28 de junho de 2019

Opinião – “Homem-Aranha: Longe de Casa” de Jon Watts


Sinopse

Após os eventos de “Vingadores: Endgame”, o Homem-Aranha vê-se obrigado a dar um passo em frente e encarar novas ameaças num mundo que mudou para sempre.

Opinião por Artur Neves

Depois do cataclismo que se abateu sobre a terra em “Vingadores – Endgame”,em que os principais heróis foram mortos sem ressuscitação possível (palavra da Marvel) esta, só tem que recuperar a sua aura, reciclando um herói que “nasceu” na década de 60 e granjeou até hoje largos milhões de dólares nos vários suportes em que foi apresentada ao público, vista, revista, amada e desejada por uma camada jovem que se presta a sonhar com justiça igualitária e poderes absolutos sobre o mal, esquecendo-se que cada um encara o “mal” (ou o “bem”) á sua maneira e de acordo com as suas experiencias.
Desta vez e para dar a entender um recomeço em grande, a Marvel filmou nas principais capitais europeias sob uma pressuposta viagem de fim de ano escolar para Peter Parker (o nome público do anónimo Homem-Aranha interpretado por Tom Holland, que já tirou assinatura para os super-heróis) e seus colegas de turma, onde por “coincidência”, vão ocorrer os ataques destrutivos dos vilões que ele irá combater. Um dos problemas a resolver para já será manter o anonimato na escola e salvar o mundo da destruição que o ameaça.
Mas ele não está sozinho, além do seu chefe de missão Nick Fury (Samuel L. Jackson) aparece agora um tal Mysterio (Jake Gyllenhaal) a ocupar o lugar de mentor, deixado vago pelo Iron Man (Robert Downey Jr.) e o pelo resto dos vingadores que foi cada um à sua vida individualmente. No lado sentimental temos Michelle Jones (Zendaya) a apaixonada secreta para quem Peter Parker não encontra jeito de se revelar, apesar de pensar nisso e projetar encontros no cimo da torre Eiffel, mas os acontecimentos não o permitem. Ambos são jovens e românticos e exibem a tradicional falta de jeito na adolescência que potencia algumas cenas “gagas” muito comuns em filmes de amor tradicionais.
Para movimentar a história, vários twists surgem na aventura e Mysterio não é bem somente o herói com a cabeça metida num aquário e uma capa vermelha que salva as situações, mas antes um personagem multidimensional que não é bem o que parece. Peter Parker acha que seria a ele que lhe deveria caber a luta contra os quatro elementos que ensombram o mundo, mas a realidade não é essa e o aluno do ensino médio tem de dar o corpinho ao manifesto na pele do Homem-Aranha, muito embora ele queira somente gozar as férias no estrangeiro como os outros colegas.
A certa altura Mysterio diz que; “As pessoas precisam acreditar e cabe-nos a nós dizer-lhes em quê” que para mim resume o fundamento da revitalização dos heróis da Marvel neste filme. Com uma história mais composta que embora se sirva de homens voadores, raios de energia a sair pelos punhos, drones maliciosos e toda a panóplia da tecnologia moderna, não se esgota aqui e consegue com outros personagens herdados da história inicial, tal como; a tia May (Marisa Tomei) que personifica um objeto de desejo em várias cenas, ou Ned (Jacob Batalon) como o amigo do peito e confidente de Peter, com quem ele partilha os seus desejos mais secretos, conferir ao filme uma vertente mais humana e reconhecida que outros filmes do mesmo género perderam completamente.
Parece que o objetivo é continuar por este caminho, pois Peter é ainda um jovem com muito para dar ao personagem. No caso de o leitor optar por assistir a este filme, informo que a Marvel inseriu cenas depois dos créditos finais. Elas não são despicientes, pois indiciam algumas pistas para os próximos capítulos.

Classificação: 7 numa escala de 10

27 de junho de 2019

Opinião – “O Sol Também é uma Estrela” de Ry Russo-Young



Sinopse

Daniel Bae (Charles Melton) e Natasha Kingsley (Yara Shahidi) conhecem-se — e apaixonam-se — durante um dia mágico na cidade de Nova Iorque. A atração é imediata entre estes dois desconhecidos que talvez nunca se tivessem encontrado, se o destino não lhes tivesse dado um empurrãozinho.
Mas será o destino suficiente? Restam apenas algumas horas a Natasha antes de ser deportada dos EUA juntamente com a família. Natasha luta contra a expulsão da sua família com tanto empenho como luta contra o que começa a sentir por Daniel, que se empenha tanto como ela em provar-lhe que estão destinados a ficarem juntos.
“O Sol Também é Uma Estrela”, uma história moderna sobre encontrar o amor contra todas as probabilidades, explora se as nossas vidas são determinadas pelo destino ou pelos acontecimentos aleatórios do universo.

Opinião por Artur Neves

Esta é uma história de amor improvável porque ela é racional e cética e ele um romântico inveterado que acidentalmente se encontram em Nova Iorque, enquanto ela esgota os últimos cartuchos para impedir a deportação com a família para a Jamaica de onde são originais. Ele é um potencial estudante de medicina Coreano, sem gosto nem vontade pelo assunto porque quer tornar-se poeta e ela, uma estudante de ciências que não acredita em nada que não possa ser medido ou pesado, fazendo jus ao seu pragmatismo genético.
O “empurrãozinho do destino” mencionado na sinopse, refere-se ao facto de ele a ter salvo de ser atropelada por um carro enquanto deambulava, absorta, pelas ruas a caminho duma entrevista com o advogado de imigração e ativista dos direitos dos imigrantes; Jeremy Martinez (John Leguizamo), do qual obteve poucas esperanças. Após nove anos de permanência clandestina nos USA, está a 24 horas do voo de deportação que a retornará à Jamaica e terminará o sonho de se formar em ciência astronómica.
Este filme tem como base o romance “YA” de Nicola Yoon (que Nicholas Sparks não enjeitaria pois é bem ao seu estilo) que conta uma história semelhante em; “Antes do Amanhecer”, escrito e realizado por Richard Linklater em 1995. Em ambas, o tema do amor sem futuro constitui o cerne das duas abordagens e os tempos diferentes em que ambos foram realizados condiciona o contexto em que se verificam, embora as conversas, as trocas de olhares significativos e o desfrute da presença comum entre os apaixonados seja uma constante.
“Antes do Amanhecer” é um bom filme, com densidade dramática e humor sofrido, “O Sol Também é uma Estrela” nem tanto, pese embora o facto de conter uma crítica subliminar à falta de apoio à imigração, mesmo quando esta já tem algum tempo de permanência no país, inserindo-se portanto na problemática atual da imigração para os USA no consulado de Trump.
Para agradar ao seu público-alvo, o filme contém todos os indicadores do mesmo destino carrasco que os uniu e os irá separar em despedidas lacrimosas e promessas de amor eterno que os reunirão num tempo não previsto nem previsível, porque amor que se preza quer-se sofrido e doloroso para melhor usufruir das alegrias do reencontro futuro. Não sei porque tem de ser assim, mas é assim que é e não há realizador que fuja ao figurino do drama romântico para induzir no espectador o trauma da separação e fazê-lo sentir o miserabilismo da existência humana.
Outro lugar-comum é a insistência no destino que vai servir de âncora a diferentes eventos desde que os apaixonados se encontram pela primeira vez. Isto confere uma predestinação à história, que cai bem em alguns públicos, mas que restringe a universalidade do amor a um condicionamento externo não controlável. O filme vive também à custa dos atores, que embora novos, exibem um carisma natural que salva a representação. Deles decorre o mérito da classificação indicada.

Classificação: 6 numa escala de 10

24 de junho de 2019

Opinião – “Sem Filtro” de Eric Lavaine


Sinopse

Na companhia de familiares e amigos próximos, Beatrice (Alexandra Lamy) comemora a publicação do seu livro, onde conta o acidente do marido, que lhes alterou radicalmente a vida: Frederic (José Garcia) ficou cego e sem filtro, passando a dizer tudo o que pensa. Embora continue divertido e sedutor, transformou-se num homem imprevisível.
Mas o livro – um hino à vida – acaba por desencadear uma onda de discussão, porque embora Beatrice tenha alterado os nomes dos amigos que menciona no livro, cada um deles tenta identificar a sua personagem, o que vai despertar segredos e ciúmes escondidos. O grupo de familiares e amigos estremece, mas há tempestades que nos salvam a vida.

Opinião por Artur Neves

“Sem Filtro” é mais um filme francês que aborda a temática dos relacionamentos pessoais tanto no foro íntimo como social num regime ligeiro, de comédia “soft”, que apela ao sorriso através do sentido secundário das situações que nos são mostradas, de uma cuidadora presente em todos os momentos da vida do seu agregado familiar onde existe um deficiente visual e cognitivo, uma filha adolescente e um rapaz infantil, no contexto descrito na sinopse, que lhe satura a existência.
Como terapia para a sua abnegada insatisfação, Beatrice resolve escrever um livro onde descreve a sua vida vivida durante os últimos cinco anos e do seu grupo de amigos que de alguma maneira a têm apoiado nesta difícil fase, descrevendo, embora com nomes fictícios, as suas características, as suas tendências, os seus interesses e particularidades que ela mais apreciou, mas que ao serem lidos pelos próprios, que se reconhecem pelos eventos citados, não têm o mesmo entendimento de catarse, de agradecimento, de hino à amizade com que ela os citou.
Adicionalmente, a história também nos transporta para o novo paradigma das relações abertas tão em voga nos tempos que correm, como sendo mais uma panaceia para a ajudar a suportar a sua solitária existência, considerando que entre outros traumas, o marido Frederic também ficou impotente. Este íntimo problema foi sendo resolvido, através do conhecimento acidental de Bernard (Nuno Melo) durante um dos ataques de gula de Frederic no restaurante de fast food em que se encontraram.
A atração entre Beatrice e Bernard floresce e consuma-se, é uma paixão com hora marcada, com apontamento de calendário, e com justificação alternativa pois o tempo é um elemento contínuo na vida das pessoas. Ela ama e trata do marido, não descura o governo da casa nem o acompanhamento dos filhos mas sente-se só, diminuída, com uma vida insuficiente. A paixão que experiencia com Bernard é o complemento que lhe falta, o côncavo para o seu convexo (parafraseando Roberto Carlos) a fonte do seu equilíbrio, o seu ânimo no dia-a-dia, que como mais tarde veremos é reconhecido e aceite pela sogra, num dos momentos mais gratos desta história.
Só que Eric Lavaine, não quis chegar tão longe e na sua realização só aborda de “raspão” esta realidade e entrega a Bernard (Nuno Melo) o protagonismo da cena mais desconchavada deste filme. Não se lhe exigia um final romântico de pacotilha, ou uma “love story” de arrasar, incompatível com alguém que coloca em livro a catarse das sua frustrações, mas apenas o reconhecimento de que; “não se deve começar aquilo que não se pode acabar”, ou neste caso; não se quer abordar. Por tudo isto considero-o inferior ao recente: “Pequenas Mentiras entre Amigos 2” e 1 também. Ainda assim continua a ser interessante, pelo sorriso que provoca e pela reflexão “sem filtro” que indicia.

Classificação: 6 numa escala de 10

18 de junho de 2019

Opinião – “Campeones” de Javier Fesser


Sinopse

Marco (Javier Gutiérrez) é o treinador assistente de uma das melhores equipas de basquetebol da liga espanhola. Um dia, após uma discussão com o treinador principal da equipa, resolve afogar na bebida as suas frustrações pessoais e má atitude, acabando por se envolver num acidente de automóvel que o leva a tribunal.
Como consequência, perde o emprego, a namorada, e a sua sentença é também o pior castigo possível para o seu ego: treinar um grupo de jogadores com deficiências intelectuais, que nunca antes haviam tocado numa bola.
Mas através da sua inocência, ternura e muito bom humor, serão estas pessoas que vão ensinar a Marco o que realmente interessa. Eles são os verdadeiros Campeões da Vida.

Opinião por Artur Neves

Já algum tempo que tenho verificado algum ascendente na cinematografia espanhola que se tem vindo a modernizar, largando algum provincianismo de forma (que infelizmente ainda não abandonou o cinema Português, embora comece a ver-se algumas novidades) e abalançando-se em temas universais, tal como neste filme em que aborda a exclusão por deficiência duma forma divertida e alegre, embora saturada de clichês e recheada de manipulação sentimental.
“Campeones” alega que ninguém é perfeito, todos temos os nossos defeitos, só que alguns são mais evidentes do que outros que têm a possibilidade de os esconder e assim viver sem a censura ou exclusão social, como no caso desta equipa de basquetebol composta por atletas com a síndrome de Dawn e insuficiência intelectual generalizada.
Todo o conjunto de atores envolvidos sofre desta síndrome, embora com diferentes tipos de deficiência dominante, pelo que pode imaginar-se o grau de dificuldade em realizar um filme destes, semelhante à dificuldade do nosso herói, Marco, o treinador da equipa, que manifestando alguma resistência inicial em assumir o seu papel, consegue levar esta equipa improvável à final do campeonato.
Evidenciando as diferenças particulares de cada atleta, de cada pessoa, através dos seus tiques, das suas fobias, ou das suas preferências, no contexto do basquetebol e enquadrado por um espírito de comédia de narrativa simples e evidente, Javier Fesser consegue confrontar o espectador com os seus próprios preconceitos sobre a aceitação da deficiência nas diferentes ocupações da vida corrente, embora tratando-os sempre com declarada condescendência de forma a amenizar as suas diferenças.
O importante, é conseguir o sorriso e a lágrima furtiva, num ritmo que caracteriza todo o filme como normal (dentro daquela anormalidade que não interessa enfatizar) e sensível para aquelas pessoas tão diferentes, que ganham vida e autênticas vitórias de inserção social, somente pelo facto de estarem juntas e de partilharem em conjunto os objetivos do centro social que os acolhe.
Compreende-se que a intenção de “Campeones” seja boa e tente cativar o público pelo lado emotivo para o qual faz uso de vários gags visuais e sonoros que lentamente nos vão cativando, embora sem nunca deixarmos de ver as nobres intenções que estão por detrás desta obra, que por mais doces que se apresentem nunca validam comportamentos de verdadeiros campeões.
Este filme foi o embaixador Espanhol aos óscares, na qualidade de melhor filme estrangeiro, embora não tendo sido qualificado como tal, não obstante o sucesso que fez em Espanha e noutros países onde foi exibido com vozes dobradas. É todavia um filme com bons momentos de comédia, um drama “amor de cordel” entre o treinador e a sua mulher e que servirá para rir moderadamente se conseguir não pensar muito no contexto envolvente.

Classificação: 5 numa escala de 10

14 de junho de 2019

Opinião – “A Vigilante” de Sarah Daggar-nickson


Sinopse

A Vigilante – Sadie, (Olivia Wilde) uma mulher vítima de violência doméstica, dedica a sua vida ao auxílio de outras mulheres vítimas do mesmo tipo de abuso.
Enquanto procura localizar o seu marido para o matar e então ser verdadeiramente livre.
A Vigilante é um thriller inspirado pela força e bravura de vítimas reais de violência doméstica e pelos inacreditáveis obstáculos à segurança que as mesmas enfrentam.

Opinião por Artur Neves

Denunciar a violência doméstica e utilizar o cinema para divulgar o seu combate e reiterar o direito que ambos os cônjuges possuem em usufruir de uma vida em comum, harmoniosa e profícua. Incitar a mulher, como sendo a vítima mais frequente, a denunciar as sevícias de que é alvo no interior da sua casa é uma boa utilização do cinema em defesa de um problema social que se vem divulgando com uma frequência indesejável.
Considerar como exemplo de solução a existência de uma vingadora, “A Vigilante” na figura de uma mulher durona, combativa, embora também abusada, o que a transforma em juíza em causa própria, como a repositora dos direitos violados, através de justiça executada pelas próprias mãos, é outra coisa muito diferente e significa passar-se para o extremo oposto do problema. Constitui uma abordagem justicialista tão nefasta, equivalente a ação legal da justiça a que temos assistido diariamente no nosso país.
A figura do vigilante justiceiro (no cinema existem também “vigilantes” de outro cariz) tem origem no cinema americano na década de 40 e teve o seu ponto alto na década de 70 com o ator Charles Bronson (num personagem que se lhe colou à pele) no filme; “O Justiceiro da Noite” de 1974, que fez escola noutros filmes da mesma década.
Nesta história Sadie é uma feminista que se dedica à defesa de mulheres em risco de vida, destruindo os homens que as maltratam e de caminho também faz uma perninha como defensora de crianças e de todos os que justificadamente recorram aos seus serviços. Todavia ela só salva, não trata, os miúdos que ficam abandonados por ela castigar os pais que os maltratam têm de posteriormente dirigir-se aos serviços da segurança social porque a companhia dela é perigosa, considerando que ainda tem de matar o marido que a maltratou e que num acesso de fúria, para lhe causar mais sofrimento, ainda matou o filho de ambos.
O parágrafo anterior resume o argumento desta história e será o que vamos assistir durante os 90 minutos do filme até finalmente confrontar o ex-marido (Morgan Spector) um mercenário com aspeto genuinamente selvagem que a deixou quase morta, matou o filho e desapareceu, impedindo-a de acionar o seguro de vida. No primeiro encontro o ex-marido ainda consegue manietá-la, mas no segundo, com um braço partido, ela trata-lhe da saúde de vez.
Com menos conversa e de outro modo mais credível, já Jennifer Lopez tinha lá chegado primeiro, em 2002 no filme “Basta” de Michel Apted, prestando um melhor serviço à causa, representando de forma mais angustiante para a mãe e para o filho, o drama da violência doméstica e o terror da vítima face ao seu algoz.
“A Vigilante” vale assim pelo tema que aborda, mas apresenta inúmeras fragilidades de forma e contem diversos clichês inerentes ao género. Não é que isso seja um mal em si mesmo, mas amortece o impacto dos maus tratos domésticos numa altura em que o tema se reveste duma atualidade gritante. No seu género, Olivia Wilde ainda nos pode oferecer mais do que isto.

Classificação: 5 numa escala de 10

13 de junho de 2019

Opinião – “Billy The Kid – A Lenda” de Vincent D'Onofrio


Sinopse

Rio (Jake Schur), é obrigado a percorrer o sudoeste americano numa tentativa desesperada para salvar a irmã (Leila George) do cruel tio (Chris Pratt). Pelo caminho, encontra o xerife Pat Garrett (Ethan Hawke), que persegue o infame fora-da-lei Billy the Kid (Dane DeHaan). Rio envolve-se cada vez mais nas vidas dessas duas lendárias figuras, no culminar deste jogo de gato e rato, durante o último ano de vida de Billy the Kid. Por fim, Rio é forçado a escolher o tipo de homem que vai ser, um fora-da-lei ou um homem honrado, e usará essa tomada de consciência num ato final para salvar a sua família.

Opinião por Artur Neves

Os Westerns não são muitos frequentes nos tempos que correm. Foram quase um tema obrigatório nas décadas de 60 e 70 e fizeram carreira, porém a sua degradação começou com o chamado western spaghetti de baixo orçamento e rodado em Itália e no sul de Espanha. Como tal, quem se propõe fazer um western em 2019, deveria ter obrigatoriamente alguma coisa para contar.
Vicente D’Onofrio, ator e realizador desta história clássica, traz-nos aqui uma abordagem curiosa, considerando que, envolvendo uma histórica lenda do velho Oeste americano, a luta sem quartel entre o xerife Pat Garrett e o seu bandido de eleição; Billy the Kid, mostra-nos apenas a fase da sua captura, os motivos da perseguição são inerentes à justiça praticada “por decreto” por Pat Garrett, ao serviço de um mau exemplo, para um espírito em formação personificado em Rio, um rapaz de 14 anos que mata o pai no momento em que este maltrata a sua mãe com socos e pontapés com intenção expressa de lhe provocar a morte.
O encontro entre Billy the Kid e Rio é acidental, durante a fuga deste com sua irmã após a morte do pai, mas apresenta-nos um Billy the Kid filosófico, introspetivo, algo moralista sobre o sentido da vida e do erro cometido por ele sobre a vida de crime que levou até aquele dia. Para Rio, Billy torna-se um modelo e um ídolo mas com o reconhecimento deste sobre a sua má conduta, temos um exemplo pela negativa para um espírito em formação e em fuga de uma má ação praticada em legítima defesa e para defesa da sua irmã.
Com uma história destas este filme não pode ser um clássico, muito pelo contrário, Rio significa aqui o “papel em branco”, onde através dos exemplos de Billy filosófico e de Garrett rígido moralista, seguidor da dura lei do oeste que ele jurou defender, se escreve, quiçá por linhas tortas, o lado direito da vida e do cumprimento do dever. Por acaso a “lição” fica-se pelo direito, descartando as falsas lições moralistas recheadas de metáforas religiosas. D’Onofrio não foi por aí e eu agradeço-lhe.
Este filme, baseado no livro de Andrew Lanham, “The Kid”, apresenta-nos uma série de clichés sobre comportamentos humanos, embora sem qualquer originalidade sobre o seu desenvolvimento. Tem momentos curiosos, tal como o enforcamento a que Rio assiste e o crescimento acelerado que isso implica, bem como, a punição da violência doméstica tão em voga nos tempos atuais. Decorrente disso e da sua especificidade diferenciadora do género, merece ser visto.

Classificação: 6 numa escala de 10

Opinião – “Homens de Negro – Força Internacional” de F. Gary Grey



Sinopse

Os Homens de Negro sempre protegeram a Terra da escória do universo. Nesta nova aventura, eles vão enfrentara maior ameaça até hoje: um infiltrado na organização Homens de Negro.

Opinião por Artur Neves

Esta é mais uma sequela da série MiB (Men in Black) baseada em histórias de banda desenhada pertencente à Marvel Comics e que tanto antes como agora aborda o tema da ficção científica, (de largo espectro, digo eu) corporizado nuns homens vestidos de negro, enquadrados numa organização secreta que lutam contra a invasão da terra por seres alienígenas com as mais inusitadas formas e feitios. Foram feitos três filmes em; 1997, 2002 e 2012, aos quais, sete anos depois, se seguiu a presente história.
O primeiro filme foi objeto de vários prémios, incluindo o Oscar da Academia em 1998 para a melhor maquilhagem, tendo tido os seguintes uma classificação mais modesta. Aliás esta série aparece como sendo um refinamento da história veiculada em; “Os Caça Fantasmas” de 1984 que tanto sucesso obteve em diversão e bilheteira.
Em 2019 porém tudo muda, mais uma vez os atores, de certa nomeada, tais como; Emma Thompson e Liam Neeson, registe-se, entregam-se nas mãos das equipes de efeitos especiais computorizados e perdem toda a identidade de representação numa história indigente, que embora seguindo tudo o que já conhecemos da trilogia inicial, foi como que abduzida pela febre dos jogos de computador em que a emoção se mede pela escalada de dificuldade crescente na realização das tarefas.
Em boa verdade eu não tenho nada contra os jogos de computador, só que a emoção que eles transmitem decorre do facto de ser o jogador que intervém na ação, dependendo da sua destreza de manipulação do comando o acesso às etapas de crescente dificuldade com que o jogo o desafia. Agora no filme o espectador apenas pode assistir sem qualquer possibilidade de intervenção e isso em vez de ser excitante e emotivo torna-se monótono.
Resta-lhe o formato IMAX e 3D que torna ainda assim, o filme, numa experiência imersiva complementada pelo som multicanal que vetoriza a ação, mas continua a ser insuficiente. Logo na entrada, o logótipo da Columbia Pictures coloca uns óculos de sol que representam a identidade dos MiB e que aqui pode muito bem significar a necessidade da colocação dos óculos necessários para experimentar e estereoscopia visual do 3D, pois doutra maneira a experiência torna-se ainda mais insípida.
Na trilogia inicial tínhamos o combate com os seres alienígenas em que os MiB tinham que “provar” o seu valor de cada vez que se confrontavam com eles. Aqui não é bem assim e em toda a história sabe-se sem surpresa quem vai vencer, pelo que, segundo este ponto de vista “Homens de Negro – Força internacional” tem pouco para oferecer, deixando um sensação de “nada de novo debaixo do sol”.
Todavia este género tem os seus fans e para eles vai a minha admiração e o meu pedido de desculpas por não apresentar uma classificação. Na minha opinião, cinema é bem mais do que somente isto.

Classificação: _ numa escala de 10

7 de junho de 2019

Opinião – “High Life” de Claire Denis


Sinopse

Nos confins do espaço, muito além do nosso sistema solar, Monte (Robert Pattinson) e Willow, a sua filha pequena, vivem juntos a bordo de uma nave espacial, em isolamento total.
Monte, um homem solitário cuja severa autodisciplina é uma proteção contra o desejo – o seu e o de outros – tornou-se pai contra a sua vontade. O seu esperma foi usado para inseminar Boyse (Mia Goth), uma jovem que deu à luz Willow. Ambos eram membros de uma tripulação de prisioneiros: encarcerados espaciais, condenados à pena de morte. Usados como cobaias pela perversa Dra. Dibs (Juliette Binoche) são enviados numa missão ao buraco negro mais próximo da Terra.
Agora, somente Monte e Willow permanecem. Mas Monte não é o mesmo. Através da filha, e pela primeira vez, experimenta o nascimento de um amor avassalador. Pela sua parte, Willow cresce, tornando-se numa menina e depois numa jovem mulher. Juntos e sozinhos, pai e filha aproximam-se do seu destino final – o buraco negro onde o tempo e o espaço deixam de existir.

Opinião por Artur Neves

Anteriormente nestas crónicas, a propósito do filme “O Meu Belo Sol Interior” de 2017 já abordei a personalidade de Claire Denis que também realiza este filme. Só que, em “O Meu Belo Sol Interior” o argumento e a história filmados seguem um guião genericamente tradicional, muito ao contrário do que acontece em “High Life” que embora classificado como ficção científica, foge aos cânones desta classe pelo que me parece importante acrescentar algo mais, ao que ficou dito sobre a realizadora francesa Claire Denis.
Esta senhora, nascida em Abril de 1946 em Paris, é particularmente conhecida por seguir um raciocínio sinuoso nos seus filmes, nomeadamente dando respostas a perguntas que o espectador não faria, deliberadamente para o fazer sair da sua zona de conforto, de forma a no entender dela, nos confrontar com verdades mais elevadas do amor e da vida. Por outro lado, as suas abordagens de violência no amor, têm sempre uma componente sexual brutal, ou um assassínio cometido de forma improvável e imprevisível no contexto, considerando que no seguimento da história não nos conduziria a antever desfechos tão drásticos e letais.
Ela desafia o espectador através de relações improváveis, tais como; amor e provocação de ferimentos, lutar e fazer amor (sendo esta dualidade uma das suas preferidas) beijar e morder até arrancar o lábio num delírio de paixão, ou como neste filme, em que a nave se parece mais com um armazém desorganizado, os tripulantes são todos condenados à morte sem redenção, a sua missão consiste numa viagem ao buraco negro mais próximo da terra que os conduzirá à morte inevitável, incluindo a bebé que nasceu abordo e que representa um futuro de esperança que todos acalentam mas que lhes é liminarmente negado.
Em “High Life” o conceito de ficção científica é completamente deformado, onde a Drª Dibs que comanda a nave, desenvolve brinquedos sexuais, pratica o sexo com uma energia selvagem e demoníaca, viola os seus pacientes roubando-lhes esperma numa exaltação criativa de natureza humana destruidora, sem um objetivo definido que não, o de confrontar o espectador com conceitos e pensamentos que na vida normal, sublimamos, ou pura e simplesmente mantemos em segredo no nosso espírito.
Não quero com isto dizer que o filme não tenha qualidade, pois pode justificar-se um bem pelo lado negativo desse bem, mas além de ser insólito conduz-nos a elipses mentais que contrariam a fluência corrente do pensamento humano. Como pode um assassino de crianças cuidar tão ferozmente de uma nova vida?... Como pode um buraco negro, que tudo absorve, até a luz, constituir-se como um buraco de esperança?...
São pois, estas contradições que o esperam caro leitor, se optar por se divertir com este filme, pelo meu lado gostei, porque gosto de desafios, embora reconheça que tenho gostos algo controversos.

Classificação: 7 numa escala de 10

6 de junho de 2019

Opinião – “O Corvo Branco” de Ralph Fiennes


Sinopse

Um jovem de apenas 22 anos, vestido com uma boina preta e um fato escuro justo, viaja num avião de São Petersburgo para Paris. Estamos em 1961 e Rudolf Nureyev, ainda não é uma figura lendária e majestosa: dança na mundialmente famosa companhia Ballet Kirov e viaja pela primeira vez para fora da União Soviética.
A vida parisiense encanta Nureyev e o jovem bailarino está ansioso por consumir toda a cultura, arte e música que a deslumbrante cidade tem para oferecer. Mas os agentes do KGB, que observam cada movimento seu, tornam-se cada vez mais desconfiados do seu comportamento e da amizade com a jovem parisiense Clara Saint. Quando finalmente confrontam Nureyev com uma exigência chocante, ele é obrigado a tomar uma dolorosa decisão que poderá mudar para sempre o curso da sua vida e colocar a sua família e amigos em grande perigo.
Da infância pobre de Nureyev na cidade soviética de Ufa, ao seu despontar como estudante de dança em Leninegrado e à chegada ao epicentro da cultura ocidental na Paris do início da década de 1960, “O Corvo Branco” é a história verídica do percurso incrível de um artista único que transformou para sempre o mundo do ballet.

Opinião por Artur Neves

Rudolf Nureyev nasceu a bordo do comboio transiberiano (que viria a marcá-lo para a vida) a caminho de Ufa em Março de 1938 e transformou a arte do ballet, constituindo-se no mais celebrado bailarino e coreógrafo do século XX. Em 1961, durante uma apresentação em Paris e fascinado com o ambiente cultural que vivencia, desertou para o Ocidente, apesar da vigilância cerrada do KGB e da nomenklatura Soviética que o cercava de perto.
É durante este período da sua vida, o nascimento, a infância, a escola de dança, o virtuosismo revelado em São Petersburgo que Ralph Fiennes realiza este filme e interpreta o professor Alexander Pushkin, escolhido por Nureyev para o ensinar. Desde muito cedo que o seu caráter impulsivo, avesso a regras e em certas situações, grosseiro, que Nureyev se revela, como Fiennes tem alguma contenção em mostrar, com um percurso de desmandos e de infâmias que, apesar de constituírem o sucesso de uma carreira, poderiam manchar o valor de um artista. É talvez por isso que o filme se resume às suas origens.
Embora a história sendo sobre Nureyev (Oleg Ivenko) cabe aqui referir a interpretação de Fiennes que documenta a capacidade e versatilidade deste ator Inglês, ao interpretar o seu personagem, Pushkin, falando fluentemente um Russo.
Aliás como realizador ele também é notável, considerando que o desenvolvimento da história, embora ancorada em Paris 1961, é complementada oportunamente com as referências à infância e à escola em São Petersburgo que nos permitem compreender e interiorizar todas as motivações da personalidade histriónica de Nureyev. Em tudo o mais Fiennes é meticuloso, imprimindo à história um bom ritmo, culminando no processo de deserção para Ocidente, recheado de suspense, em que Nureyev tem de decidir passar por uma de duas portas, para ser livre, ou para voltar sob prisão à URSS.
Todavia, como filme ilustrativo da dança clássica, não apresenta grandes cenas de bailado e quem for à espera disso pode sentir-se frustrado, como ainda, acaba no momento da grande revelação de Rudolf Nureyev ao Ocidente, à França, ao início da sua consagração e da parceria com Margot Fonteyn, para a qual o filme deixa uma dica. Falta-lhe revelar a sua bissexualidade, a sua vivência íntima partilhada por vários anos com companheiros masculinos, o seu mau génio, a sua dependência das drogas e o seu contágio com SIDA que provoca a sua morte em Janeiro de 1993.
Nessa área Ralph Fiennes não se quer meter e por isso fica em 1961, na pele de Alexander Pushkin, sendo interrogado pelo KGB sobre a fuga do seu pupilo e respondendo a tudo com a mesma postura com que ensina os seus alunos. No silêncio do seu espírito talvez pense que um dia alguém vai querer fazer um; “O Corvo Branco 2” para o qual não lhe faltará material.
Um filme muito interessante, recomendo.

Classificação: 7 numa escala de 10

5 de junho de 2019

Opinião – “X-Men: Fénix Negra” de Simon Kinberg


Sinopse

Esta é a história de uma das personagens mais amadas dos X-Men, Jean Grey, enquanto esta evolui para a icónica Fénix Negra. Durante uma arriscada missão de resgate no espaço, Jean é atingida por uma força cósmica que a transforma no mais poderoso mutante de todos. Enquanto tenta contar a instabilidade desse poder, e também lidar com os seus próprios demónios, Jean perde o controlo, quebrando os laços da família X-Men e ameaçando destruir o próprio planeta. É o culminar de vinte anos de filmes de X-Men, em que a família de mutantes que conhecemos e amamos vai enfrentar o seu mais devastador inimigo – um dos seus.

Opinião por Artur Neves

X-Men é uma série de super-heróis (seja lá o que isso for) da Marvel que inicialmente apareceu em quadradinhos de banda desenhada mas que a 20th Century Fox passou para o grande ecrã em 2000, subindo gradualmente a fasquia até ao 3D e IMAX-3D em que actualmente se encontra, com uma sequência de 12 filmes que seria fastidioso enumerar. A história anda sempre à volta de mutantes que desenvolveram características especiais de superioridade física ou mental que colocam ao serviço do bem e da justiça, como convém, já que para malandros existem muitos outros e estamos fartos deles.
Desta vez e tal como a sinopse descreve, a missão de resgate efetuada pelos X-Men foi para salvar os tripulantes do shuttle Endeavour, cujo lançamento correu mal devido a uma explosão solar, a que a nave dos X-Men é imune e resiste ao calor e ao que mais se verá. A pergunta óbvia é; então se a nave dos X-Men se desloca pelo espaço como cão por vinha vindimada, porque é que andamos ainda com a treta dos shuttles para vencer a força da gravidade terrestre para colocar objetos em órbita?...
Mais elementar ainda é perguntar porque é que o filme se chama “Fénix Negra” se a actriz que a interpreta é particularmente branca!... e como a acompanhamos desde a infância sabemos ainda que em pequena era ruiva e sardenta!... Fénix Negra, porquê?...
Como o leitor pode inferir não sou capaz de dar estas respostas e depois de muito pensar durante o visionamento até fiquei cansado, pois isto de ver tanta energia a sair pelos olhos, pelas mãos, a elevar-se para o espaço, a descer vertiginosamente para o solo, a amachucar comboios e a lutar, cansa o mais forte e as largas dezenas de duplos utilizados nas filmagens, tal como nomeados nos créditos finais do filme.
O que temos aqui é assim uma história de cordel mal-amanhada, que envolve mentiras piedosas, remorsos e traumas de infância, recheada de bons atores (a Marvel e a Fox não deixam os seus créditos por mãos alheias) tais como; James McAvoy, Michael Fassbender, Jennifer Lawrence e outros de reconhecida competência em Holywood cujas imagens são entregues aos desenvolvedores de efeitos especiais e de caracterização e os transformam neste arrazoado de luz, som, riscos e cores, potenciados pelo IMAX e pelo 3D, complementados pela música de Hanz Zimmer, aqui irreconhecível se a compararmos com a banda sonora de “O Gladiador (2000)”, ou de “A Origem (2010)”. Em todas as cenas tenta-se atingir o clímax do poder em abstracto, tanto quanto o mal ou o bem estão em alta, como tal a música envolvente é sempre apoteótica, evocativa, que somente serve o momento.
Todavia este cinema tem os seus seguidores e os seus amantes para os quais já só esperam que o próximo filme que lhes traga esta branca Fénix Negra novamente em ação e o correspondente sucesso de bilheteira para a distribuidora. Para mim nem tanto, como tal, dispenso-me de o classificar.

Classificação: _ numa escala de 10

3 de junho de 2019

Opinião – “Os Olhos de Orson Welles” de Mark Cousins


Sinopse

Ao ter acesso exclusivo a centenas de desenhos e pinturas de Orson Welles, o cineasta Mark Cousins mergulha no trabalho visual do actor e realizador mítico para revelar o retrato de um artista como nunca o tínhamos visto – através do seu próprio olhar, desenhado com a sua própria mão, pintado com os seus pincéis. Dá vida às paixões e ao poder deste showman do século XX e explora a forma como o génio de Welles continua hoje a ressoar na época de Trump, mais de 30 anos depois da sua morte.

Opinião por Artur Neves

Um biopic sobre Orson Welles não é um assunto que à primeira vista possa motivar muito interesse. É generalizadamente conhecido como realizador de Citizen Kane de 1941,pelo qual foi premiado, bem como da sua emissão radiofónica sobre a invasão da Terra por seres alienígenas que foi tomada como autêntica pelos ouvintes e lhe valeu um contrato com a RKO para a realização de três filmes com absoluta liberdade sobre os temas.
Todavia, Mark Cousins, um realizador Irlandês, nascido em 1965 em Belfast, centra-se na globalidade da obra deixada por deste diretor e faz deste documentário digressivo uma demonstração da sua admiração, respeito, conhecimento e culto sobre a personagem de um homem que talvez não seja tão conhecida como a partir de agora ficou.
Cousins estrutura o documentário em seis capítulos, em cada um dos quais aborda uma faceta da vida de Orson Welles, tal como, o desenho, a realização, os amores e tudo o que preencheu o conteúdo multifacetado da sua vida, desde as aguarelas e quadros com pinturas durante a infância e continuando pela adolescência e idade adulta, traçando o percurso do autor pela Irlanda, Marrocos, Nova Iorque e Hollywood onde foi famoso e feliz, bem como autoexilado por falta de recursos financeiros.
Cousins teve acesso ao extraordinário acervo de documentação em poder da filha mais nova de Welles, Beatrice, que o assessorou na construção do guião deste biopic, em que Cousins progride através de perguntas que faz a Welles, sabendo previamente as respostas que nos apresenta através dos seus trabalhos, das suas obras em poder da filha, bem como nos arquivos da Universidade de Michigan que incluem esboços de storyboards que Welles fez para vários dos seus filmes.
Ficamos com a ideia que para lá do grande cineasta, Welles foi um visualizador um descritor visual do mundo e da vida, tendo-a realçado através da utilização do som da forma mais criativa do que os outros realizadores seus congéneres, bem como um inovador nas tomadas de vistas segundo uma diagonal privilegiada que passou a ser escola desde então.
Mark Cousins não se detém particularmente na vertente cineasta de Welles, embora lhe refira as obras fundamentais e os pormenores de construção, deixando todavia, perpassar por todo o filme que era essa a principal forma de visualização de Welles e que havia muito mais em Welles do que o “conhecido realizador” que ao ser somente apreciado assim se tornava redutor e limitado da sua incomensurável grandeza.
È um retrato de Welles como nunca tinha sido visto antes, através dos olhos de Cousins que através da animação dos esboços e pinturas de Welles, recria os trabalhos originais numa descrição visual que nos revela o artista de uma forma agradável, diversificada e bem disposta. A ver, recomendo.

Classificação: 8 numa escala de 10