17 de março de 2015

Espetáculo "Era para ser com o Sassetti" - Crítica


“Era para ser com o Sassetti”, mas, pelos motivos conhecidos de todos, não foi. Este é o último espectáculo de Rui Sinel de Cordes, comediante que já nos habituou a um corrosivo registo de humor negro hard-core, capaz de nos destruir por completo a nossa zona de conforto e redefinir os limites do mau gosto. Aliás, ao longo de todo o espectáculo ele mostra-nos como estamos enganados e que, na realidade, não existem limites para o mau gosto – consegue achincalhar tudo e todos, sem qualquer tipo de tentativa de dourar a pílula. (Sim, os mais puristas devem manter uma distância de segurança deste espectáculo.)

Em termos da linguagem usada, esta oscila perigosamente entre o brejeiro e o obsceno, com um teor sexual de tal ordem que, quando comparamos esta peça com o famoso filme das 50 Sombras de Grey, o filme mais parece uma produção da Disney. 

O espectáculo começa com Rui Sinel de Cordes a explicar a razão do nome do espectáculo. Não havendo Sassetti, apresenta o seu substituto, Paulo Almeida, que entra em palco a perseguir uma jovem em camisa de dormir que corre pela plateia a gritar por socorro. Está dado o mote para uma sucessão de piadas de humor negro, escritos de forma irrepreensível, divididos por diversos momentos de pseudo-musicalidade (decerto que com Sassetti teriam outra qualidade, mas duvido que alinhasse), de crítica da actualidade, com a leitura de notícias do Correio da Manhã (que ele revela ser a sua maior fonte de inspiração), até mesmo uma tentativa (felizmente) falhada de enveredar pela comédia infantil. Desta diversidade de momentos e da interacção entre os dois actores, consegue-se um espectáculo que flui naturalmente e que não chega a saturar o espectador. 

A interacção com o público foi constante, mostrando a larga experiência que o Rui tem de palco. A sala cheia do Teatro Sá da Bandeira, uma constante nos espectáculos de Rui Sinel de Cordes, pelos menos nas salas onde lhe é permitido actuar, mostra que já tem um público fiel. 

Como pormenores menos favoráveis, aponto alguns problemas de dicção, que impedem a percepção de algumas das piadas e o facto das imagens projectadas não se conseguirem ver totalmente do sítio onde estava – mas são meros pormenores que não nos impedem de ser devidamente achincalhados, como seria de esperar deste humorista, o único que já foi processado pela Entidade Reguladora da Comunicação Social por causa de uma piada sobre a Eunice Muñoz, piada essa repetida no espectáculo, como que a provar a validade do referido processo, que é apenas um processo entre alguns outros, sem contar com as ameaças de morte.

O espírito do espectáculo, cuja classificação de Maiores de 16 peca por defeito, na minha humilde opinião, é bem visível na pergunta que faz à audiência, no fim: “Não sei se alguém aqui ficou ofendido. Se ficou, que vá para o c….”.

por Jorge Santos

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