7 de junho de 2015

Opinião - O Véu Pintado - William Somerset Maugham


Título: O Véu Pintado
Autor: William Somerset Maugham
Editora: Asa

Sinopse:
Kitty sente-se prisioneira de um casamento infeliz e de um estilo de vida que está longe de ser aquele que sonhou para si. Sem que tivesse obtido a notoriedade social que desejava e afastada do seu país e da família devido à profissão do marido, bacteriologista destacado para Hong Kong, a jovem acaba por encontrar algum consolo numa relação extraconjugal. Mas a traição acaba por ser descoberta pelo marido, que leva a cabo uma estranha e terrível vingança…
Através do despertar espiritual da adorável e fútil Kitty, Somerset Maugham pinta um retrato vívido da presença britânica na China e apresenta-nos uma galeria de personagens inesquecíveis.

Opinião por Célia Marteniano:
Somerset Maugham é daqueles escritores de que sempre achei que ia gostar, mesmo antes de ter lido o que quer que fosse de sua autoria. Não consigo explicar isto de forma lógica, mas este feeling fez com que tivesse comprado três livros dele antes de ter experimentado qualquer um deles. Há cerca de dois anos, decidi ler O Fio da Navalha e confesso que fiquei algo desiludida. Achei-o um livro muito interessante mas deixou-me indiferente; 2012 foi o meu annus horribilis de leituras e, por isso, atribuí o facto ao meu estado de espírito e pensei para comigo que havia de o reler numa altura melhor.
O Véu Pintado apresenta-se ao leitor na perspetiva de Kitty Fane, uma inglesa recém-casada que vive com o marido em Hong Kong nos anos 1920. Walter e Kitty são um casal improvável: Kitty é uma mulher bonita mas fútil, enquanto Walter é um homem introvertido e inteligente; o seu amor por Kitty levou-o a pedi-la em casamento e Kitty aceitou porque, pasme-se, não queria casar depois da irmã mais nova, que estava na altura de casamento marcado. Esta relação ficou, assim, ferida de morte desde o seu início e, por isso, Kitty não demorou a apaixonar-se por outro homem e a cometer adultério. A ocasião em que a traição de Kitty é descoberta é a cena que inicia este livro e que dá o mote para conhecermos a história destas duas pessoas tão diferentes que se encontram juntas por um acaso do destino.
A descoberta do adultério despoleta vários acontecimentos, que incluem uma viagem do casal a uma localidade remota na China que se encontra assolada pela cólera e onde Walter deseja colocar os seus conhecimentos de medicina ao serviço da população. Esta viagem tem um impacto profundo na vida dos dois e mostra como colocar as situações em perspetiva é, muitas vezes, a melhor forma de relativizar os problemas que nos assolam.
Apesar de Kitty Fane ser uma personagem fútil, egocêntrica e muitas vezes desprezível pela forma como pensa e se comporta, dei por mim com muita dificuldade em não gostar dela. O mérito todo vai para o autor, que consegue pintar um retrato perfeito desta personagem, com todos os tons e sub-tons necessários à sua compreensão. Kitty Fane é perfeita na sua imperfeição, é uma personagem que falha, que nós sabemos que falha e que vai voltar a falhar, mas com a qual não conseguimos deixar de sentir uma certa simpatia porque, no fundo, é uma imagem genuína das nossas próprias imperfeições.
Já disse que fiquei deliciada com a prosa de W. Somerset Maugham? Na sua aparente simplicidade, a escrita oferece-nos uma caracterização sublime da sua personagem principal e é notável também a forma como o leitor percebe quem é Walter Fane apesar de só o conhecermos através dos olhos da sua mulher. Quanto ao enredo, não gostei do final mas sinto que não podia ter sido de outra forma. Há livros em que o autor nos irrita com as suas escolhas, em que achamos que as coisas deveriam ter acontecido de outro modo… aqui não. Desejei sinceramente que este livro não fosse tão triste, mas sei que se não fosse exatamente o que é não me teria marcado tanto. Sem dúvida, um dos melhores livros que li nos últimos tempos.

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