16 de março de 2016

Opinião – “À Sombra das Mulheres” de Philippe Garrel


Sinopse

Pierre e Manon são um casal que luta para superar os seus escassos recursos financeiros. Fazem documentários sem apoios e sobrevivem de biscates. Um dia, Pierre conhece uma jovem estagiária, Elisabeth, e ela torna-se sua amante. No entanto, Pierre não quer deixar Manon – quer manter as duas.

Opinião por Artur Neves
Philippe Garrel já nos habituou por diversas vezes a mergulhar na alma dos amantes para tentar compreender as suas motivações e os seus objectivos na demanda por novas emoções, ou tão somente para uma descoberta de si próprios. Quantas vezes procuramos nos outros o que só alcançamos em nós próprios se decidirmos e conseguirmos ser honestos. Sobre esta temática destaco; “Closer” (Perto Demais) de 2004, como o mais significativo exemplo da profundidade deste assunto.
Desta vez Philippe Garrel apresenta-nos um tetraedro amoroso em que um casal, Pierre e Manon, (Stanislas Merhar e Clotilde Courau, respectivamente) colaboram profissionalmente desenvolvendo actividades ligadas à realização do documentário histórico e sobrevivem em precárias condições monetárias através de trabalhos sem financiamento externo ou de pouca relevância no mercado da arte. Neste contexto somente o amor entre eles os mantém unidos, até ao dia em que esse sentimento carece de refrescamento, de diferença, para continuar a resistir à monotonia dos dias.
Essa busca corporiza-se em ambos pelo encontro de outro parceiro como veiculo para o reencontro consigo próprios individualmente. Eles não deixaram de se amar, eles não deixaram de estar ligados, não se separaram espiritualmente mas os seus corpos precisam de outras emoções para confirmar que estão vivos. As complicações daqui emergentes são múltiplas e Philippe Garrel sabe enuncia-las, embora a nenhuma dê resposta porque isso depende de cada um.
Apresenta-nos os eternos dilemas humanos do conflito entre os prazeres do corpo e os sentimentos associados à cultura ocidental e aos seus dogmas, o conflito do homem deixado que perde o seu “estatuto” na velha premissa de entrega total do amor feminino, o lugar do outro que quer deixar de o ser, que se sente incapaz de suportar essa condição pautada pelo amor físico e no final, o sentimento de perda mútua que ambos sentem pela experiência falhada que ambos experimentaram sem que isso tivesse qualquer significado na mudança que procuravam.
P. Garrel sabe mostrar-nos tudo isto, numa película a preto e branco que vai acentuar o carácter depressivo da acção e a solidão de todos os intervenientes que apenas procuram esse inefável e transitório objectivo a que chamamos felicidade, quando tudo desaba à sua volta, porque já desabou dentro deles, sem que eles se apercebessem.
Mas Garrel traz-nos também a redenção, quando nos mostra que as coisas nem sempre são o que parecem, tanto na vida como na história, e que mesmo os piores eventos podem trazer-nos os maiores triunfos sempre que decidimos assumir a vida com os seus valores, pelo lado honesto. Um filme interessante que somente peca pela contemplação em vez da acção. Neste sentido “Perto Demais” está melhor.
Classificação: 7 numa escala de 10

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