23 de novembro de 2021

Opinião – “As Irmãs Macaluso” de Emma Dante

Sinopse

Maria, Pinuccia, Lia, Katia e Antonella são cinco irmãs que vivem num apartamento em Palermo. Ganham a vida alugando pombas para cerimónias. Num dia normal, na praia, Antonella morre acidentalmente. A sua morte irá transformar as suas relações para sempre.

Filme que esteve em competição no Festival de Veneza de 2020, onde foi o vencedor de vários prémios, nomeadamente o Pasinetti Award para melhor filme e melhores atrizes.

Opinião por Artur Neves

Esta história baseia-se num romance escrito em 2014 pela realizadora Emma Dante, que dele fez inicialmente uma peça de teatro e agora passou para filme, notando-se aqui a centralidade do desenvolvimento da ação no interior do apartamento em Palermo na Sicília, viveiro de pombos, (nem imagino como em teatro isto foi representado) o que limita toda a história ao interior das paredes da habitação, subordinando-se assim à linguagem teatral que apresenta princípios cénicos diferentes da linguagem cinematográfica em que agora é apresentado.

Claro que há filmes totalmente rodados em espaços fechados, como tribunais, quartos ou mesmo casas, mas a história que os suportam não se reporta à forma como a juventude destas cinco irmãs se transforma em idade adulta e daqui passa para a desilusão da velhice solitária e insatisfeita. A mais nova, Antonella, com 6 ou 7 anos e a mais velha, Maria, com 17 ou 18 anos, é quem toma conta dos negócios da casa, entre elas ficam; Katia, Lia, que prefere isolar-se para ler do que cooperar nas tarefas domésticas e Pinuccia que cedo começa a dar sentido aos seus impulsos sexuais.

Quando as conhecemos elas já vivem por sua própria conta, sem pais, tutores, ou alguém que lhes mostre um caminho de vida, qualquer que ele seja. O seu relacionamento com o exterior é com o empresário de eventos que lhes aluga os pombos, para os soltar durante a festa e que posteriormente regressam novamente ao pombal. Elas vivem em roda livre, por elas próprias, cada uma mostrando as suas tendências, desejos, conflitos entre elas, sem qualquer modelo para se guiarem, ou se conterem. Nenhuma frequenta a escola ou tem qualquer tarefa estruturado exceto alimentar os pombos e mesmo essa tem diferenças de acordo com a sua autora. A ida à praia é uma distração fortuita, imediatista, sem preparação, exceto vestirem-se e prepararem o lanche. Do acidente que vitima a mais nova, só temos conhecimento dele em flashback no final do filme, sendo todavia sugerido na ida à praia, servindo como transição para encontrarmos as quatro irmãs restantes na idade adulta, dando início à 2ª parte do filme.

Vemo-las num reunião familiar em que Lia, empurrada pelo seu marido, pretende convencê-las a vender o apartamento para usufruir de algum dinheiro do bem que é de todas. Lia procura essa vantagem sem se preocupar como ficariam as outras três irmãs que continuam a partilhar o espaço embora já sem a atividade do negócio dos pombos que continuam a pairar nas redondezas. É um diálogo amargo, generalizadamente conflituoso entre todas, com ameaças e acusações mútuas que podem derivar das suas diferenças, da sua coabitação forçada por ausência de alternativas e não especificamente do remorso pela morte da irmã mais nova, tal como é referido na sinopse. Elas encontram-se a meio da vida, Lia não é feliz no casamento, as outras não seguiram um caminho autónomo e suportam-se por necessidade. Não há felicidade naquele conjunto de mulheres e é isso que motiva os seus confrontos.

Na 3ª parte encontramos três irmãs já velhas a cuidarem penosamente umas das outras, preparando o funeral de uma delas e despejando o apartamento de que já não precisam e que foi negligenciado e sem amor durantes os anos em que o coabitaram. É uma tragédia global que define esta história em que a morte da irmã foi apenas o episódio mais doloroso.

Emma Dante tem aqui uma história poderosa, da saga de uma família desestruturada que cresceu sem amadurecer que serviria para uma série ao estilo de “Downton Abbey”, e que por isso não cabe nos 89 minutos que lhe foram dedicados aparecendo-nos como uma série de postais ilustrados sobre cenas da vida de pessoas ligadas por laços familiares mas que nada mais conseguiram entre si do que o desgosto, a angústia da solidão, e as acusações mútuas da sua própria miséria. As personagens criadas são planas, carecem de densidade, porque nós vemo-las apenas nas situações que a realizadora nos mostra, omitindo o caminho que as levou até ali. É fácil, dentro do senso comum, inferir o seu percurso, mas aí é o espectador a dar conteúdo às imagens e aos factos e não a interpretar o caminho que caberia a Emma Dante mostrar e justificar.

Na 3ª parte podemos observar uma estranha paz de comiseração e aceitação da vida que gorou as expectativas de juventude e culpar o sentimento de perda insuperável, mas ainda assim serão liberalidades do espectador e não uma conclusão do fio da história. É pena… algumas imagens de dias ensolarados e pássaros esvoaçando no céu sem nuvens não inibem sair-se do filme com a sensação de saber a pouco… muito pouco mesmo.

Tem estreia prevista em sala dia 01 no de Dezembro

Classificação: 4 numa escala de 10

 

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