9 de abril de 2019

Opinião – “A Queda do Império Americano” de Denys Arcand


Sinopse

Pierre-Paul (Alexandre Landry) é um homem de 36 anos com PhD em filosofia que trabalha dirigindo um caminhão de entregas, uma linha de trabalho em que ele acredita ser bom demais para estar. Quando um dia ele encontra duas bolsas de dinheiro, ele precisa escolher entre permanecer com a vida que tem ou finalmente ter o estilo de vida que queria, porém às custas de se envolver com a polícia e o mundo do crime.

Opinião por Artur Neves

Este filme é o terceiro de uma trilogia escrita e realizada por Denys Arcand, realizador canadiano nascido em 1941. A série foi iniciada em 1987 com “O Declínio do Império Americano”, a que se seguiu; “Invasões Barbaras” em 2003, e pretende ser uma visão crítica, ácida, virulenta da vida quotidiana, todavia contada com muita graça, boa parte sofrida, mas ainda assim com alusões que nos fazem sorrir, sobre as contradições filosóficas da nossa vida comum em sociedade.
O primeiro filme de 1987 resume-se a um jantar de amigos que comentam entre si a vida, enquanto as amigas ocupam o tempo num ginásio e comentam igualmente a vida à sua maneira. Quando se juntam para ao jantar, fazem-se revelações e comentários íntimos sobre todos os amigos que põem em causa parte da confiança entre eles.
O segundo filme de 2003, interpretado com os mesmos atores do primeiro filme, sofre a influência da surpresa do ataque às torres gémeas em Nova Iorque e centra-se na fase terminal da doença de um deles e no papel fundamental que a verdadeira amizade tem na nossa existência.
Em ambos, os textos são muito ricos e tecem-se abundantes considerações filosóficas sobre o sentido a vida, com muita graça perversa, lasciva e política.
O presente filme não foge à regra dos anteriores, incluindo a participação do ator que se tornou mais emblemático nos filmes anteriores, Sylvain Bigras (Remy Girard) que desempenha aqui o papel de “cérebro” (The Brain) do grupo.
Por ser tão ligada à realidade vigente e á vida tal como a conhecemos, a história só pode ser contada como um “conto de fadas” dos nossos dias, utilizando um enredo intrincado, sumariamente descrito na sinopse, que reúne elementos de duvidosa verossemelhança mas que servem na perfeição para caraterizar as relações sociais da atualidade fortemente vinculadas pelo dinheiro, pela riqueza escondida em paraísos fiscais, pelo tráfico de droga com permissividade policial, pela corrupção da justiça, pela capacidade individual de enganar o próximo em benefício próprio, sem qualquer remorso, ética ou respeito social. Tudo contado numa linguagem bem articulada, pejada de citações filosóficas, aplicadas com uma graça subtil adaptada ao desenrolar da ação.
E por fim existe também o amor, sereno, surpreendido na sua própria aparição, inesperado, ou previsto noutro contexto, que se impõe como elemento aglutinador do grupo mais exógeno que esta história constrói, que escreve a direito por linhas tortas e nos deixa o vislumbre da esperança de uma humanidade que se imporá sempre sobre as ruínas da sua própria destruição e nos deixará ser felizes se soubermos encontrar o caminho.
A classificação indicada reporta-se individualmente a este filme, mas à trilogia completa e aos múltiplos momentos de ironia e emoção que ela transmite, julgo que merece o 10.

Classificação: 8 numa escala de 10

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