15 de novembro de 2021

Opinião – “The Card Counter – O Jogador” de Paul Schrader

Sinopse

A redenção é um longo jogo em "The Card Counter: O Jogador", de Paul Schrader. Contado com intensidade cinematográfica, marca registrada de Schrader, este thriller conta a história de um ex-interrogador militar que se torna num jogador assombrado por fantasmas das suas decisões do passado. Com interpretações irrepreensíveis de Oscar Isaac, Tiffany Haddish, Tye Sheridan e Willem Dafoe.

Opinião por Artur Neves

Paul Schrader regressa ao seu tema preferido sobre redenção e expiação dos “pecados” cometidos, no qual nos trouxe em 2017 essa obra de referência que dá pelo nome de “No Coração da Escuridão” já apreciado neste blogue, ou o seu argumento de “Taxi Driver” em 1976, dessa vez realizado por Martin Scorsese, para citar somente os trabalhos mais significativos no género. Desta vez a realização também é sua muito embora no genérico do filme esteja referenciada a colaboração de Scorsese como coprodutor.

Schrader criou agora um drama sobre uma personalidade obsessiva, ausência de esperança e desespero constante embora controlado, de um homem que vagueia pelo mundo do jogo profissionalizado depois de sair da cadeia onde ficou preso por oito anos como condenação para os seus crimes contra os suspeitos detidos na prisão de Abu Ghraib, vítimas de sevícias inconfessáveis para confessarem as suas ligações à Al-Qaeda ou outras organizações do fanatismo muçulmano contra os USA. É mais uma vez também uma história que aborda o comportamento da máquina de guerra americana na sua busca constante por um bode expiatório que justifique as suas decisões discricionárias como aconteceu com as “armas de destruição maciça” para justificar a 1ª invasão do Iraque.

William Tillich (Oscar Isaac) é um homem de olhar tenso e rosto fechado, discreto, que deambula pelo mundo cinzento dos casinos de jogos de azar. Na prisão a que ele se adaptou bem, teve tempo para aprender a ciência dos jogos de azar, aprendeu a contar as cartas que vão saindo, a estudar os rostos e a linguagem não-verbal dos seus adversários, perscrutando-lhes a alma para adivinhar as suas opções e para daí obter vantagens. Todavia ele é um solitário e um jogador modesto, nunca ganhando altas quantias para se manter no respaldo do seu anonimato. Apesar de todos esses cuidados ele é notado por La Linda (Tiffany Haddish) uma jogadora que lhe pergunta se ele estaria interessado em se tornar jogador profissional suportado por financiadores das suas relações. Para lá do convite La Linda sente atração por esse homem sóbrio, frio e reservado mas de boas maneiras e de fino trato.

Todavia William sente o peso da solidão diária e numa visita a uma convenção de segurança é abordado por um jovem, nervoso e imaturo, Cirk (Tye Sheridan) que lhe propõe ajuda para matarem um inimigo comum. William não aceita a sua proposta mas reconhece o desperdício de vida do jovem que tem à sua frente e convida-o a acompanhá-lo pelos casinos, prometendo ensinar-lhe os segredos do jogo, como forma de canalizar para essa atividade a sua raiva e a sua mágoa por este mundo sem alma, de uma maneira inofensiva e mais produtiva. Contudo, Cirk tem ideias próprias e embora aceite o convite não se desfaz do seu projeto.

William fica assim com duas tarefas que lhe são estranhas; o contrato proposto por La Linda e o encargo de mentoria sobre Cirk para orientar aquele rapaz num caminho mais útil para a vida e para o futuro. Adicionalmente o filme mostra-nos ainda a formatação sombria dos campeonatos de jogos de azar, os competidores espremidos nas mesas, exuberando os seus ganhos sem se lembrarem do que irão perder depois, e toda aquela fauna anónima que frequenta o salão de bingo.

Na linha narrativa de Schrader, ele construiu um filme intenso, sóbrio que nos hipnotiza nos flashbacks do sofrimento dos prisioneiros da prisão de Abu Ghraib, filmados em tons de amarelo ocre com uma grande angular que deforma os lugares e os prisioneiros já deformadas pelas sevícias a que são sujeitos. William, ou “Bill” como ele se apresenta, sente-se perseguido por tudo aquilo que o assalta nos seus sonhos e lhe faz sentir urgência na compensação para suportar os seus fantasmas. É para isso que ele vive. Muito interessante, gostei.

Tem estreia prevista em sala em 18 de Novembro

Classificação: 7 numa escala de 10

 

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