28 de outubro de 2020

Opinião – “A Maldição de Larry” de Jacob Chase

Sinopse

Oliver (Azhy Robertson) é um rapaz solitário que se sente diferente de toda a gente. Desesperado para arranjar um amigo, procura consolo e refúgio no telemóvel e no tablet que nunca larga. Quando uma misteriosa criatura utiliza os dispositivos de Oliver contra ele, para conseguir entrar no nosso mundo, os pais de Oliver (Gillian Jacobs e John Gallagher Jr.) têm de lutar para salvar o filho do monstro por trás dos ecrãs.

Opinião por Artur Neves

Ao vermos no genérico de abertura do filme o nome “Amblin”, a produtora criada por Steven Spielberg, podemos logo inferir que se trata de terror no seio de um drama familiar para construir uma parábola parental, confirmada logo nos primeiros instantes em que Oliver (Azhy Robertson), acorda no seu quarto e desloca-se à cozinha para beber água e observa a mãe a dormir sozinha na cama, no quarto ao lado do seu e no piso inferior o pai a dormir no sofá. É uma segura referência de que Spielberg andou a mexer os cordelinhos no sentimentalismo do drama familiar, do lar desfeito ou em degradação, tão ao gosto da população suburbana americana que imortalizou o terror de Poltergeist.

Desta vez porém a evolução tecnológica permite trocar o ecrã da televisão pelo smartphone ou pelo tablet, em que ao toque de um dedo surge o desengonçado ser desumano; Larry que procura um amigo, que procura o convívio com outras pessoas porque se sente muito só no mundo virtual em que habita.

É a partir daqui que Jacob Chase, realizador americano e também argumentista de uma curta metragem; “Larry” de 2017, expande o conceito e se estreia nesta longa metragem cujo título em português objetiva a história para o monstro, em vez de a direcionar para Oliver, um menino com uma deficiência profunda no espetro do autismo e perturbações na voz, não conseguindo articular palavras inteligíveis, o que lhe provocam solidão, afastamento dos seus colegas na escola e motivo de bulling da classe pelas suas dificuldades em aprender.

Para comunicar, Oliver serve-se de um programa instalado no smartphone, e no tablet que pronuncia as palavras que ele quer dizer ao toque de um dedo e assim entra em contacto com Larry que se revela no mundo virtual pedindo-lhe para jogar com ele (“Came Play”, no original). Larry não é maldito, é apenas desengonçado, feio, segundo os padrões normais e quer companhia, surgindo como alter ego de Oliver que sofre o afastamento dos seus colegas e os descuidos da mãe, que ao esquecer-se temporariamente da sua condição lhe pede coisas a que ele não pode corresponder.

O casal, Sarah (Gillian Jacobs) e Marty (John Gallagher Jr.), culpa-se mutuamente do não reconhecimento atempado da deficiência do seu filho Oliver e frequentemente discute causando maior sofrimento a Oliver que não os pode ouvir a discutir. Sarah sofre o facto de Oliver nunca a olhar nos olhos, tomando isso como prova do seu fracasso como mãe. Marty tem vários empregos com o objetivo de suprir as necessidades de Oliver que se sente sempre só. Este ambiente, tornando-os a todos uma família disfuncional, propicia a entrada de Larry que sobrevive como expressão da falta de tolerância, de compreensão e da solidão.

Todavia Jacob Chase comprometeu-se fazer um filme de terror, pelo que tem de construir truques de curta distancia que causem susto, iluminação interruptível sem motivo aparente, eventos somente visíveis através da câmara do tablet, sombras suspeitas no parque de estacionamento onde o Marty trabalha de noite, tempestades súbitas atravessadas por raios que revelam ameaças e produzem sons assustadores, bem como, todo o manancial de artifícios que causam expectativa e surpresa para construir o suspense. É a indústria cinematográfica a funcionar, não podemos levar a mal e até conseguem transformar Larry num maldito quando ele apenas quer companhia para não se sentir tão só, tal como o desejo de Oliver em construir uma amizade genuína para não sentir a solidão.

Em época de Halloween, qualquer susto fica bem e Chase sabe como construí-lo com eficácia, muito embora com este tema e para uma produção Amblin, que normalmente puxa para o coração, o final apresenta-se razoavelmente sombrio.

Classificação: 6 numa escala de 10

 

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