27 de setembro de 2021

Opinião – “As Coisas que Dizemos, As Coisas que Fazemos” de Emmanuel Mouret

Sinopse

Daphné, grávida de três meses, está de férias no campo com o companheiro François. Ele tem que se ausentar para o trabalho e ela vê se sozinha para dar as boas-vindas a Maxime, seu primo que ela não conhece. Durante quatro dias, enquanto aguardam o retorno de François, Daphne e Maxime gradualmente se conhecem e compartilham histórias cada vez mais íntimas sobre suas histórias de amor do presente e do passado …

Opinião por Artur Neves

Emmanuel Mouret é um realizador francês nascido em Marselha em 1970 que já nos surpreendeu em “Mademoiselle de Jonquières”, filme de 2018, segundo a obra de Diderot, pela gentileza e finura demonstrada na conversão em argumento do romance do século XVIII, onde se aborda a eterna volatilidade do amor, dando corpo e figuração à frase de François de la Rochefoucauld que nos diz: “A constância no amor é uma inconstância perpétua”.

A história é bastante simples, Maxime (Niels Schneider), chega á casa de campo do seu primo François (Vincent Macaigne), a convite deste, depois de uma grande separação com o objetivo de encontrar o ambiente propício a escrita a que ele se quer dedicar por vocação e profissionalmente. Todavia ele não se encontra de momento, por motivos que mais tarde saberemos e quem o recebe é Daphne (Camélia Jordana), a companheira do seu primo que se encontra grávida, mas que assume os custos da oferta do seu parceiro, recebendo-o e integrando-o no ambiente da sua casa durante a ausência de François.

Deste modo não previsto, Maxime e Daphne têm de conviver e de conversar nos assuntos correntes que evoluem para outros mais sérios, como a descrição do seu plano de escrita do livro que se propõe realizar, que inclui o relato de histórias de relacionamentos amorosos clássicos e modernos começando precisamente pelo seu próprio relacionamento.

Máxime descreve o seu desapontamento e a ferida emocional deixada pela mulher que foi o objeto do seu amor recente, mas que o abandonou ao apaixonar-se pela sua melhor amiga. As descrições são acompanhadas por flashbacks que ilustram os acontecimentos vividos e o despontar da paixão e da consequente desilusão de Máxime que provocam em Daphne sentimentos de comiseração e simpatia que lhe motivam um envolvimento naquele jogo, partilhando com ele confidencias mais íntimas do seu percurso amoroso com François e antes dele.

A narrativa das histórias é construída com grande habilidade e subtileza transportando para o espectador toda a problemática do amor, dos relacionamentos, das vivências defendido através do discurso de um sociólogo, para o qual Daphne preparava uma apresentação, que o amor não implica a posse do objeto amado e que o ciúme, a raiva, o sentido de perda são impróprios de surgir em qualquer relação. Esse sentimento negativo deve ser sublimado pela alegria, pela felicidade que se sente em contemplar a felicidade do outro no novo relacionamento, sem qualquer sentimento vingativo ou malicioso de qualquer espécie, para lá da dor que isso nos cause, sendo para a demonstração desse final que o enredo da história nos conduz durante os 122 minutos de duração.

Como se compreende é um tema que não tem uma abordagem fácil, principalmente se o isentarmos do tom lamecha para onde estas situações têm propensão em derrapar. Mouret conseguiu encontrar os atores adequados para modular os personagens com a elegância necessária que embora mostrem o sofrimento dos seus tormentos internos, mantêm uma aparente leveza nas suas atitudes externas em linha com os princípios definidos no parágrafo anterior. Significa isto que não interpretam uma atitude generalizadamente real, mas antes, absolutamente coerente com a filosofia apresentada como base do relacionamento amoroso saudável.

O filme conta magistralmente a história que o suporta entretecendo as histórias pessoais vistas de ambos os lados, construindo um jogo de sedução mútuo para Maxime e Daphne, embora não faltem também os necessários twists que nos justifiquem algumas atitudes menos claras. Todos os diálogos são bem construídos, enfatizados pela música constante das valsas de Schubert, das sonatas de Haydn e dos concertos de Chopin, conduzidos com o perfeito domínio da escrita e dito pela modulada língua francesa que torna credível a culpa de tudo o que se prometeu fazer sem sucesso, assim como, de tudo o que fizemos sem ousar admitir. Não é filme para todas as audiências mas recomendo sem reservas.

Classificação: 7,5 numa escala de 10

Tem data prevista de estreia em sala para 25 de Novembro

 

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