24 de novembro de 2015

Opinião - “Youth” de Paolo Sorrentino


 
Sinopse:
Um maestro reformado passa férias nos Alpes com a sua filha e o seu melhor amigo que é realizador de cinema, quando recebe um convite da Rainha de Inglaterra para dirigir a orquestra no aniversário do príncipe Filipe.
 
Opinião por Marta Nogueira
Foi Oscar Wilde quem afirmou que a juventude é o bem mais precioso que possuímos. Mais do que a beleza, tão apreciada pelo autor irlandês, a juventude é o maior tesouro do ser humano. Talvez porque a juventude é sinónimo de dois verbos fundamentais – acreditar e desejar.
É precisamente disso que trata o segundo filme de língua inglesa do realizador italiano Paolo Sorrentino, galardoado em 2014 com o oscar de melhor filme estrangeiro por “A Grande Beleza”. Arrasta, por enquanto, algumas boas expectativas, pois chegou a ser nomeado para a Palma de Ouro do Festival de Cannes deste ano, embora não tenha vencido.
Este belíssimo filme de Sorrentino segue o estilo técnico apresentado em “A Grande Beleza”, mas consegue ser mais interessante do ponto de vista do enredo, e irá certamente agradar a um público mais vasto, sem comprometer as suas qualidades. Sorrentino equilibra de uma forma soberba a poesia e a respiração das imagens com uma história apelativa, ternurenta, trágica e com piscadelas de olho humorísticas, sem nunca resvalar para o excessivo melodrama ou a profundidade demasiado críptica de algum cinema europeu de autor. Para isso, também contribuiu a escolha dos actores principais – os veteranos Michael Caine e Harvey Keitel, ambos em estado de graça, e os mais jovens mas competentíssimos Rachel Weisz e Paul Dano. Não esquecendo uma aparição fugaz mas tremenda da magnífica Jane Fonda.
Enquanto repousam num hotel de luxo alpino, os dois artistas amigos discorrem sobre o passado, o presente e o futuro, à medida que se vão cruzando com outros hóspedes a atravessarem diversas crises existenciais – um actor em pleno estudo de personagem, uma velha glória do futebol deliciosamente parecido com o Diego Maradona obeso de há uns tempos atrás, a filha e assistente do compositor e maestro a experimentar uma irreversível crise conjugal, e umas quantas outras personagens passageiras que incluem uma massagista introvertida, uma prostituta de luxo, uma Miss Universo e um casal idoso em permanente silêncio.
Nesta “montanha mágica” de Sorrentino, onde o tempo parece também deter-se à semelhança da de Mann (uma parte do filme foi de facto filmada no hotel que serviu de inspiração ao escritor para o seu romance), aquilo que parece, quase nunca é. Num ritmo sincopado e suave, à semellhança daquele que o velho maestro vai procurando em tudo o que observa, Sorrentino oferece-nos uma melodia nostálgica sobre a juventude, a velhice, a doença, a morte, o desejo e a vida. Cada personagem deambula por um imaginário real próprio que contribui como um instrumento para o conjunto desta orquestra, e ninguém desafina. Nem o realizador, que consegue compor uma harmonia subtilmente bela, límpida e equilibrada, composta por todos estes universos distintos, nem os actores que a tocam virtuosamente mas sem exagerados alaridos – excepção gentilmente concedida à grande Fonda que tem um momento histriónico sublime.
Jimmy, o actor em pesquisa para um papel desconcertante, conclui que após observar os hóspedes do hotel, tem de escolher entre representar o horror ou o desejo e decide escolher o desejo. Ele quer contar o desejo, tão puro, tão impossível, tão imoral que não importa, porque é isso que nos faz estar vivos.
Todos os personagens desejam ainda a vida, apesar de velhos, cansados, desiludidos, ou perdidos. Para uns é patético, como o obeso Maradona tentando malabarismos impossíveis com bolas de ténis, para outros é teimoso, como o velho cineasta que guarda o mesmo entusiasmo da juventude, para outros ainda está latente sob uma capa de aparente apatia, como o velho compositor. Mas em todos ele continua presente, até ao último sopro de vida. Creio ser essa a mensagem principal de Sorrentino – que a juventude permanece em nós, mesmo quando as rugas e as maleitas se apoderam dos nossos corpos, enquanto existir vontade de continuar a tocar as sinfonias das nossas humildes vidas.

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