27 de novembro de 2015

Opinião - "A Modista" de Jocelyn Moorehouse


Sinopse
Baseado no romance best-seller de Rosalie Ham, “A Modista” é a história da femme fatale Tolly Dunnage ao retornar à sua pequena cidade natal para corrigir os erros do passado. Um drama elegante, com tons divertidos sobre amor, vingança e alta-costura. Escrito por Sue Maslin

Opinião por: Artur Neves
A acção passa-se em 1951, numa aldeia rural Australiana esquecida por Deus, onde chega a grande diva da alta-costura à procura de vingança e de redenção dos males do passado, que iremos descobrir, nem são tão graves assim e decorrem da maledicência, ignorância, e tacanhez daquela população e do seu isolamento.
São pessoas simples, habitando um microcosmo de vícios denunciados e virtudes escondidas, é um lugar de convenções dogmáticas, para sempre admitidas sem discussão nem debate, que “a modista” vem perturbar regressada da grande cidade, onde cresceu, se fez mulher e sofreu.
O ambiente da vida no povoado é denso, sórdido, fértil em verdades falsas e segredos mantidos e está bem caracterizado pelos personagens estereotipados que lá habitam. Estão lá todos; a menina casadoira com a sua mãe publicitária, o mancebo com a sua mãe dominadora, a autoridade representada por um personagem transformista que evidencia uma homossexualidade latente, o adúltero profissional, com particulares tiques de linguagem e que aproveita e mantém a fraqueza mental e física da mulher, para a violar durante o sono numa cena que ilustra o grotesco das relações humanas, o farmacêutico convencido e opinioso sobre todas as maleitas dos fregueses, evidenciando displicência no seu juízo. As vizinhas, ora inimigas ora cúmplices, a professora autoritária, todos formando o universo de ligações onde se tece a estória que nos vai sendo apresentada.
É também um filme de pormenores que acentuam o perfil particular de cada um dos habitantes. Repare-se nos rostos quase sempre fechados, nos dentes deformados dos personagens, característicos de uma época em que a saúde oral não era uma preocupação, os trajes, rurais no início e exuberantes depois de concebidos pela mão da figura principal. O guarda-roupa é aliás um dos elementos fundamentais do filme na sua função transformadora do aspecto e da personalidade das personagens, que só externamente se altera mostrando que em certas situações é mesmo; “o hábito que faz o monge”, contrariando o sentido tradicional do adágio.
O argumento está bem concebido, revelando ao espectador o que ele tem de saber a tempo certo, o ambiente social rústico da aldeia que suporta uma generalizada moral vitoriana, está bem concebido e é consistente. Todos são contra ou a favor de alguém durante o tempo em que esse sentido for maioritário, mas tudo se altera sem razão definida como numa multidão entregue a si própria. O filme apresenta ainda momentos risíveis que, na minha opinião, são amargos e reflexivos da pobreza de espírito que campeia na aldeia.
Um bom filme, bem feito, sem deixar pontas soltas e com um final surpreendente. A ver.

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