26 de agosto de 2020

Opinião – “Fojos” de Anabela Moreira e João Canijo


Sinopse

Castro Laboreiro, a terra mais a Norte de Portugal, é um lugar cujos montes terminam numa rua sem saída. Chamam-lhe o buraco do fim do mundo. Ali vivem lado a lado lobos e homens. Os lobos saem dos seus covis para atacarem livres as presas dos homens trancados nas suas tocas. Uns e outros armadilhados dentro do grande fojo que é a vida e de onde não se pode sair vivo.

Opinião por Artur Neves

Considerando a sinopse anterior e o poema inscrito no poster do filme (“Os homens são como o lobo,/Só lhes falta ter rabo,/Andam de dia e de noite,/Na figura do Diabo”), bem como que; “Fojo” é uma armadilha para captura de lobos, construída em pedra e representativa de uma manifestação cultural única a nível ibérico, da convivência nem sempre amistosa entre lobos e homens. Na minha genuína paixão cinéfila, sempre recetiva á desejada evolução do cinema português, pensei tratar-se de um documentário, sim mas, em que João Canijo, autor de algumas boas obras recentes, nos quisesse oferecer um drama na paisagem agreste do Alto Minho em que homens e lobos se comportassem uma vez como eles próprios e outra como o seu contrário, conjugando uma história documental sobre a dura vida das pessoas de Castro Laboreiro e Melgaço.

Mas não… mais uma vez as minhas expectativas foram goradas e o que temos aqui é um documentário puro e duro, do quotidiano quase primitivo (apesar da existência da Internet) das gentes de Melgaço, nas suas atividades de subsistência e manutenção da vida do dia a dia, apresentadas aleatoriamente, ou pelo menos segundo uma ordem de duvidosa referenciação.

O documentário não tem atores, é feito com as pessoas da terra nos seus afazeres normais de pastar os animais, matar os porcos e defumar os presuntos, bem como conservar a carne em sal. Todas as pessoas são indiferenciadas e reportadas ao mesmo nível sendo tão destacado o “Tiro”, um cão pastor, como a “tia Benite”, ou “Benitinha”, apoiada em duas canadianas sempre que se desloca ao centro de dia para executar uma ginástica mal guiada, ou ao posto médico para tratar dos seus múltiplos achaques.

A aldeia reportada tem muitas pessoas mas o filme não nos permite conhecer qualquer delas ou as relações entre elas, os seus dramas, ou o posicionamento social relativo daquelas que a realização achou por bem destacar com a abordagem dos seus problemas específicos. O abastecimento da dispensa dos habitantes é feito pela mercearia itinerante que pára em vários lugares e atende diferentes fregueses, com dificuldades pecuniárias também diferentes, mas tudo de uma forma tão plana, tão rasa, tão elementar que ficamos sempre à espera que o próximo assunto seja mais interessante.

A abordagem espiritual dos habitantes é feita através da apresentação de uma igreja frugal e de um funeral não se sabe de quem, apenas uma procissão atrás do féretro, vista de perto e de longe quando atravessa uma ponte. Mais interessante é a mostra de uma prática religiosa cigana, com o discurso do mentor num altar improvisado e as respostas pré estabelecidas dos fiéis na assembleia, num misto de reza e cântico aos sons de acordes de música cigana.

Dos fojos apenas um nos é mostrado e a uma distância segura. Dos lobos nem um vislumbre, exceto das carcaças despojadas de carne de caçadas antigas, dos homens que viram diabos, também nem uma réstia, até porque, na sociedade matriarcal que nos é apresentada, elas são sempre determinantes em tudo o que importa e neste filme tudo o que importa é apontar a objetiva para diferentes assuntos e deixar correr a gravação para ter assunto para a edição. Ora bolas… não pode ser sempre isto o cinema português.

Classificação: 3 numa escala de 10

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