, para
outros ainda está latente sob uma capa de aparente apatia, como o velho
compositor. Mas em todos ele continua presente, até ao último sopro de vida.
Creio ser essa a mensagem principal de Sorrentino – que a juventude permanece
em nós, mesmo quando as rugas e as maleitas se apoderam dos nossos corpos,
enquanto existir vontade de continuar a tocar as sinfonias das nossas humildes
vidas.
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