31 de maio de 2015

Opinião - A Rapariga-Corvo - Erik Axl Sund


Título: A Rapariga-Corvo
Autor: Erik Axl Sund
Editora: Bertrand

Sinopse:
A psicoterapeuta Sofia Zetterlund está a tratar dois pacientes fascinantes: Samuel Bai, um menino-soldado da Serra Leoa, e Victoria Bergman, uma mulher que tenta lidar com uma mágoa profunda da infância. Ambos sofrem de transtorno dissociativo de personalidade.
A agente Jeanette Kihlberg, por seu lado, investiga uma série de macabros homicídios de meninos em Estocolmo. O caso está a abalar a investigadora, mas não tem tido grande destaque devido à dificuldade em identificar os meninos, aparentemente de origem estrangeira.
Tanto Jeanette como Sofia são confrontadas com a mesma pergunta: quanto sofrimento pode um ser humano suportar antes de se tornar ele próprio um monstro? À medida que as duas mulheres se vão aproximando cada vez mais uma da outra, intensificam-se os segredos, as ameaças e os horrores à sua volta.

Opinião por Filipa Monteiro:
"Podemos ser maus se não nos sentirmos culpados?
Ou será que o sentimento de culpa é condição para a maldade?"
Adoro policiais. Em tempos, era só o género que lia, presentemente, leio muito mais coisas, no entanto, se tivesse que escolher um género favorito, a escolha recairia sempre sobre os policiais. Já li muitos e de alguma maneira continuam sempre a surpreender-me, quer pela sua narrativa, quer pelos personagens escolhidos para serem a face negra do romance, quer pelos crimes cometidos, quer pela pressão psicológica... e este, este livro... apresenta todas as excelentes características de um thriller, mas, surpreendeu-me pela sua pressão psicológica... pressão essa que destruiu as personagens que nele moram e, também, "destrói" o leitor...
"Ouço e esqueço, vejo e lembro-me, faço e compreendo".
Tinha lido excelentes opiniões e comentários ao livro e já me tinham preparado para o facto de ser violento e assustador, mas, nada melhor do que "ler para crer". "A rapariga-corvo" apresenta-nos personagens fortes femininas. Sofia Zetterlund, é uma psicoterapeuta e lida com casos extremamente difíceis, pessoas traumatizadas com eventos passados na sua vida e ela, através do tempo que dispõe em cada consulta, tenta de alguma maneira ouvi-los e aliviá-los do peso que carregam. Está, neste momento a tratar principalmente transtornos de personalidade, ou seja, pessoas que, têm memórias que as magoam tanto que elas escondem-se numa outra "persona" para tentar lidar com isso mesmo. Jeanette Kihlberg é uma polícia que tenta deslindar todos os casos de meninos mortos que de repente assolam Estocolmo. Ela, em conjunto com o seu parceiro tentam chegar a pessoas que nem o procurador quer que sejam investigadas... Ambas as personagens têm algo em comum. Não estão satisfeitas com a vida que levam. Por essa razão, vão encontrar-se e ajudar-se mutuamente nos dias correntes... Victoria Bergman, uma das pacientes de Sofia. Dos casos mais difíceis, se não o mais difícil, que Sofia alguma vez enfrentou. Uma mulher perturbada mas que procura ajuda e não desiste. Abomina a fraqueza. A estória alterna entre o presente e o passado, para assim, o leitor conseguir compreender certos factos que vêm a lume no presente. Os capítulos são curtos e ricos em tensão.
"Quanto sofrimento pode um ser humano suportar antes de se tornar ele próprio um monstro?"
Percorremos os recantos mais sombrios da pedofilia e do tráfico de crianças.
Violência entre crianças-soldado, que são treinadas para... matar.
Maldade entre crianças para criar diversão. Humilhação. Integração.
Lutas entre crianças e anestésicos comuns...
Pressão psicológica.
Sedução.
Manipulação.
Ao longo de todo o livro senti o quão difícil é ler um livro tão poderoso quanto este. E escrever, creio que também. É soberbo na sua maldade. Um livro que NÃO é um lugar-comum. Apercebemos-nos da luta interior de quem sofreu muito e de como escolhem lidar com isso. A construção das personagens está tão bem feita que olhamos, mas não vemos, a perturbação inerente.
Há uma reviravolta que nos apanha desprevenidos. Temos algumas indicações do que está prestes a acontecer, mas, quando acontece, é tão inesperado que ficamos sem saber reagir com o livro na mão... e, pensamos, como foi que erik axl sund me apanhou...
"As asas da mosca estão irremediavelmente presas na pastilha elástica. Não vale a pena tentares voar, pensa a Rapariga-Corvo. Nunca mais voarás. Amanhã o sol brilhará, mas não para ti".

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