25 de março de 2014

Opinião - O Factor Humano

Título: O Factor Humano
Autor: Graham Greene 
Editora: Casa das Letras

Sinopse:
Maurice Castle é um ex-diplomata britânico que trabalha no MI6, em Londres, e é casado com uma bela sul-africana. O seu dia-a-dia de agente de secreto parece ser mais burocrático do que se imaginaria, até que uma fuga de informação traz à tona o seu passado, desorganiza a sua vida e coloca em xeque o seu futuro. 
Este livro é a história de um agente duplo, forçado a essa situação pelo seu amor por uma negra. Aborda o tema do apartheid e do racismo, condicionado de um lado pela política britânica e do outro pelas ambições russas. 
O Factor Humano é considerado a obra mais madura de Graham Greene. Com sua prosa elegante, Greene medita sobre a força do amor e do segredo profissional - e sobre os sacrifícios por eles exigidos. Consegue prender o leitor com o seu enredo, mas sobretudo com a caracterização das suas personagens, pintadas com uma profunda compreensão e respeito pelas ironias, ambiguidades e as zonas obscuras da alma humana.

Opinião por Pedro Barcelos:
Eis um livro de espionagem que foge àquilo que é norma no género. Aqui não há agentes tipo 007, nem nada que se pareça. 

Acção no terreno? Casas secretas? Armas inovadoras? Gadgtes? Cenários paradisíacos? Tiroteios? Belas mulheres? Carros de alta cilindrada? Grandes cidades, como Paris, Roma, Washington? Nada disso. A única coisa que há é Londres nos anos 1970, pois é aí que decorre essencialmente a acção, e alusões à África do Sul, no passado, pois lá está a origem do enredo deste romance de Graham Greene, um original de 1978 que foi recentemente editado em Portugal pela Casa das Letras. 

Pois é precisamente a ausência dessas características típicas e literárias do mundo da espionagem um dos focos do enredo, já que uma das personagens sonha incessantemente com tais “aventuras”, em vez do seu burocrático cargo de escritório que tem no MI6. Esse aspirante a James Bond é colega de trabalho de Maurice Castle, antigo diplomata (à espera da reforma) que esteve colocado na África do Sul, de onde trouxe a sua mulher, uma negra, facto que lhe criou uma série de problemas devido ao apartheid que são o pretexto a que Greene recorreu para abordar a temática. Ao barulho surgem, também, os russos, pois em tempo de Guerra Fria espionagem era sinónimo de contenda entre ocidente e Bloco do Leste. Ora, ao tal Castle esta vida cinzenta e sem emoção era tudo aquilo a que aspirava, para poder viver em paz com a sua mulher e o filho desta, a custo resgatados da racista África do Sul. Mas uma fuga de informação lança a suspeita sobre o gabinete onde ambos trabalham e Greene mostra-nos, com recurso a um humor refinado, como o problema é solucionado e leva-nos por caminhos surpreendentes, mostrando como é esbatida a fronteira entre o bem e o mal e entre um lado e outro da Guerra Fria. 

A experiência pessoal de Greene terá servido de inspiração a esta (como a outras) obras, pois ele trabalhou nos serviços secretos britânicos, precisamente no MI6 no “mercado” africano, e sob as ordens de Kim Philby, um agente duplo que serviu os interesses da União Soviética. 

O Factor Humano é um livro de espionagem que está bem longe de ser um thriller, embora para o final cresça gradualmente de ritmo e nos apresente uma série de surpresas até ao clímax. 

O Factor Humano é um título mais do que adequado, pois nesta história o que conta mesmo são as pessoas, mais do que estratégicas políticas ou de geopolítica. Mais do que interesses de nações ou facções, são os interesses individuais de cada um, para a sua vida quotidiana, que fazem mover o curso da história. Para lá chegar, Greene deu vida a um bom conjunto de personagens, traçando retratos psicológicos que criam laços (de afecto ou desafecto) .

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