29 de abril de 2011

Opinião - Levantado do Chão

Título: Levantado do Chão
Autor: José Saramago
Editora: Caminho

Sinopse:
"«A transformação social. A contestação. Personagens em diálogos. As cruentas desigualdades sociais. Surgem as perguntas proibidas. Vai-se adquirindo consciência e espaço, para que tudo se levante do chão. Um livro composto por 34 capítulos. No 17.º está a tortura e a morte de Germano Santos Vidigal. Germano, o nome que significa irmão, o homem da lança. Apesar de vencido, o sacrifício da sua vida indica o caminho. ""Já o encontraram. Levam-no dois guardas, para onde quer que nos voltemos não se vê outra coisa, levam-no da praça, à saída da porta do sector seis juntam-se mais dois, e agora parece mesmo de propósito, é tudo a subir, como se estivéssemos a ver uma fita sobre a vida de Cristo, lá em cima é o calvário, estes são os centuriões de bota rija e guerreiro suor, levam as lanças engatilhadas, está um calor de sufocar, alto. ""As mulheres são também chamadas à primeira linha das decisões neste belo romance de Saramago. O diálogo monossilábico entre marido e mulher da família Mau-Tempo vai-se alterando. Interessante observar uma narrativa que vai da submissão ao sentido de libertação, através de gerações.» (Diário de Notícias, 9 de Outubro de 1998)".

Opinião por Joana Pereira:
Como meio de espelhar a realidade do Alentejo no tempo narrado, o autor conta-nos a história da família Mau Tempo ao longo de três gerações, desde o avô Mau Tempo, mau marido e mau trabalhador até ao neto, passando pelo filho, João Mau Tempo, que tem mais destaque ao longo do texto devido ás suas actividades políticas, estes últimos mais dedicados ao trabalho, mas nem por isso conseguindo escapar à miséria que atravessa a classe camponesa alentejana.

Ao longo da leitura, o autor vai-nos expondo a miséria reinante nos latifúndios da região, derivada dos baixos salários e do desemprego, que contrastam com a abundância em que vivem os latifundiários e os membros do clero.

Estes extremos são-nos apresentados ao mais alto nível de Saramago, com um estilo brilhantemente irónico e mordaz, recorrendo a personagens tipo para caracterizar a insensibilidade e desumanidade da classe privilegiada, apoiada pela guarda nacional. Esta cooperação entre as partes, no sentido de acumular privilégios e dominar o povo remete-nos para a trilogia Estado, Igreja e Latifúndio, apelidada de Santíssima Trindade Terrena.

Na minha opinião, é um livro genial, que vale a pena ler e reler pela eximidade da escrita de Saramago, a interacção entre o narrador e o leitor, a crítica social fulminante, revestidas da mais sublime ironia, cujo enredo nos prende e recheado de surpresas de linguagem. Em poucas palavras, este livro deixou-me com dois pensamentos: “como é que Saramago consegue fazer isto com as palavras?” e “como é que é possível haver situações tão injustas?”.

Numa perspectiva mais alargada, a obra levanta questões que ultrapassam os limites do Alentejo. Percebemos claramente que uma situação tão sustentada pelas instituições nacionais tem que se verificar também nas outras regiões do país e interrogamo-nos durante quanto tempo terá ocorrido, sendo certo que, de uma forma mais leve e menos evidente, se verifica ainda nos nossos dias.

Sem comentários: