30 de junho de 2016

Opinião – “Ou Todos ou Nenhum” de Kheiron


Sinopse
De uma pequena vila no Sul do Irão até às tumultuosas ruas de Paris, o comediante Kheiron conta-nos a história dos seus pais, Hibat e Fereshteh, um casal de eternos optimistas.
Seguimos a sua viagem e o crescimento da sua família através de crises políticas, revoluções, prisão, assassinatos e suicídios.
Apesar disso; “Ou Todos ou Nenhum” é, no seu âmago, uma comédia sobre os valores universais como o amor familiar, o valor da vida e acima de tudo, o ideal de vivermos juntos.

Filme nomeado para o prémio; Melhor Primeiro Filme, CÉSAR 2016

Opinião por Artur Neves
Os heróis desta história são gente comum que descontentes pelo regime autocrático do Xá do Irão (Reza Pahlevi) organizam a contestação contra o seu poder, são perseguidos e presos, mas conseguem os seus intentos através da vitória da revolução Iraniana, que em 1979 depõe o Xá substituindo um regime monárquico autocrático mas de índole pró-ocidental por uma república islâmica teocrática liderada pelo aiatolá Khomeini (Ruhollah Khomeini) que governou o Irão com leis conservadoras baseadas no Islão e com o controlo político nas mãos do clero afastando-se das relações com o Ocidente.
É pois neste clima que Kheiron nos conta a história da sua família de uma forma ligeira, imbuída de graça e comicidade que se evidencia nos pormenores do relacionamento entre as pessoas, nos seus pensamentos e desejos inocentes, conseguindo que até algumas cenas da prisão e da tortura sejam mostradas divertidamente através da estupidez em que se baseiam as decisões e os actos dos seus carcereiros.
Este é um filme em que se fala a brincar de coisas muito sérias, como sejam a liberdade, a democracia e o livre arbítrio individual, mas com uma acutilância e uma precisão cirúrgica dos valores envolvidos que nos mostra a face patética de todos os tiranos e nos faz rir com vontade, embora com o sentimento da dor e do sofrimento infligido àquele povo em nome de valores inexistentes, porque se existissem não poderiam, nem deveriam permitir tamanho despotismo.
A consequência é a fuga, o abandono do país de forma clandestina, a sua passagem pela Turquia e a chegada e estabelecimento da vida em Paris. Nesta, que pode considerar-se a 2ª parte da história, a crítica social continua como veiculo da apresentação do desajustamento dos refugiados aos valores ocidentais, sempre com uma piada sugestiva que nos diverte e faz sorrir.
Todos os personagens envolvidos estão bem caracterizados, o sogro de Hibat (Kheiron) é apresentado como um Iraniano falsamente tradicionalista, a filha (mulher de Hibat) é tudo menos submissa ao poder marital, tal como a sua mãe aliás, os seus amigos apresentam em todas as cenas características únicas e muito próprias de uma certa rebeldia bacoca e todo o ambiente do filme se desenrola segundo uma estrutura coerente de denuncia, de mágoa assimilada que se permite glosar com o seu próprio infortúnio. Todavia, não é um filme amargo. Recomendo, o tempo gasto em desfrutar este filme é descontado ao tempo das nossas preocupações.
Classificação: 8,5 numa escala de 10

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