22 de maio de 2020

Opinião – “100% Camurça” de Quentin Dupieux


Sinopse

Georges, recentemente divorciado, sente uma enorme dificuldade em adaptar-se à nova vida. A enfrentar uma espécie de crise existencial, esforça-se por ultrapassar a angústia que teima em não passar. Um dia, compra um casaco de camurça numa loja em segunda mão. O que vem a descobrir assim que o veste é que esse casaco concede estranhos poderes ao seu proprietário. Obcecado com a nova peça de vestuário, Georges muda radicalmente a forma de ver e sentir o mundo.

Opinião por Artur Neves

Quentin Dupieux é um realizador francês nascido em 1974 do qual, quase conheço uma sua realização de 2010; “Rubber – Pneu”. Se digo que “quase conheço”, é porque contactei com ele num videoclube, aluguei o videograma, comecei a vê-lo e ao constatar que se tratava da história de um pneu filósofo!… sim, um pneu que falava e que tinha vida própria rolando sozinho, acorreram-me imediatamente outras ideias de coisas mais uteis para fazer e interrompi o visionamento cerca de 15 minutos após o seu início. Devolvi o DVD e nunca mais pensei no assunto.
Nesta fase de confinamento em que procuramos ocupações para o tempo em excesso dei de caras na plataforma FILMIN com este “Le Daim” de 2019, no título original, escrito e realizado pelo mesmo senhor Quentin Dupieux e em consideração aos atores; Jean Dujardin e Adèle Haenel, de quem tenho algumas boas referências noutras interpretações, resolvi conferir-lhe o benefício da dúvida prometendo a mim próprio assistir a todos os 77 minutos de duração do filme.
Georges (Jean Dujardin) que só de raspão sabemos que ele é um divorciado recente (pelo desenrolar da história e do seu comportamento assumimos que a senhora terá tido todas as razões para se separar deste maluco) tem uma fixação intelectual num blusão de camurça com franjinhas, umas tiras fininhas também de camurça que pendem da parte de cima do peito, das costas e das mangas, com quem ele fala, tece considerações filosóficas sobre a sua aparência vestido com ele frente ao espelho e se propõe torná-lo o único blusão “vivo” através da liminar destruição de todos os blusões com que ele se cruze ao chegar aquela pequena cidade do interior americano, de carro, vindo não se sabe de onde nem porquê.
Ao chegar aqui lembrei-me logo do pneu a rolar isolado pela estrada e a comentar a sua existência, mas continuei a ver o filme, pois afinal tinha formulado um compromisso para 77 minutos o que até nem é muito…
Georges, porém, tem ainda outra fixação, assume-se como realizador de cinema para o que empunha constantemente uma máquina de filmar, uma Handycam da Sony de uso doméstico (pelo que me pareceu) e com ela motiva Denise (Adèle Haenel) a formar uma equipa de filmagem, depois de esta, na receção do hotel em que se alojou, lhe ter confessado que também gostava muito de cinema e tinha propensão para editora de filmes e que a atividade de edição preenchia completamente a sua veia artística.
Posso vislumbrar nesta obsessão pela filmagem uma crítica alusiva à multiplicidade de pessoas que de telemóvel em punho filma e fotografa tudo o que lhe aparece pela frente para posterior publicação nas redes sociais, mas daí até fazer como ele, de filmar e matar a tiro todas as pessoas que vestiam blusões, para lhos tirar e enterrar, para que só restasse o seu, o único blusão de camurça, vai um abismo de razoabilidade e de sentido.
Não quero revelar o final da história, mas a bem da lei e da ordem, um individuo que mata tão impunemente outras pessoas por um motivo tão fútil, só pode ter um fim semelhante às mãos de um sobrevivente que desempenhou um personagem ainda mais indefinido do que os participantes principais no enredo do filme… assim, tout court, sem mais nem menos... tiro e queda!...
Igualmente, sem me querer arvorar em detentor da verdade absoluta, informo que no IMDb (International Movie Data base) este filme tem a classificação de 6,8 num total de 4009 utilizadores, dos quais 34,5% atribuíram a classificação de 7, o que significa que outras pessoas tiveram opinião diferente da minha, todavia, declaro também que a minha classificação se destina totalmente aos atores e nada ao argumento, que reputo de fútil, desconchavado e idiota.

Classificação: 2 numa escala de 10

NOTA: Para quem quiser esclarecer as dúvidas que a minha crónica possa ter levantado, informo ainda que este filme está disponível na plataforma FILMIN, de origem espanhola e internacionalizada desde Novembro de 2016 no México e em Portugal, por €3,95, durante 72 horas, sem fidelização ou contrato, bastando apenas a inscrição no site.

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