6 de janeiro de 2020

Opinião – “A Despedida” de Lulu Wang


Sinopse

Nesta divertida e inspiradora história, baseada numa mentira de verdade, Billi (Awkwafina), nascida na China e criada nos EUA, regressa relutantemente a Changchun para descobrir que, embora toda a família saiba que a sua adorada avó Nai Nai tem poucas semanas de vida, decidiram em conjunto não contar nada à própria Nai Nai.
Para garantir a felicidade dela, reúnem-se sob a alegre fachada de um casamento acelerado, unindo membros da família espalhados pelo estrangeiro. Ao navegar pelo campo minado das expectativas e convenções da família, Billi descobre que há muito para celebrar: uma oportunidade para redescobrir o país que deixou em criança, o maravilhoso espírito da avó e os laços que se mantêm, mesmo quando muito fica por dizer.
A Despedida é uma celebração sincera, não só da forma como interpretamos a família, mas também da forma como a vivemos, construindo magistralmente uma representação delicadamente bem-humorada de uma boa mentira em ação.

Opinião por Artur Neves

Com a história resumida na sinopse anterior, de cariz muito simples e direto para poder desdobrar-se posteriormente nas apreciações dos comportamentos e na análise das motivações que justificam o comportamento acima descrito, pensava eu, o filme opta por enveredar pela tradição que o sustenta concentrando-se na escritora chinesa / americana Billi Wang (Awkwafina) e na sua deslocação imprevista a Changchun para participar na piedosa mentira que toda a família orquestrou para a poupar, não à morte anunciada, mas ao medo que o seu passamento lhe provocará, como acerta altura justifica a mãe de Bili, filha de Nai Nai (Shuzhen Zhao) sobre as razões do procedimento familiar para esta mentira.
Assim, até à data do casamento, imposto para suportar a mentira, a história desfila as diferentes relações interpessoais no seio da família através da representação dos rituais familiares chineses que à cultura ocidental podem parecer estranhos, infantis, poereis e algo idiotas, como por exemplo a prolongada e insistente conversa do empregado do hotel para se penitenciar da avaria do elevador que provocava a sua imobilização.
Bili, a chinesa assimilada que vive em Bushwick, Brooklyn, a neta e a filha que nem os seus pais convidaram para tal empreendimento, assume-se como ocidental que não encaixa na tradição, nos rituais e nas idiossincrasias familiares de que ela se afastou na grande cidade, embora nutrindo um amor pela sua avó que a faz vacilar na sua determinação e encarar os vários mundos a que está ligada, um por nascimento, outro por opção.
A argumentista e realizadora Lulu Wang, que estudou no Boston College, serve-se deste filme para apresentar os detalhes do seu povo e da sua cultura, como o elevador avariado, os preguiçosos funcionários que servem o copo de água do casamento, a decoração do salão de massagens e o efeito da própria massagem que não é de todo o esperado em mais um ritual de pré casamento. Depois temos a cerimónia, em que os noivos cumprem uma tarefa em vez de rejubilarem de amor. No banquete há discursos para todos os gostos, até o de um ex-camarada de armas (Nai Nai foi na juventude um soldado do exercito de Mao) e este aproveita o encontro com ela para lhe revelar o seu secreto amor de antanho.
Todo o filme é um conjunto de quadros familiares e sociais, mostrando pratos típicos chineses, humor subtil e algum arrependimento melancólico dos ressentimentos sentidos entre os familiares. A morte é a conclusão inevitável da vida e é mais dolorosa para todos os que ficam com o sentimento de perda que a morte de alguém próximo implica, todavia, Lulu Wang revela no final do filme que Nai Nai ainda está viva, seis anos após o diagnóstico que motivou toda esta trapalhada, o que mais uma vez me faz concluir: “muito barulho para nada”!...

Classificação: 5 numa escala de 10

PS: A estreante atriz Awkwafina (Bili, neste filme) foi a vencedora dos Globos de Ouro de 2020 na categoria de “Melhor atriz de Musical ou Comédia” contra; Ana de Armas, Cate Blanchett ou Emma Thompson. Embora ela desempenhe um personagem muito abrangente e muito empenhado neste filme, penso que ainda não merecia este galardão.

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